Os tetos têm frescos, pinturas de passagens bíblicas, em tons alegres, tal como a talha dourada de um pequeno altar, mas quase tudo o resto está revestido com ossos.
De todos os tamanhos e só crânios, dizem, cerca de 5 mil.
Muitos olham para quem entra, curiosos sobre a nossa reação com a morte e que a esta capela revela como muda muito com a evolução das mentalidades.
A Capela dos Ossos do Convento de São Francisco de Évora é do século XVII. É a mais antiga de um conjunto de meia dúzia de capelas de ossos em Portugal, essencialmente no Alentejo e Algarve.
A de Évora tem a particularidade de ter duas múmias em expositores protegidos com vidro.
Um trabalho recente liderado pela investigadora Teresa Fernandes permitiu concluir que se trata de uma mulher que morreu com mais de 30 anos de idade e de uma criança, também do sexo feminino, com cerca de dois anos e meio.
“Estas informações permitem desmentir uma lenda que rodeava estes dois corpos mumificados. Essa lenda referia que se tratava de dois homens, um pai e um filho”, referiu-nos a investigadora.
Segundo a lenda, pai e filho maltrataram a mulher e mãe, que os amaldiçoou. Quando morressem os corpos não se transformavam em pó.
Na verdade, a razão da morte da mulher adulta é incerta, embora não estivesse em boas condições de saúde, "sobretudo uma muito má saúde oral que se agravou nos últimos tempos de vida da mulher”.
Presume-se que os corpos e os ossos sejam provenientes de espaços de enterramento, nomeadamente da Igreja de São Francisco, que é mais antiga e que faz parte do bonito Convento franciscano.
A Capela dos Ossos situa-se no antigo dormitório do Convento e o elemento mais recente é um painel de azulejos colocado na parede em frente da entrada da capela. É da autoria de Siza Vieira e projeta a vida num traço a preto e branco, cheio de movimento e com a força da presença de crianças.
Em contraposição à mensagem escrita no mármore frio na portada da capela e que diz: “Nós ossos que aqui estamos pelos vossos esperamos”.
O apelo é revelador de uma outra mentalidade sobre a transitoriedade da vida, muito marcante entre os séculos XVI e XVIII.
A relação com a morte era muito mais natural, não como sucede agora, nas palavras de Teresa Lousa no estudo sobre “Capelas dos Ossos e Património Macabro em Portugal”. “O contacto com a morte que hoje acontece de modo filtrado e profissionalizado (o hospital parece ser o local ideal para morrer e as agências funerárias e afins devem tomar conta dos dolorosos procedimentos), era outrora comum e vivido com mais naturalidade”.
Além da Capela dos Ossos vale a pena visitar o Convento de São Francisco para se ver uma enorme coleção de Presépios e, talvez muito mais relevante do que o património macabro dos ossos, a Igreja de São Francisco que é de uma beleza extraordinária.
Capela dos Ossos: “pelos vossos esperamos” faz parte do programa da Antena1 Vou Ali e Já Venho e a emissão deste episódio pode ouvir aqui.
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