Aurealino Matos é um engenheiro eletrotécnico do Porto que uma vez por semana se transforma em piloto de uma bicicleta especial e leva a passear idosos ou pessoas com mobilidade reduzida pelo centro histórico da cidade. É um dos mais de 70 voluntários do projeto Pedalar Sem Idade - Porto e, durante cerca de duas horas, transporta utentes de um lar num triciclo elétrico em que “dá a conhecer as mudanças na cidade, conversa e convive”.

“É uma boa forma de aliviar o stress e estar em boa companhia, é muito gratificante”, conta Aureliano ao SAPO Viagens, numa paragem no Mercado do Bolhão. Sorridente, Cecília Matos, de 90 anos, uma das passageiras a bordo do veículo, mostra-se satisfeita com a iniciativa e aproveita para passear por um Bolhão bem diferente do que era no passado.

No renovado mercado portuense, os turistas substituíram, em grande parte, os locais, mas a essência da Invicta continua preservada nas bancas de vendedoras mais antigas, como a florista Gracinda, onde Aureliano e as suas passageiras param para dois dedos de conversa.

Projeto Pedalar Sem Idade - Porto
Projeto Pedalar Sem Idade - Porto Aurealino Matos com as utentes do Projeto Pedalar Sem Idade - Porto no Mercado do Bolhão créditos: Alice Barcellos

O projeto de inovação social Pedalar Sem Idade surgiu na Dinamarca, mas o conceito foi importado para várias cidades portuguesas. A missão é combater o isolamento e a solidão das pessoas idosas, levando-as a passear com pilotos voluntários treinados, em veículos adaptados para o efeito, melhorando assim o seu bem-estar, autoestima e autoconfiança.

Por um lado, o projeto recebe o apoio de municípios e empresas que financiam os veículos para que seja gratuito aos utentes locais. Por outro lado, tem como objetivo tornar o serviço pago por quem vem de fora, o que contribuirá para o aumento da frota, bem como custos de manutenção da mesma.

“Sabemos que muitos visitantes, não só locais, como estrangeiros, têm problemas de acessibilidade aos parques, ao património ou à praia. Então, pensamos como poderíamos ajudar as pessoas de cá através do contributo de quem vem de fora e que já pagaria por um transporte, por exemplo, um táxi”, explica ao SAPO Viagens Sílvia Freitas, responsável por trazer o projeto Pedalar Sem Idade para Portugal e pela sua direção na Área Metropolitana do Porto.

“Neste momento, o projeto está a ser aplicado, maioritariamente, para portugueses pois precisamos de mais veículos para conseguir atender a parte do turismo, mas tem bastante potencial de crescimento. Construímos um plano para isso acontecer, há muito espaço no turismo para potenciar este tipo de negócio acessível e sustentável”, afirma Sílvia.

Este modelo de negócio foi desenvolvido durante a participação na primeira edição do projeto TUI Future Shapes Portugal, em parceria com a IRIS – Incubadora Regional de Inovação Social e patrocinado pelo European Investment Bank.

O projeto da TUI Care Foundation visa promover a inovação social no turismo, através do apoio a ideias vindas de todo o país, de forma a contribuir para um ecossistema empreendedor mais dinâmico, bem como para um impacto positivo no turismo responsável em Portugal.

TUI Future Shapes Portugal
TUI Future Shapes Portugal Apresentação das ideias da edição deste ano do TUI Future Shapes Portugal créditos: TUI Care Foundation

A edição deste ano conta com 60 participantes de várias partes do país que integraram sessões de mentoria e workshops online. Depois, 30 participantes estiveram presentes num bootcamp de três dias na UPTEC – Parque de Ciência e Tecnologia da Universidade do Porto, onde puderam aprimorar as ideias de negócio. A partir daí, foram eleitos oito finalistas que vão continuar a desenvolver as ideias. Finalmente, o programa termina com a eleição dos três melhores projetos que recebem prémios monetários, além de suporte e mentoria.

"O que procuramos fazer aqui é uma combinação entre inovação social e turismo, isso significa que devem ser ideias inovadoras na área do turismo, mas que procurem trazer impacto social ou ambiental para as comunidades ou, até, para os próprios turistas. Esta é a base, depois deixamos aos participantes a parte da criatividade, associada aos seus contextos, aos desafios e sonhos que têm", descreve ao SAPO Viagens Liliana Ribeiro, diretora-executiva da IRIS.

Entre as ideias apresentadas, destacam-se as áreas do bem-estar, da inclusão, do turismo rural e sustentável. Para Liliana Ribeiro, “apesar de já haver muito empreendedorismo no setor do turismo, ainda está pouco desenvolvida esta área ligada às comunidades e criação de impacto social e ambiental”.

Portanto, em Portugal, ainda há espaço para novas ideias florescerem, trazendo um impacto positivo não apenas para o turismo, mas, acima de tudo, para as comunidades. É também nesta linha que se desenvolve em Lisboa o TUI Colorful Cultures, um programa educativo centrado no design sustentável, que procura promover o artesanato local e transformar pontos negativos do turismo em oportunidades para as comunidades que, tantas vezes, ficam à margem da cadeia de valor.

Graças à modernização e revitalização de várias zonas urbanas, a cidade das sete colinas está cada vez mais atraente, quer para turistas, quer para novos investimentos, porém, não deixa de ser alvo de críticas por este crescimento estar a contribuir para a sua descaracterização. Hoje, lojas homogéneas orientadas para turistas substituem o comércio local que preserva a história, a cultura e o artesanato. Para os estabelecimentos que ainda resistem, a concorrência desigual, a escalada das rendas e a saída da população residente colocam em risco a sua sobrevivência.

O receio de Lisboa perder a sua "alma" — precisamente, o que atrai muitos visitantes — motivou o desenvolvimento do TUI Colourful Cultures Lisbon, com base na Escola do Largo. Nesta instituição, estudantes e mentores trabalham soluções para uma cidade mais equilibrada, sustentável e inclusiva.

TUI Colorful Cultures Lisboa
TUI Colorful Cultures Lisboa Mentores e participantes do programa TUI Colorful Cultures em Lisboa créditos: Ana Oliveira

Um dos projetos é o Mistolab, criado pelas irmãs Mafalda e Mariana Lencastre, que transformam restos de produção de toldos e outros materiais não recicláveis em malas, bolsas e outros acessórios. A ideia é dar uma nova vida a resíduos que, de outra forma, acabariam em aterros, cruzando sustentabilidade com técnicas artesanais ancestrais que têm vindo a aprender por todo o território. No futuro, as criadoras esperam estabelecer parcerias com unidades hoteleiras, criando um ecossistema de economia circular que reduza o desperdício e envolva também o setor do turismo.

Um azulejo faz-te parar, olhar e respirar

Ideias parecem não faltar aos participantes que fazem parte da estreia do curso anual do TUI Colorful Cultures em Lisboa. Ainda que com diferentes origens — uns são portugueses, outros de países lusófonos — , todos procuram preservar o património imaterial português. É o caso do projeto Entreformas, de Alexandra, que procura pintar murais, mesas ou outros objetos com padrões inspirados nos azulejos tradicionais. "O nosso tempo está tão corrido e vejo que uma das coisas que nos fazem parar é a arte", comenta a responsável pelo projeto. "Em Lisboa, estás a correr e, de repente, um azulejo faz-te parar, olhar e respirar. A arte tem esse poder", conclui. "É isso que quero proporcionar através das minhas pinturas".

Já Ivónia Costa é a prova de que existem mil e uma formas de preservar a arte do bem fazer e de gerar novas oportunidades para os artesãos portugueses. Para valorizar os diferentes tipos de bordado do país e respetivos artesãos, a designer ambiciona criar vestidos de noiva, feitos por medida, e que integrem estes ornamentos. Mais focado no turismo, Paulo Toledo espera lançar um site com informações e sugestões de rotas que permitam aos turistas viajar pelo país de forma mais sustentável.

Mistolab
Mistolab Saco miosótis da Mistolab, elaborado em parceria com a Toldiconfex e a Delta-cafés e produzido a partir dos restos de produção de toldos créditos: Ana Oliveira

Agricultura regenerativa em Mértola

Mais a sul, em Mértola, no Baixo Alentejo, o projeto TUI Field to Fork, em parceria com a organização não-governamental (ONG) Terra Sintrópica, propõe uma resposta concreta aos desafios de desertificação e abandono rural.

"Trabalhamos para o desenvolvimento regenerativo de Mértola, porque o desenvolvimento sustentável não é suficiente", explica Maria Canelhas, coordenadora da ONG. Tendo como base a agricultura regenerativa, a associação vê no turismo um aliado para criar novas oportunidades num território que recebe mais de 55 mil visitantes por ano, apesar de ter menos de cinco habitantes por quilómetro quadrado.

"O que se vê hoje é resultado de decisões erradas tomadas para este território", comenta Nuno Roxo, presidente da associação e guia local, realçando que não faltam recursos para atrair viajantes e fixar habitantes: natureza, biodiversidade, museus, o rio Guadiana e a riqueza histórica do parque natural.

Assim, a estratégia passa por envolver visitantes e a comunidade local na regeneração do território. Para além de poderem visitar as quintas agrícolas, os visitantes também podem experimentar o restaurante PREC, onde, por dia, só há um prato e entrada, elaborado com produtos frescos colhidos na terra.

Projetos como estes abrem portas a novas soluções para velhos desafios e mostram que o futuro do turismo também pode e deve honrar as raízes dos lugares onde se vai desenvolvendo. Aliás, é quase sempre graças à cultura, tradições e história dos lugares que o turismo se desenvolve.