Primeiro flash: no Camboja (na primeira de três viagens que até lá fiz) recebi várias massagens, mas houve um par de mãos em especial que me tocou a alma. Foi além da minha pele e disse-me que gostava de ser ocidental. Perguntou-me, enquanto me massajava, como era o meu país e se eu era casada – “Não, ainda não, mas não há pressa para isso!”. Ela ficou estupefacta com a resposta e continuou a massajar de forma acostumada a uma vida que nunca iria além de um limite imposto pelos homens. Recomendou-me que não casasse porque ela era casada desde muito cedo e nunca fora tão sozinha. Isto tocou-me, amordaçou-me a alma – assim a ti, menina do Camboja, te desejo um feliz dia da mulher. Aqui, no ‘meu país’ onde dizias que ‘faz frio’, o tempo é nosso, é teu. To dedico.

Mulheres que encontrei em viagem: tocaram-me na pele e ajeitaram-me o cabelo. Dedico-vos esta data

Segundo flash: em Cuba, pelo meio de Havana, parei em frente a um monumento com o meu grupo turístico. Deixei de ouvir o guia e não sei quanto tempo assim me retive. Tinha cruzado o olhar com uma senhora que segurava uma criança, no colo, de forma paupérrima. Os olhos bonitos, ricos de gentileza. Lembrei que tinha um iogurte na mala e entreguei-lho. Tocámos na pele, ao de leve, uma da outra. Senti-lhe a maternidade, a sabedoria de ser mulher, a injustiça de o ser na condição de pobreza extrema. Voltei ao meu grupo, mas olhei várias vezes para a recordar enquanto notei que ela dava o iogurte à criança. A ti, mulher anónima de Havana, te dedico o Dia da Mulher.

Terceiro flash: no Egito, várias raparigas egípcias vieram até ao grupo em que eu estava com uma amiga minha. Miravam as roupas e sobretudo os nossos cabelos, sem lenços. Mas houve uma adolescente que me surpreendeu e tocou no meu cabelo como se fosse uma raridade. Percebi que não era o meu cabelo que a encantava, mas a soltura dele. Depois pedi-lhe uma coisa enquanto trocámos sorrisos: “Podes ajudar-me a colocar o lenço?”. Fazia um calor bizarro, o típico no Cairo, em pleno Novembro. E estava à porta de uma Mesquita para a visitar. Naturalmente temos de respeitar a cultura e a religião, então tive de me cobrir com um lenço. A rapariga, sempre com um sorriso ininterrupto, enlaçou-me o lenço e ajeitou o meu cabelo para não ficar muito à vista. Mas fê-lo com tanto amor, senti nesse momento que dei a mão a outra cultura independentemente dos credos que nos diferenciam, a nós mulheres. Não me atrevi a tocar no lenço dela embora tivesse vontade, mas apontei e elogiei em inglês. Ela agradeceu e disse que agora “éramos iguais”. E claro que somos, todos e todas iguais, sem pontos cardeais e sem preconceitos. A ti, egípcia linda, te dedico também esta data.

Mulheres que encontrei em viagem: tocaram-me na pele e ajeitaram-me o cabelo. Dedico-vos esta data

A todas as portuguesas para quem hoje especialmente escrevo, dedico a mensagem de amor e de companheirismo. Falta-nos muito ser mais companheiras umas das outras. Desejo a todas as portuguesas uma próxima viagem em que sintam na pele o que senti. Em que troquem gestos através de um simples ‘vestir de lenço’. Em que sintam o orgulho do que as mulheres constroem pelo mundo. Mães da humanidade.