Inicio com uma mulher inspiradora e que vive no Brasil: uma senhora que é minha amiga, minha guia espiritual e, como costumo dizer, é uma “mãe-céu”. Núbia Zequineli, de Espírito Santo, ensina direitinho a bondade e a justiça das coisas. Na sua voz feminina encontramos calmaria e suavidade. Encontramos o que as mulheres devem ter: sabedoria e gratidão entre si. Não só mulheres, mas todos.
Ainda no Brasil, no Estado de Santa Catarina, em Florianópolis, temos a amiga Graziela Pereira que realizou o doutoramento comigo em Aveiro e regressou, volvidos anos, a Floripa e à sua família. Tem saudades imensas de Portugal. Nunca a esquecerei como amiga e como conselheira de vida. Até hoje. Uma mulher que representa a defesa de muitas mulheres através da Educação e Ciência.
No Rio de Janeiro, houve uma mulher que me marcou distintivamente pelo seu acolhimento enquanto me falava da maravilha da cidade. Que me mostrou o quão completa pode ser a vida quando se dorme, exausta eu, numa cama de rede. Com o Rio de Janeiro, à janela, balançado pelas águas do mar.
Depois, Tanzânia: uma mulher que me surpreendeu pela sua dedicação a um orfanato dos vários que ali existem (@jerusalem_org). Com um sorriso inabalável e rodeada de berços e de crianças a pedirem afeto. Só afeto. Uma senhora sábia que me contou que tem um sonho por realizar “quero ser professora, talvez um dia”. Fiquei eu a pensar, como professora que também sou, então o que seria ela pois tanto bem ali ela conduz na gestão do orfanato, da vida. Não o sabe, mas ela por si já é uma carreira de sonho.
No Sri Lanka, uma mãe que veio a correr e a acenar com os filhos, não para pedir nada, mas para oferecer frutos. Fiquei extasiada com tanta bondade, sem nos entendermos na língua, mas codificando tudo por sorrisos e balões que entreguei às crianças. Quase não conseguia vir dali embora.
Na Tunísia, a Mariah, uma senhora berbere que nos acolheu numa visita à sua casa e aldeia cultural. Ela não percebia o que eu dizia em nenhuma das línguas que sei. Às tantas, o sorriso e os ligeiros abraços foram a melhor linguagem do mundo. Brindámos com um bule de chá dourado. Nunca vou esquecer os olhos, o sorriso e as mãos meigas da sábia Mariah.
Na Alemanha, uma guia turística que, enquanto nos narrava a história do campo de concentração na zona este daquele país, falava como chorando por cada vítima. Apontava e dizia, a certa altura: “esta é a carta de uma mulher ao seu marido. Escrita sem saber se algum dia chegou ao destino. Ficou aqui, agora como recordação do mal havido”. E estava, ali mesmo, a carta da mulher no meio de estilhaços de uma garrafa verde.
No México, uma mulher ao lado da qual eu me sentei, atrevidamente na sua mesa de almoço. O olhar esplêndido dela, a humildade que podia ensinar meio mundo sobre ser grato e feliz com a riqueza que não tem a ver com ouro. Uma mulher que tinha cúmbia no olhar.
Na Croácia, a beleza, inteligência e simpatia numa mulher só. Uma mulher de fácil entendimento, simples no falar e altiva em tudo o resto. Sobretudo, uma mente aberta feminina. Algo admirável que encontrei na Universidade de Zagreb, onde dei aulas. Algo que muitas portuguesas deveriam admirar e não perpetuar como ciúme (muito habitual na sociedade portuguesa feminina, sobretudo no meio académico e artístico).
Na Bulgária, os traços ex-soviéticos de uma jovem rapariga que cirandava no jardim perto da famosa Catedral Alexandre Nevsky. Cativaram-me porque ela sorriu como se me conhecesse de há muitas vidas. Sorriu como uma mulher que reconhece outra e partilha o seu espaço com ela, de forma ampla e virtuosa.
Na Malásia, uma jovem mulher hindu que falava de forma tão sublime e num tom tão baixo que era adorável olhar para ela enquanto eu comprava algo para comer. Não me lembro o que comprei, só me lembro dela. A mulher sublime hindu.
Nas Filipinas, uma senhora tão jovem destacou-se na minha lente pela sua amabilidade ininterrupta. Por estar sempre pronta, alegre e incansável. Enquanto eu olhava para as 24 horas do relógio, a energia dela era impensável. A força das mulheres filipinas que tem muito de dor e de sobrevivência, todavia sob forma de sorriso aprendido.
No Camboja, uma senhora massajava-me as costas e contava-me como é difícil ser mulher no Camboja. Sobretudo casada por causa da violência doméstica. Senti pena, mas glorifiquei-a, pois, ela contava, não como queixume, mas como base da sua força para viver e trabalhar pela sua família. E perguntou-me como era o outro lado do Mundo onde eu vivia (perguntou se era tudo neve). Contei-lhe coisas imensas e confirmei que aqui não é tudo neve, sendo que ela ficou muito admirada por todos partilharmos o sol, embora não tão tropical. Entreguei-lhe uma nota às escondidas, mas o dono do estabelecimento capturou-a de imediato. Nem me apercebi que ele me tinha visto a ser amável com ela. Pior, que ele não tenha visto a amabilidade dela.
No Vietname, uma senhora que observei, em surdina, num mercado muito conhecido em Hoi An. Transbordava felicidade e um sorriso alargado no seu rosto esguio e lindíssimo. Ao me olhar diretamente, senti-me a mulher ocidental estranha. Mas, quando ela esboçou o sorriso charmoso vietnamita, percebi que não há pontos cardeais entre grandes mulheres.
Em Bali, uma jovem mulher que me entrelaçava o sarong com mestria, mas ia sorrindo olhando para mim e mexia no meu cabelo. Ri com vergonha, pois ela era tão natural e amistosa que desejei que o mundo fosse assim, sobretudo entre mulheres. Mais amigas.
Na Costa Rica, uma senhora cativou-me pela sua forma franca de viver a “pura vida”. Por me explicar como devemos ser fortes, não para sobreviver no mundo, mas porque temos o dever de o fazer enquanto seres viventes e como dever ao mundo que pisamos.
No Belize, uma menina gostou do meu fato de banho e voltou no segundo dia a encontrar-me. Nada me pediu, mas eu dei-lhe uma coisa melhor: um sorriso e um vestido. Levei-o na bagagem precisamente para o oferecer a alguém que eu considerasse especial. E encontrei-a.
Na Guatemala, encontrei uma senhora que cuidava de animais e estava perto dos templos de Tikal. Com traços do povo Maia. Com ela não conversei, o tempo não permitiu. Mas mirei-a e permite-me pedir ao céu que fosse abençoada com mais recursos, mais felicidade, mais sorriso no seu belo rosto, mas que estava cansado naquele dia.
Em Zanzibar, uma jovem senhora destacou-se pela sua hospitalidade tão natural que devia esta ser ensinada a muitas outras mulheres do mundo. Simples, belíssima e muito risonha. Aliás foi dela que recebi um ‘happy new year’ bem gritante, à meia-noite. Estava a meditar quando a ouvi a lançar-me o bom feitiço de ano novo.
No Tibete, uma mulher que contou a história da sua vida e me pareceu uma miragem. Sobre o Tibete mais não digo, quem lá vai ou pensa ir… não diz. Aprende.
No Egito, a mulher que escolho é antiga e já morreu, mas deve ser uma inspiração de empoderamento: Hatshepsut, a primeira mulher faraó do Egito. Ela destaca-se não só pela política e reinado, mas pela mentalidade avançada para a época. E quando refiro ‘avançada’, quero dizer a ‘mentalidade certa’.
Na Grécia, uma senhora quase me fulminou a roupa num anfiteatro de Eurípides. Mas, na verdade ela estava só a admirar, com o seu jeito cultural. Basta termos tempo para nos sabermos ‘ler’ umas às outras. Uma senhora grega com uns olhos azeitona que pareciam contar histórias das vestais antigas.
Em Singapura, uma jovem no safari noturno que me despertou os sentidos por ser tão amistosa, civilizada e disciplinada. Tudo ao mesmo tempo, numa mulher só. Aliás, as mulheres de Singapura são um exemplo muito ocidental, embora noutro ponto do mundo.
Em Nova Iorque, uma mulher que me parou e cumprimentou. Senti, primeiro, uma invasão. Ignorância minha, pois é algo muito cultural e norte-americano. Ela elogiou-me durante o cumprimento, fixou-me os olhos e continuou o seu dia que acabara de raiar. Como se nada fosse. Não era tão bom sermos todas assim umas com as outras? Os elogios sabem melhor quando são assim. Podem fazer a diferença do dia.
Em Miami, uma senhora que é uma boa amiga, como família, marcou-me a minha segunda visita a este lugar americano caribenho. Senti algo tão maternal que raramente sentira na minha vida. Acalentou-me com as suas histórias, com os passeios perto do mar, com memórias passadas que partilhamos em Portugal. Eu acordava e tinha sempre uma mesa farta. Mas emocionei-me quando ela, sem eu saber, me ‘acondicionou’ a bagagem de forma tão cheirosa e com as roupas lavadas e secas. Eu estava tão cansada de tantas viagens e numa fase mais solitária, ela talvez nem saiba ainda o quão me reconfortou. Coisas pequenas para muitas pessoas, mas para mim foi uma forma de abraçar imensa. Foi ser ‘mãe’.
E já que estou nesse lado do globo, ora em New Jersey, outra senhora amorosa que, com a família, me conheceu e me acolheu duas vezes em sua casa. Não só acolheu, como também me mostrou o lado feminista pacífico daquelas bandas. Também me ajudou num assalto, pois nunca sofrera um e ficara sem um dólar para regressar a Portugal. Estava a duas horas do meu voo, cheia de malas. Ela veio de New Jersey (1h30 de tráfego) e levou-me ao JFK em cima da hora. Agradeço-lhe sempre e estamos em contacto até à próxima visita.
Em Marrocos, uma senhora grávida segurou-me a mão com tanta força e soube, mais tarde, que me pedia prosperidade para o seu percurso futuro na maternidade. Não me olhou nos olhos, apenas me ‘prendeu’ a mão como se fossemos uma só mulher.
Posso continuar a lista num outro momento, porque o dia da mulher é ‘todos os dias’. Em todos os lugares do mundo.
Um beijinho a todas as portuguesas que inspiram.
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