Para apreciar Acra não era preciso caminhar muito. Sentado no areal da praia de Labadi tinha o melhor que a cidade oferecia a meia dúzia de passos. À minha frente, um grupo de músicos tocava uma batida frenética nos jambés. Ao meu lado, havia grupos de adolescentes a jogar futebol e outros a treinar boxe, as duas modalidades mais populares do burgo.
Espalhados pela frente marítima, artistas de rua exibiam bonitos quadros e sofisticadas esculturas em madeira, sem conseguirem rivalizar com o banzé vindo das bancas de comida. Aí, volumosas bolas de funge eram regadas com um espesso molho de peixe e o arroz jollof saía dos potes ainda a fumegar, com o aroma a fundir-se com o da maresia do Golfo da Guiné.
Com o cair da noite, os foliões chegavam aos bares de praia, com música para todos os gostos: os mais descontraídos passavam reggae enquanto os mais requintados optavam pelo R&B e pelo afrobeat.
Jamestown: o bairro mais antigo da cidade
Num ápice, fiz amigos: Koffi Richard Mensah, de 19 anos, estudava informática mas sonhava ser ponta-de-lança do Chelsea, como Didier Drogba, o seu herói. “Tenho o sonho de conhecer a Europa mas também me sinto bem aqui. Acra tem tudo o que preciso, é pacífica e tem gente boa. Só a economia é um problema”, disse-me. Aconselhou-me a visitar Jamestown, o bairro mais antigo da cidade, dominado pelo mercado e pela actividade piscatória. Não perdi tempo. Na manhã seguinte, estava a ver o desembarque das pirogas e os pescadores a puxarem redes repletas de robalos, bicas e lulas, que rapidamente transportavam para os fumeiros.
Apesar da visível pobreza, todos sorriam e pareciam trabalhar com prazer. No centro do bairro, o mercado de Makola transbordava de vida, com vendedoras de alguidares cheios de mandioca, pimentos e tomates e uma secção dedicada a têxteis coloridos e alfaiates que desenham vestidos e t-shirts à escolha do freguês.
Dali, pus-me num instante no farol de Jamestown, de onde é possível vislumbrar dois dos fortes que, no passado, serviram de entrepostos de ouro, marfim e escravos: o de Ussher e o de Osu, que tinha sido até recentemente a sede do governo nacional. Estes dois castelos são merecedores de visita.
Uma cidade segura
Mesmo nas zonas mais deprimidas, Acra é uma cidade segura. Tem uma taxa de criminalidade inferior à das maiores capitais europeias e pode orgulhar-se de ter sido uma das poucas nações africanas que evitou guerras civis no pós-independência.
Os mais de 100 grupos étnicos existentes no pequeno país alcançaram a coexistência sem conflito, o que explica a tranquilidade que se respira na capital (só destruída pelos engarrafamentos).
O maior responsável por este feito foi Kwame Nkrumah, que guiou o país à independência em 1957 e se tornou no primeiro líder do Gana. Visitei o seu mausoléu no coração da cidade, perto da Praça da Independência, a segunda maior do mundo depois da de Tianamen, na China, onde estão grandes monumentos patrióticos como o Arco da Independência e a Porta da Estrela Negra.
Para culminar o périplo histórico, entrei no Museu Nacional, que tinha obras de arte dos melhores artistas nacionais bem como uma interessante secção sobre etnografia que me permitiu conhecer melhor as gentes do país.
Acra, a cidade da paz na África Ocidental, mistura o tradicional com o moderno. Tem barracos de madeira e zinco mas também torres espelhadas e edifícios de arquitectura vanguardista, como o do Teatro Nacional.
Num momento, estava a comer arroz com as mãos com uma família local e umas horas depois estava numa discoteca da moda a ouvir os últimos êxitos ocidentais e a beber gin nacional. Recentemente, abriram galerias multidisciplinares como a Ano, em Osu, ou a La Maison, em Moukarzel, o bairro que solta a pólvora da explosão artística que hoje se sente. Até Nick House, o rei da noite londrina, abriu recentemente uma discoteca em Acra - a Carbon.
Se também quer sentir o espírito desta cidade, aproveite os voos da TAP entre Lisboa e Acra.
Texto: Tiago Carrasco
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