Na margem esquerda do Douro, Cinfães está a pouco mais de uma hora dos centros urbanos do Porto, Braga e de Aveiro, e a menos de uma hora de Viseu. Com paisagens naturais únicas, património histórico e cultural diversificado e aldeias encantadoras, que parecem saídas de um conto de fadas, Cinfães é um verdadeiro paraíso para descobrir com calma.
Dia 1
Chegamos a Cinfães com o objetivo de desfrutar da calma e tranquilidade de um paraíso que se estende da montanha até ao rio. Num lugar repleto de histórias e tradições, é junto à população que descobrimos o que de mais genuíno existe em Cinfães.
Siga o rebanho na Serra
No alto da Serra de Montemuro, existem ainda vários pastores que, todos os dias, saem com o gado, só regressando à noite. A experiência de seguir o rebanho e acompanhar um pastor durante uma manhã é uma das mais enriquecedoras. Permite descobrir a região e as suas tradições de forma genuína e inspiradora.
Na pequena aldeia de Aveloso, na freguesia de Tendais, encontramos Abel com as suas cabras e ovelhas. Ao todo, conta-nos, são cerca de 60 cabeças de gado no total. Filho e neto de pastores, faça chuva ou faça sol, Abel todos os dias sai com o gado de manhã para a serra e só regressa quando o sol se põe. Ao seu lado, o seu cão acompanha-o durante o dia todo, tornando menos solitária a tarefa. Á volta do pescoço, o animal usa uma coleira de proteção contra os lobos, que ainda existem na serra, embora em menor número do que em outros tempos. "Uma vez, o meu falecido pai encontrou sete lobos seguidos", conta Abel, garantindo que agora o perigo é menor, mas que ainda existe.
Quando lhe perguntamos se gosta do que faz a resposta é simples: "nunca fiz mais nada". Quando o questionamos sobre se gosta de viver nesta pequena aldeia na serra, a resposta mantém o mesmo registo: "nunca saí daqui". Ambas as respostas vêm acompanhadas de um sorriso genuíno, de quem ama o que faz e o local onde vive.
Abel continua tranquilo e sereno, de cajado na mão e o seu cão aos pés, a olhar as cabras e ovelhas que se dispersam na encosta, enquanto nós descemos o monte e partimos para o próximo destino.
Seguimos até ao parque eólico de Cinfães, onde Maria Emília, também ela pastora, está com o seu gado. Maria Emília é uma das pastoras que se podem acompanhar através do programa “Siga o Rebanho” da Câmara Municipal de Cinfães.
Maria Emília é pastora mas, ao contrário de Abel, nem sempre o foi. Maria Emília era bordadeira e tirou o curso de corte e costura durante a juventude. Bordava, costurava e tricotava para vários clientes, mas decidiu mudar de vida e, agora, aos 69 anos, percorre diariamente oito quilómetros com o gado, desde a sua aldeia, Fermentãos, em Tendais até ao parque eólico de Cinfães. Quando lhe perguntamos o motivo da mudança de vida, Maria Emília é categórica na resposta: "Foi o destino".
Começou por fazer apenas vigia de gado, com outras pessoas e, como as tarefas eram divididas, Maria Emília levava o rebanho apenas uma vez por mês. No entanto, enquanto as outras pessoas foram vendendo o gado, Maria Emília teve pena de vender o dela e agora, todos os dias, leva o gado até ao cimo da serra. Durante a manhã, cuida da casa e dos animais que tem em casa. "São dois bois grandes que tenho em casa e, agora, mais dois pequenino". Depois do almoço, sai de Fermentãos e percorre 8 quilómetros. "É isto que me faz bem. De manhã, tenho mais dores porque os ossos estão parados, mas à noite já estou bem", garante.
Não ando sozinha, ando com Deus e sinto-me feliz
Quando perguntamos se não se sente sozinha, Emília responde: "Não ando sozinha, ando com Deus e sinto-me feliz". Maria Emília não fica parada e, enquanto guarda o gado, ocupa-se com outras coisas. Ás vezes, apanha flor de carqueja para chá. Diz que faz bem a tudo e que é muito procurada. "Num ano, fiz 50 euros só a vender flor de carqueja", diz orgulhosa. No restante do tempo, faz peças de artesanato que depois vende em feiras. Vive uma vida simples e tranquila tendo os animais por companhia. Para muitos, poderia parecer solitário, mas Maria Emília garante: "Sinto-me bem e sinto-me feliz". E nós vemos a felicidade nos seus olhos enquanto nos despedimos.
Museu Etnográfico de Nespereira
No Museu Etnográfico de Nespereira podemos ficar a conhecer mais sobre os modos de vida e tradições dos povos da região. Abriu em 2010 e foi criado para salvaguardar a identidade local e regional, através da preservação, partilha e mostra de vivências, “histórias” e aspetos da ancestralidade dos nossos povos. O edifício foi alvo de uma intervenção para manter a traça tradicional do corpo principal e refuncionalizar as partes que apoiam as atividades do museu.
O espaço, multifuncional, recebe ainda vários tipos de eventos como exposições e ações temáticas e didáticas/pedagógicas. Por marcação, é também possível jantar no local, da responsabilidade do Grupo Folclórico de Nespereira.
Dia 2
Depois de um primeiro dia tranquilo e repleto de boas conversas, o segundo dia deste roteiro começou cedo, com o objetivo de visitar vários locais imperdíveis, começando pela serra e descendo em direção ao rio.
Portas de Montemuro
Num dos pontos mais altos da serra do Montemuro, no limite entre Castro Daire e Cinfães, encontram-se as ruínas da Muralha das Portas do Montemuro, localizadas a, aproximadamente, 1213 metros de altitude, revelando-se um bom ponto de observação das paisagens da serra do Montemuro.
Ponte da Panchorra
A unir os concelhos de Resende e Cinfães, sobre o Rio Cabrum, está a Ponte da Panchorra, parte integrante da Rota do Românico. A Zona Envolvente à Ponte da Panchorra é um espaço agradável perfeito para desfrutar da natureza no estado puro e onde é possível, por exemplo, fazer um piquenique na sombra das árvores enquanto se ouve a água a correr.
Aldeia da Gralheira
Nos limites do concelho, em plena Serra do Montemuro, a cerca de 1100 metros de altitude, a aldeia da Gralheira é conhecida como a “Princesa da Serra” e um bom exemplo de uma aldeia serrana, onde o tempo passa mais devagar. Aqui, as pessoas são autenticas, estão prontas para receber visitantes e têm sempre tempo para a conversa. No centro da aldeia é possível ver algumas casas típicas, construídas com granito e algumas delas, ainda cobertas de colmo, como era tradição.
Serranitas da Gralheira
Na antiga casa do alfaiate da aldeia, encontramos agora as Serranitas da Gralheira, nome gravado numa placa azul afixada à porta. Na pequena casa, onde há mais de 50 anos viviam 9 pessoas, encontramos agora Helena Silvestre. Helena criou as Serranitas da Gralheira, como "uma homenagem às mulheres de Montemuro", que, além de fazerem todo o trabalho domésticos, eram também pastoras, mães, tecedeiras, agricultoras e costureiras.
O espaço tem uma função quase museológica e mostra como se vivia na Gralheira em outros tempos, sendo que a casa mantém a traça original e vários móveis da época. Além disso, funciona como loja onde é possível comprar o artesanato das Serranitas e ficar a saber mais sobre a sua tradição. Podemos encontrar o tradicional capucho da aldeia, uma peça de vestuário, confecionada em burel, indispensável na vida serrana. Além disso, é possível encontrar cestos em palha de centeio (brezes) e as amorosas Serranitas, as bonecas criadas em homenagem às mulheres de Montemuro, que deram início ao projeto.
Associação R.C.D. da Gralheira
Para ficar a conhecer mais sobre os modos de vida da população da Gralheira, é possível visitar a ARCDG que tem como objetivo proteger as antigas tradições e divulgar as valências que aldeia possui na atualidade. Ali, é possível ver o forno típico, os telhados de colmo e a recriação de uma casa tradicional, em que as camas são frequentemente cobertas com mantas coloridas e tradicionais.
Museu Serpa Pinto
Em homenagem ao ilustre Explorador Cinfanense Serpa Pinto, o museu, com o mesmo nome, foi aberto ao público em 2000 e ocupa o edifício de traça pública e que outrora serviu de Posto da Guarda e Cadeia. No espaço é dada a conhecer a vida de Serpa Pinto e a sua travessia do continente Africano. Além de mobiliário doado, o espaço acolhe, de forma permanente, duas coleções: um conjunto de peças que têm vindo a ser encontradas em escavações e intervenções no território do Município e a história e vida do General Alexandre Serpa Pinto, com um vasto espólio resultante da aquisição municipal da casa que outrora residia.
Miradouro do Teixeirô
Para apreciar a paisagem circundante e conseguir fotografias dignas de um cartão postal, nada melhor do que visitar o Miradouro do Teixeirô. A partir deste local é possível contemplar diversos locais dos concelhos de Cinfães e Baião. É possível ver a albufeira da Pala, resultante da construção da barragem de Carrapatelo, a linha ferroviária do Douro, a ponte de Mosteirô, concebida pelo famoso engenheiro Edgar Cardoso e o cais de Porto Antigo. Além disso, é possível perceber o local exato em que o rio Bestança se une ao Douro.
Centro Interpretação do Vale do Bestança
No Centro de Interpretação é possível ficar a conhecer as características biofísicas e paisagísticas do vale do rio Bestança, ao experienciar uma visita virtual e interativa. O Centro conta com quatro salas onde é possível ter uma percepção de como a paisagem muda ao longo das quatro estações do ano. Além das quatro salas dedicadas às estações do ano, o centro conta ainda com o Espaço Território e Espaço Fauna/Flora onde os visitantes terão a oportunidade de experienciar, num único local, uma visita virtual e interativa ao vale do Bestança, conhecer a maioria da sua extensa fauna e flora, e explorar o seu território através das várias plataformas tecnológicas.
Sup yoga no Bestança
Quando chegamos às margens do rio Bestança, estava a ocorrer uma sessão de Sup Yoga. Várias pessoas equilibram-se em cima da prancha, alongando-se e fazendo várias posições comuns no ioga. Trata-se de um projeto da Kay.up Douro Valley, uma empresa criada por Vítor Hugo e Cátia Ferreira, um casal de Gaia que deixou a vida na cidade para viverem em Cinfães. As atividades disponíveis na natureza são várias e têm como denominador comum a água.
A experiência de Sup Yoga tem uma duração de 2h30, começa em Porto Antigo e segue rio acima em paddle. Depois, os participantes reunem-se e começa a verdadeira aula de ioga, orientada por Cátia que conduz a experiência com voz a calma que torna tudo mais relaxante. Em cima das pranchas, vai-se mantendo o equilíbrio enquanto se fazem alongamentos e o sol se começa a por no horizonte.
Onde comer em Cinfães
A gastronomia tradicional é um dos ex-líbris de Cinfães e existem vários locais onde é possível saborea-la. Se visitar Cinfães em grupo, pode marcar com o Grupo Folclórico de Nespereira e fazer uma refeição no Museu Etnográfico e sede do grupo. Terá oportunidade de jantar num edifício típico e ser servido pelos membros do grupo, vestidos a rigor.
Numa visita à Gralheira, o Restaurante Encosta do Moinho oferece pratos típicos como o cozido e o cabrito, além de pratos tão típicos como painças, feitas com milho triturado, um prato tradicional no território serrano durante o inverno.
No centro de Cinfães, a recomendação vai para o Restaurante O Rabelo, que dispõe de pratos tradicionais como o Arroz de Aba, mas também sobremesas originais que juntam os sabores tradicionais à inovação dos novos ingredientes e novas apresentações.
Publicado originalmente a 29 de junho de 2021.
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