Em Casa de Papel, Berlim é quem comanda a acção no terreno. É capaz de tudo para tirar do caminho aqueles de quem não precisa. Narcisista, manipulador, superior, capaz de tudo para conseguir seguir aquele que acredita ser o caminho. A cidade que lhe foi atribuída, em nome, não podia assentar-lhe melhor. Berlim cidade é tudo isso, também: uma cidade poderosa onde a bipolaridade se faz sentir. A nossa estória começa e termina aqui: Berlim é uma cidade bipolar.
Guerra e superação: era uma vez um muro
Se é verdade que a guerra marca os destinos da Alemanha, também não é mentira que a Guerra Fria foi determinante para aquilo que hoje a cidade (e o país!) é. Uma guerra de extremos, uma guerra silenciosa, uma guerra de medo no tempo em que os EUA e a URSS lutavam entre si por um lugar no topo do mundo. Berlim foi o palco da Guerra Fria e o Muro de Berlim é o expoente máximo. Pode (e deve!) ser analisado de diferentes perspectivas.
A East Side Gallery é uma galeria a céu aberto e a arte uma das formas mais criativas que a liberdade pode alcançar. O optimismo passa por aqui e, aquilo que anteriormente era opressão, vergonha e medo, hoje dá lugar a uma felicidade inspiradora que a queda de muros traz. Em Bernauer Strasse fica-se com uma ideia, ainda que distante, daquela que era a realidade de uma cidade dividida em dois. As cores aqui não têm lugar. Antes dão lugar ao cru do betão e à distância que um metro pode demarcar, tudo aquilo que um muro pode esconder.
Do lado de lá, vídeos e fotos que dão maior impacto à experiência. Assim é o Berlin Wall Memorial, o Centro de Refugiados Marienfelde e a exposição acerca das Estações de Metro fantasma que aqui vivem. O Checkpoint Charlie é um dos polos deste mundo dividido, um marco onde outrora era dos poucos onde seria possível a obtenção de um visto diurno para ir de Berlim Oriental para Berlim Ocidental. Charlie não por ser o nome de um soldado mas porque corresponde à terceira letra do vocabulário fonético da OTAN. Se havia pessoas que pediam “ordem para avançar”, outras houve que escaparam habilmente e muitas, infelizmente, foram assassinadas sem dó nem piedade. Há registo de muitas elas, das mais simples às mais complexas, agregadas no Museu do Muro de Checkpoint Charlie, que merece uma visita.
Torre de Televisão de Berlim | Fernsehturm
São 368 metros de torre, o que faz dela o ponto mais alto de Berlim. Quer seja por simbolismo ou utilidade, foi construída em 1969 para mostrar a superioridade do comunismo sobre o capitalismo. Localizada ao centro de Alexanderplatz, a praça mais importante da ex-RDA, tem com ela um fenómeno que dá pelo nome de “A Vingança do Papa”: quando o Sol se faz sentir, vê-se uma cruz reflectida no centro da esfera. Acredite-se ou não, para além da lenda, o cimo da torre proporciona uma das melhores vistas de Berlim, onde poderá confirmar a bipolaridade de estilos, também arquitectónicos.
Antigo aeroporto de Tempelhof
O passado assumido, o presente superado. O espaço que antes estava destinado à lei da sobreviência, dá lugar à diversão de um parque urbano que hoje é, como outrora, um dos pontos-chave da cidade. Datam de 1909 os primeiros voos que o aeroporto Tempelhof testemunhou. Em 1923 foi considerado oficialmente um aeroporto e em 1926 foi fundada a companhia aérea Lufthansa que aí estabeleceu a sua base. Aquando da divisão da cidade em quatro, cada uma delas controlada pelas potências vencedoras de II Guerra Mundial, o aeroporto ficou nas mão dos americanos, tomando-o em 1945.
Quando em 1948 a URSS bloqueou as rotas terrestres e fluviais, Tempelhof desempenhou o papel principal no fornecimento da cidade — também de “chocolates voadores”, graças a Halvorsen, o “tio que bate asas”. A Ponte Aérea criada chegou a realizar 1400 voos diárias durante as 24 horas do dia, de forma a fornecer alimentos e bens a todos os cidadãos. O lado soviético, não se rendendo, finalizou o bloqueio a 1949. Depois da base aérea desmontada e pelas enormes perdas que gerava, foi fechado para renascer em 2010, dando lugar a um parque maior do que o Central Park, em Nova Iorque.
Berlim & Berlim, ambos ao seu dispor
Assim é a cidade de Berlim. Sinónimo de poder, fervilhante em aventura, e dona de uma história recente de polos que se atraem e retraem à medida que o tempo passa. Uma história que cruza com a personagem mais sinistra da Casa de Papel: o fim cruza-se com o início num ciclo que não pára e se renova a cada recomeço. Seja no pequeno-ecrã, seja ao vivo e a cores, Berlim está à espera, a cidade bipolar.
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