Antigamente, os agricultores do município de Águila consideravam o café como rei, num país que cultiva um dos melhores grãos do mundo e é o terceiro maior produtor depois do Brasil e do Vietname.
Mas, há oito anos, pararam com os abates de floresta que abriam espaço para as plantações e silenciaram as espingardas com as quais caçavam aquele que consideravam ser inimigo: o único urso da América do Sul que vive nos Andes, da Argentina à Venezuela, e carrega um tipo de máscara branca.
Uma estratégia público-privada, chamada "Conservamos a vida", incentivou Julián Pinilla e outros novos produtores de café a entregar parte das propriedades para o urso viver em paz, em troca de se tornarem beneficiários das construções dos sistemas de tratamento de água, fossas sépticas e tecnologia para o processamento do café.
"O urso salvou-nos", confessa Pinilla, de 37 anos, à AFP. O agricultor cedeu 28 hectares dos quase 400 somados entre os vizinhos para o urso-andino.
Desde então, nas florestas ao redor dos seus cafezais, as armadilhas fotográficas identificaram uma florescente biodiversidade: raposas , cutias, tatus, fuinhas, cervos, gatos-do-mato, onças-pardas e até um bebé urso que brinca com a mãe.
"Jardineiro das florestas"
A mais de 1.800 metros de altura, os agricultores abriram passagens entre a floresta e conquistaram o território que sempre havia pertencido ao animal de pelagem negra ou castanha.
Em diversas ocasiões, os disparos serviram para espantá-los ou até matá-los, recorda Pinilla, cuja família viveu do café por várias gerações.
Com a nova estratégia de cuidado tudo mudou. "Já não temos tantos conflitos com o tema da caça, com o abate de floresta porque (...), mudou, digamos, com essa consciência", explica Pinilla.
O Fundo Mundial para a Natureza (WWF por sua sigla em inglês) calculou, em 2017, que na Colômbia havia aproximadamente 8.000 ursos-andinos e a União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN) classificou a espécie em risco de extinção.
A principal ameaça de morte é a destruição do habitat natural devido à atividade humana.
Graças aos benefícios que a comunidade recebe por tomar conta do urso, Pinilla e outros cafezeiros produzem o "Café Urso Andino".
Nos pacotes do produto sempre está presente o denominado "jardineiro das florestas", por causa do papel de disseminador de sementes durante as longas caminhadas que realiza.
Em 2016, os ursos ocupavam 52% dos 3.000 hectares que os agricultores haviam reservado para o animal na Cordilheira Ocidental, no âmbito de uma iniciativa que contou com a participação de outras comunidades. Em 2021, a percentagem aumentou para 76%.
Homem x Urso
Mas nem em todas as montanhas da Colômbia o urso-andino dá as suas longas caminhadas nem posa para campanhas publicitárias, como acontece em Águila.
Em alguns departamentos como Cauca (sudoeste), Arauca (leste) e Cundinamarca (centro), ainda é vítima da caça, afirma Mauricio Vela-Vargas, biólogo da fundação WCS e responsável pelo programa.
"Os ursos vão sair dos ecossistemas naturais (...) e terminam (por se envolver) em conflitos: ursos andinos a atacar animais domésticos, a comer os cultivos, particularmente banana, milho", explica o especialista.
O trabalhador urso-andino protege a biodiversidade das áreas onde vive e serve como espécie "guarda-chuva" para outras que beneficiam com a presença. "É um bom indicador do estado de conservação dos ecossistemas", explica Carolina Jarro Fajardo, sub-diretora do Sistema Nacional de Áreas Protegidas.
"Estamos a conservando o urso, estamos a deixar para ele uma parte de floresta que está a dar oxigénio para todos, não apenas para o urso, mas também para todas as pessoas", resume Pinilla.
Comentários