O fascínio maior é ao pôr do sol e fora das muralhas. No alto da povoação, a cerca de 800 metros de altitude e para lá da Porta Nova ou da Porta Falsa.
Ambas têm uma vista magnifica. Embalados pelo silvo do vento, os olhares são conduzidos para vales enormes e o fundo do horizonte é preenchido com a serra da Estrela. Ao pôr do sol, a paisagem ganha um encanto que não se esquece.
Mesmo os que todos os dias sobem ao interior das muralhas como é o caso de Arminda Esteves. “Fica muito bonito e naquela parte de cima até parece que ilumina o vale todo. Então e quando há neve! Os telhados cheios de neve. É muito bonito! Agora já não neva muito. Antigamente, quando eu era rapariga e moça nevava durante cinco dias. Fazíamos bonecos.”
Tudo leva a crer, pela nossa imaginação, que deve ser muito bonito o cenário do casario e as ruas inclinadas de Sortelha com neve.
Arminda Esteves é natural de Sortelha e foi das poucas pessoas que não emigrou. Percebe-se a sua relação afetiva com a aldeia histórica. “Sortelha é uma terra muito bonita não há outra igual a esta. Tem monumentos muito bonitos e é muito visitada”.
Apesar da aberração das eólicas em serras vizinhas, partilho a opinião de Arminda Esteves, em particular na preservação do património. Em termos gerais, Sortelha é, entre as Aldeias Históricas, uma das que melhor preservou o seu património.
Encontram-se registos da época medieval, até pela designação das habitações em função dos cargos ou funções que tiveram os seus ocupantes durante muitos anos. É exemplo a casa do Governador (função desempenhada nos séculos XV e XVI) ou a casa do escrivão.
Destaque também para uma outra casa, que tem uma janela manuelina no piso superior, um antigo relógio de sol em pedra na parede e a fachada um pouco abaulada pela força dos anos.
A igreja e o antigo centro político e administrativo continua a ser a atração. O largo do Pelourinho, a sede de concelho (até 1855) com a habitual antiga prisão no piso inferior e a câmara no piso superior. Hoje é a sede da Junta de Freguesia.
O pelourinho está no centro do largo e vinca o seu simbolismo através da esfera armilar atravessada por um espigão.
A monumentalidade da Torre de Menagem sobressai a tudo o resto na zona do castelo.
Pode-se caminhar ao longo de parte das muralhas e temos uma visão da área envolvente. Também se pode caminhar por parte significativa das muralhas e ver a disposição do casario e dos principais monumentos.
Os pontos de passagem da muralha dão de imediato uma perspetiva da beleza do património. É o caso da Porta da Vila, o principal ponto de acesso a Sortelha e que nos leva para uma praça onde se destaca um lódão, a Casa nº1 e parte da muralha que foi reconstruída após ter sido dinamitada nas invasões francesas.
Talvez seja na Porta da Vila que se encontra parte da explicação para o abandono, em pouco tempo, da zona histórica de Sortelha que quase não tem residentes permanentes.
“Nem lhe digo quantos. A maior parte vive lá em baixo. Eu criei-me aqui como a maior parte. Uns foram para Lisboa outros para a França.
Os que ficaram fomos todos para os arrabais. As portas não deixavam entrar um camião grande, não podíamos ter alfaias agrícolas, estrume, animais e houve uma altura em que a gente vivia disso. Agora, talvez há cerca de 20 anos, já se podia aqui estar.”
Surgiram novas fontes de receita e atividades decorrentes do turismo deram nova vida a Sortelha. A rota das Aldeias Históricas foi um forte contributo, como também novos proprietários das casas que procuram renová-las. O casario de granito é maioritariamente de dois pisos. Muitos dos edifícios antigos mantêm-se de pé, firmes, apesar da rudeza do ambiente. Muitas casas foram recuperadas.
“A maior parte são de pessoas de fora que compraram. Vêm quando têm oportunidade. Não é no verão que estão mais ocupadas pelas pessoas que compraram. É mais no tempo frio. No verão, se calhar, vão para a praia.
As outras são casas grandes os filhos herdaram e por vezes vêm cá. Uns 15 dias, outros mais tempo, e mantêm-se assim.”
Algumas casas servem também de alojamento para os visitantes. Passar, pelo menos, uma noite aqui é uma experiência interessante. Vive-se um ambiente singular. Sem a situação excecional da COVID, é hábito haver restaurantes e bares abertos durante a noite.
No interior da muralha há um restaurante aberto todo o ano, como também a loja de artesanato no edifício da Junta de Freguesia. Estão em exposição produtos locais. Mel, licores, doces, rodilhas de pano e peças de tecelagem. São feitas por artesãos desta região. Arminda Esteves faz várias peças em bracejo, uma planta utilizada para têxteis e que faz parte da tradição de Sortelha.
“O nome da palha é bracejo. Vou apanhar ao campo e é difícil de arrancar. Arrancamos a parte do fundo que é a que se mantém. Havia uma altura que se fazia muito mas depois as mulheres foram envelhecendo. Quando elas morreram já eu estava a trabalhar. Por vezes apareciam os turistas e iam comprando. Antigamente era assim e até havia uma senhora que só fazia chapéus.”
Os visitantes do espaço de artesanato “procuram de tudo um pouco, embora as queijeiras são as peças de maior procura. Se virarem ao contrário faz uma caixa que dá para o pão.” É o turismo que dinamiza a aldeia e nos últimos anos a visita de espanhóis é um forte contributo.
Longe vão os tempos em que Sortelha ocupava uma posição estratégica para o reino de Portugal, tendo em conta a disputa fronteiriça com o reino de Leão. Com o Tratado de Alcanizes, em 1297, a fronteira ficou distante da vila (está a 45 quilómetros) e reduziu a sua importância estratégica. Sortelha está a 14 quilóemtros do Sabugal.
Sortelha com sol ou neve faz parte do programa da Antena1 Vou Ali e Já Venho, e a emissão deste episódio pode ouvir aqui.
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