Ao passearmos por Sesimbra encontramos vários murais em paredes de ruas e casas. Muitos alusivos ao contexto marítimo. O mesmo tema foi retratado há mais de dois séculos.
No primeiro piso da Capela do Espírito Santo dos Mareantes, descobriram um antigo hospital e as paredes teriam sido grafitadas no século XVIII.
Uma situação única em Portugal nas palavras de Andreia Conceição, arqueóloga e coordenadora do Museu Marítimo de Sesimbra, "Não temos registos históricos de quem seria o autor e quais os motivos dos grafitis das embarcações. Pensamos que foi alguém que assistiu a estas cenas marítimas, que observou as embarcações e, provavelmente, para ilustrar a narrativa de uma história foi pintando”
A descoberta das pinturas foi em 2005, quando de “um estudo cromático de uma parede e identificámos um elemento inédito que representa um canhão com um projétil para uma embarcação. Todos as representações de embarcações já foram estudadas por vários especialistas em arquitetura e história naval e são muito fiéis. Temos, por exemplo, um xaveco marroquino com velas triangulares, naus caravelas e canhões. São cenas marítimas muito ricas e únicas em Portugal”, refere ainda Andreia Conceição.
São traços simples a negro e que sobressaem no fundo de cal. As representações das embarcações surgem em várias paredes e, facilmente, percebemos as formas. Não se sabe se são de um ou mais autores.
“O que sabemos é que, em meados do século XVIII, o espaço utilizado como hospital estaria completamente descativado e foi transformado numa estrabaria. O mestre da Ordem de Santiago deu ordem para que o espaço fosse limpo e os animais retirados. Assumimos que terá sido nessa altura que os grafitis foram pintados. Estão aqui há mais de 250 anos, o que faz com que seja um espaço único em Portugal”.
O espaço tem pouca luz natural, as paredes estão nuas, em muitas partes vemos os tijolos, a construção original. “O hospital ficou soterrado. Como uma verdadeira bolha no tempo. Quem visita hoje o hospital vê as paredes originais e a decoração.”
Por outro lado, a visita também nos revela o que seria um hospício medieval com camas para pobres, doentes e peregrinos. “O objectivo era dar apoio sobretudo aos peregrinos. Sesimbra está no caminho de peregrinação para vários pontos religiosos. Nossa Senhora do Cabo Espichel, Cabo de S. Vicente e Santiago de Compostela, com a peregrinação por via terrestre e marítima.”
Uma das últimas funções do edifício foi de Biblioteca Municipal e, quando se fazia obras, foi encontrado um arco que esteve na origem de trabalhos arqueológicos no início da década de 70, que levou à descoberta do antigo hospital e das pinturas.
Foi realizada uma investigação complementar e identificaram-se documentos que relatam as visitas dos freires da Ordem de Santiago. Estes dados permitem reconstituir a antiga capela e o hospital que foram construídos pela confraria do Espírito Santo dos Mareantes, uma das mais antigas corporações de pescadores em Portugal.
A actual fachada e o interior da capela resultam de uma reconstrução após o terramoto de 1755 e ainda conseguimos espreitar para uma pequena ala atrás do altar que nos remete para o século XVIII. “Consegue-se ver o que seria o altar do século XVII, porque o do século XV terá ruido. Temos algumas obras que ainda fariam parte do acervo da capela barroca.
O Padre Eterno e as colunas salomónicas. Ao longo da visita, o público poderá interpretar o espaço com as palavras dos vários mestres da Ordem de Santiago que periodicamente vinham visitar a capela e deixaram uma relação dos bens e do próprio espaço.”
A coleção de arte sacra que faz parte da exposição permanente é constituída essencialmente por esculturas e pinturas e “é a mais importante coleção de arte sacra do nosso concelho. Temos obras de arte que vão do século XV ao século XIX”.
O espaço museológico abriu as portas ao público em 2004 e o edifício foi classificado como Imóvel de Interesse Público.
As pinturas murais na capela do Espírito Santo dos Mareantes em Sesimbra faz parte do programa da Antena1 Vou Ali e Já Venho e a emissão deste episódio pode ouvir aqui.
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