Muito rapidamente o povoado de cerca de meio milhar de habitantes passou de uma economia agrária, com lastro medieval, para a fase industrial.
Talvez a melhor ilustração desta mudança é a carta que o chefe da estação escreveu ao dono da principal casa agrícola a encomendar 200 litros de azeite para iluminar a gare ferroviária que inaugurava no dia seguinte.
Solicitava ao “ilustríssimo amigo e senhor Melo” o “fornecimento à “Linha da Beira Alta 200 litros de azeite. Aproveito para lhe dizer que amanhã, 10, já tenho aqui bilhetes para todas as estações Norte e Beira Alta”.
Com a inauguração da estação, muita gente tinha de ficar na Pampilhosa e alguns até a dormir. A Linha da Beira Alta não tinha horários sincronizados com a Linha do Norte que pertencia a outra companhia.
Surgiu uma nova fase na Pampilhosa a que acresceu a industrialização com fábricas de cerâmica.
A carta do chefe da estação está em exposição na Casa Quinhentista da Pampilhosa, onde funciona o Museu Etnográfico.
A gestão e posse da casa é de uma associação cultural - o Grupo Etnográfico de Defesa do Património e Ambiente da Pampilhosa, GEDEPA - a que pertence Ana Pires, nossa cicerone na visita.
A casa foi o centro da economia pré-industrial e o principal pólo económico da povoação. Quando da chegada do comboio pertencia à família Melo, uma das mais relevantes da região. Quase toda a gente trabalhava para esta casa agrícola que centrava a sua actividade no azeite. No entanto, a origem da construção é do século XVI.
A propriedade era do Mosteiro do Lorvão desde o século XII. Para melhor cobrarem as rendas as freiras mandaram construir um paço e depois o celeiro. Segundo Ana Pires, o celeiro tem uma “expressão fantástica e é uma peça rara em Portugal”.
Entramos por uma porta de madeira larga. Passamos para um pátio onde já se podem ver objectos típicos de uma casa agrícola abastada. Logo na primeira sala deparamos com um conjunto de talhas muito grandes para o azeite.
Ao longo dos dois pisos da casa e do celeiro encontramos objectos muito diversos que ilustram a vida desta comunidade em particular na era pré-industrial. A diversidade também advém do facto de muitas peças terem sido oferecidas por locais.
O GEDEPA adquiriu o prédio quase em ruína no inicio dos anos 80. Havia uma forte preocupação de salvaguarda do património e o projecto era liderado por pessoas reputadas. O que permitiu ao proprietário vender por um preço “simpático” a casa e muitos populares quiseram partilhar peças antigas que tinham em casa.
Alguns dos objectos em exposição ilustram também a chegada da linha férrea, instrumentos ferroviários e até bilhetes para quase todas as estações da Linha da Beira Alta.
Uma das salas mais interessantes fica no piso térreo, a meia luz e está repleta de tulhas enormes. São reservatórios muito grandes e alguns ainda têm resíduos de azeite. São todos de pedra e há dois de madeira.
Os arcões foram forrados a folha de Flandres para conterem o azeite.
Na Casa Quinhentista há ainda uma biblioteca e um arquivo documental.
O GEDEPA procura ainda dar a conhecer a história e a cultura da Pampilhosa com a edição anual de uma revista.
Preserva o rancho folclórico e tem uma secção de teatro.
Ana Pires diz que a Casa Quinhentista é um tesouro escondido mas se visitar a Pampilhosa recomendo que descubra uma outra preciosidade que passa despercebida.
São esculturas do mestre Teixeira Lopes cuja família instalou uma das primeiras fábricas de cerâmica na Pampilhosa.
Teixeira Lopes é o autor da estátua que está num chafariz. Chama-se a Fonte do Garoto porque a estátua de bronze representa um rapaz do povo. Duas outra estátuas estão na rua em frente.
Suspensas numa parede e retratam duas crianças.
Em frente fica da casa de Joaquim da Cruz, primeiro presidente da Câmara na República e que ficou também conhecido por ser maçon, industrial e benemérito. A casa é propriedade da Câmara Municipal e vai ser restaurada. A Casa Quinhentista está em vias de classificação como Património de Interesse Público.
A Pampilhosa e o comboio na Casa Quinhentista faz parte do programa da Antena1, Vou Ali e Já Venho, e pode ouvir aqui.
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