Em pouco mais de duas décadas, Hélio da Silva cumpriu a missão quixotesca de plantar mais de 40 mil árvores numa área dominada pelo concreto em São Paulo, um presente verde para esta megalópole em tempos de crise climática.
Chamaram-no de "louco" quando começou sozinho a criar o primeiro parque linear da cidade, que se estende ao longo de duas movimentadas avenidas, numa área que antes era um perigoso aterro e um ponto de consumo de crack.
Mas este antigo executivo de grandes empresas da indústria alimentar, de 73 anos, conseguiu levar adiante o seu esforço graças às suas economias e à sua vontade inabalável.
"Outros parques lineares foram projetados, foram construídos por" empresas que "aportaram muito dinheiro", diz à AFP Hélio, nascido na cidade de Promissão, no interior do estado de São Paulo.
"Esse foi construído por um louco, um maluco, um visionário, um cara que queria deixar um legado para a cidade que o acolheu, São Paulo. Então eu comecei e nunca mais parei de plantar árvores", conta este homem que, pelo seu espírito decidido e aspeto afável, lembra o protagonista da animação "Up".
A ideia inovadora começou em novembro de 2003, após uma caminhada com a sua esposa Leda por aquela então região depressiva do seu bairro da Penha, na zona leste da capital económica do país, de 12 milhões de habitantes.
Nem sequer pediu permissão formal, mas cinco anos depois, a autarquia inaugurou oficialmente o local como Parque Linear Tiquatira.
Pulmão para a cidade
Hoje, 32 mil exemplares de mais de 160 espécies de árvores, a maioria nativa, crescem sobre esta área de 3,2 quilómetros de comprimento e cerca de 100 metros de largura.
Nos arredores, Hélio plantou outras nove mil árvores, sempre com a regra de que, a cada 12 plantadas, uma deve ser frutífera para atrair pássaros. Demora em média 10 minutos para plantar cada muda.
De acordo com a autarquia, já foram avistadas 45 espécies de aves nas copas de árvores como pau-brasil, palmeiras, ceibas e cedros, que formam a floresta, isolam o ruído e proporcionam sombra.
"Eu falo, para você, seu neto, seu bisneto, dentre as 160 espécies que tem aqui, tem mais de mil jequitibás. Jequitibá é uma árvore brasileira com longevidade de mais de 3.000 anos. Daqui a 500 anos, estarão aqui, as araucárias estarão aqui, outras aves estarão aqui. É muito bom deixar esse legado", ao qual ele destina entre 35 e 40 mil reais (entre 5.700 euros e 6.500 euros) por ano, explica.
Segundo especialistas, espaços verdes em áreas urbanas são fundamentais para absorver o calor e melhorar a qualidade do ar, perante a elevação das temperaturas provocada pelo aquecimento global, do qual São Paulo não escapou nos últimos tempos.
De árvore bisavô a bisneto
Hélio costuma conversar com as suas mudas - embora "baixinho", sublinha, para que não o chamem de louco "mais uma vez" - com a cumplicidade de quem as viu crescer. Às vezes, para para apontar uma família de árvores, desde o bisavô até o bisneto.
Os vizinhos cumprimentam com carinho quando veem este idoso, que costuma carregar dois álbuns com fotografias que comprovam a transformação do terreno, desde quando era um pasto até os dias de hoje.
O que mais lhe enche de orgulho, todavia, é ver os outros moradores, que antes não tinham onde se exercitar ou se divertir, a desfrutarem do parque.
"Olha o que ele transformou aquela área degradada. Olha como é que está agora. Espetáculo. E a gente não sai daqui, né?", conta Angela Maria Fiorindo Pereira, uma professora aposentada de 69 anos que vive na Penha desde os anos 1990.
"Trazer vida"
Desde que se aposentou, em 2022, Hélio caminha diariamente pelo parque para identificar novos espaços para reflorestar e ver quais árvores precisam de adubo ou poda. Quando encontra necessidades, mãos à obra.
Conta com a ajuda esporádica de voluntários, enquanto ele próprio já passou por algumas cirurgias nos ombros desgastados de tanto cavar e plantar.
E ainda está longe de terminar, pois a sua meta é plantar um total de 50 mil exemplares.
"Quero trazer vida para cá", afirma, resignado pela desconexão do ser humano com a natureza. Consciente do avanço do tempo, realiza palestras com a esperança de que, no futuro, alguém siga o seu exemplo.
Enquanto isso, continuará com o seu ofício, gravado no seu cartão de visitas: "Hélio da Silva, plantador de árvores".
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