Neste Natal, a hospitalidade tem um nome: chama-se Serra da Estrela. Pudesse a Serra estender-se de Norte a Sul, do Litoral ao Interior e levar o melhor de si a cada um – talvez seja possível! Porém, a melhor forma de viver a Serra da Estrela é visitá-la e conferir, in loco, a hospitalidade das suas gentes, a qualidade dos seus produtos, a riqueza da sua gastronomia, a diversidade da sua arte e a Magia do Natal – das seculares tradições aos eventos contemporâneos, das luzes à música, dos presentes aos presépios, do repouso ao repasto…
Pode optar por desenhar o seu próprio roteiro ou deixar-se guiar pelos passos do C&H e aventurar-se num território singular, que dá outro sentido ao tempo dos relógios e ao tempo dos termómetros. Uma viagem sem tempo.
Cabeça, Aldeia Natal
O mundo pode ser uma aldeia e Cabeça pode bem ser um mundo. Esta aldeia, do concelho de Seia, fez questão de (re)escrever a sua história e tornar-se na aldeia mais natalícia do país. Contra tudo e contrariando um destino fadado ao esquecimento, fez-se presente num orçamento participativo e os votos dos seus habitantes deram vida à candidatura no concurso “Seia, Comunidade Participativa”.
A extraordinária aldeia montanhosa veste-se de Natal, nos últimos dias de outubro e a equipa, de aproximadamente 20/25 pessoas, responsável pela iniciativa trabalha todos os dias, com hora marcada, das 18h00 às 20h00, com folga ao domingo, para preparar enfeites, decorações, luzes e uma panóplia de outros adereços para a grande inauguração, no dia 18 de dezembro.
Os materiais usados nascem na natureza: reaproveitados e reinventados, hão-de tornar-se sinos, candeeiros, renas ou grinaldas e adornar cada rua, cada porta e cada janela, iluminando a genuinidade de uma gente pura, como o ar que nos enche os pulmões.
No adro da igreja, uma enorme árvore de natal a ser ultimada e o madeiro, presença obrigatória dos Natais na Serra, são circundados por mais de 20 presépios iluminados. Cada rua com um enfeite diferente, tal como a sua história – a alimentar o encanto dos visitantes e sussurrar-lhe o quão especial a simplicidade pode ser.
A 9ª edição de Cabeça – Aldeia Natal estende-se até ao dia 2 de janeiro e, nas palavras do “Mestre” José, um dos responsáveis pela iniciativa, “a aldeia deve ser visitada de dia, para se ver a beleza dos enfeites e de noite, para se ver o encanto da iluminação”.
O programa, para além da (óbvia) visita à aldeia, inclui tasquinhas, animação, workshops de cozinha e ateliers de decoração.
Cidade Natal da Guarda
A cidade da Guarda acolhe os visitantes com o seu frio tão característico. Mas o Frio é apenas um dos cinco “F” que a tornam singular: Farta, Formosa, Fiel e Forte cunham a cidade e a sua história.
A Praça Luís de Camões e as ruas circundantes amuralhadas estendem o tapete vermelho aos visitantes. A estátua, num alto pedestal em granito, de D. Sancho I, em frente à Sé da Guarda e a árvore de Natal, com cerca de 12 metros “aliam-se” imponentes e recordam a grandeza de uma cidade guardiã, corajosa e destemida.
Nesta época natalícia, a praça é invadida pela “Cidade Natal”: um comboio circunda pela cidade; o carrossel roda ao som da música que o embala; asas de anjos e aureolas servem de pano de fundo para uma selfie inesquecível; bailarinas, pinguins e bonecos de neve juntam-se às fotografias de grupo e, numa imagem, mil recordações que, um dia, hão-de acalentar a nostalgia e trazer de volta, o mesmo sorriso.
O Mercadinho de Natal, nas barraquinhas espalhadas pela praça, oferece o melhor da Serra da Estrela: das lãs aos queijos, dos azeites às compotas; do mel às castanhas; do vinho aos licores. Um presente ideal para um Natal especial.
Sem esquecer os mais de 80 pinheiros de Natal, no Jardim José de Lemos e no Jardim do Largo Frei Pedro, enfeitados por escolas e instituições, com materiais naturais, a lembrar que as festividades podem ser, ao mesmo tempo, simples e belas.
O Madeiro, ponto alto e ponto de encontro, no dia 24 de dezembro à tarde, reúne os guardenses e visitantes, à sua volta. Os copos erguem-se brindando à saúde e às festas e as chamas elevam-se iluminando a Sé, ao som dos sinos, da animação musical e das gargalhadas, que só a cidade Natal consegue despertar.
Aldeia Viçosa – O Magusto da Velha
“Era uma velha que vivia” na aldeia Viçosa, que nessa altura, era Lugar do Porco. Teria ela “um gato com olhos cor de ervilha”? Da cantiga popular à tradição secular, o mais genuíno Natal da Serra, vive-se, no dia 26 de dezembro, há mais de 400 anos, na aldeia Viçosa, concelho da Guarda.
“O Magusto da Velha”, tradição testamentada no Livro de Usos e Costumes, ano de 1698, cuja Junta de Freguesia pretende candidatar a Património Imaterial, reúne habitantes e visitantes no adro da igreja.
Reza a lenda que uma velha, com identidade ainda desconhecida, fez uma doação avultada à vila e deixou em testamento que todos os anos, no dia a seguir ao Natal, se oferecesse castanhas e vinho aos habitantes mais pobres e se rezasse por ela um pai-nosso. A Junta de Freguesia recebe, por conta desse testamento, uma renda perpétua de 15 cêntimos por ano.
No ano de 2020, devido à pandemia, ao invés de se atirarem, como é hábito, as castanhas a partir da torre da igreja, a Junta distribuiu porta a porta os 150 quilos de castanhas e vinho.
Espera-se que, este ano, a tradição possa voltar a cumprir-se em pleno e que, da torre da igreja, voem castanhas e rebuçados, para animar aldeões e foliões. A tradição completa-se com as chamadas “cavaladas”, que levam as pessoas a “encavalitar-se” em cima da pessoa que se debruçou para apanhar castanhas e de uma iniciativa, mais recente, “lagaradas”, com prova de azeite, como forma de projetar e promover este produto.
O “Magusto da Velha” conta ainda com a doação de vinho dos proprietários da Quinta do Ministro, uma exigência de velha que a falta de acordo – o que nunca aconteceu – resultaria num mau ano vinícola para a Quinta, dizem os mais antigos.
A tradição ganha ainda mais vida, com o Madeiro, a animação e a dramatização do evento, numa clara homenagem à velha da Aldeia Viçosa e, nas entrelinhas, aos beneméritos de todas as aldeias, cujos nomes, talvez esquecidos, não fazem olvidar as boas ações e os ecos destas até aos nossos dias.
Sabugal, Presépio de Natal
O Castelo das cinco quinas acolhe pela segunda vez o Presépio Natural e, pela primeira vez, a entrada para o Presépio é realizada pelo interior do Castelo, com uma linha temporal, que conduz o visitante até ao século I.
Uma área de 1100 m2, cerca de 500 toneladas de troncos de castanheiro morto, aproximadamente 200 figuras e uma equipa multidisciplinar da Câmara do Sabugal dão vida, cor e luz ao presépio.
O presépio conta, como é óbvio, com a recriação do nascimento de Jesus Cristo, mas também com reprodução de hábitos e cenas quotidianas da época, com casas, moinhos, fogueiras e figuras a completar cada cenário. A beleza deste imenso quadro, com o magnífico Castelo como cenário, multiplica-se com a iluminação dos adereços.
Um passeio pelo Presépio Natural é uma verdadeira viagem no tempo e um regresso à Natividade, onde o visitante se sente parte integrante das cenas apresentadas e se perde, entre campos, grutas e lugares até chegar à gruta que acolheu José e Maria, para voltar a encontrar-se, já próximo da saída, na linha do tempo que faltava 2019-2020. Atrás da porta, o ano de 2021 esgota-se.
O Presépio poderá ser visitado, todos os dias, até ao dia 7 de janeiro, das 9h00 às 20h00, com entrada gratuita.
Completam esta iniciativa, o Mercadinho de Natal, com a venda de produtos típicos da região, animação com grupos locais de teatro e música e ações de sensibilização. Para os que não puderem ir a Sabugal, é possível a compra dos produtos regionais online.
Nota ainda para a iniciativa “Estrelas de Natal brilham no Sabugal” com exposições pelas ruas da cidade, de peças decorativas natalícias, feitas por alunos, com recurso a materiais reciclados.
Por fim e, no final do ano, haverá espetáculo pirotécnico, coordenado entre as cinco vilas medievais: Alfaiates, Sabugal, Sortelha, Vila do Touro e Vilar Maior.
*O C&H viajou a convite da Comunidade Intermunicipal das Beiras e Serra da Estrela
Artigo originalmente publicado no site Canela & Hortelã
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