A loja e oficina ficam numa das ruas principais de Reguengos de Monsaraz.
Joaquim José produz e repara instrumentos para animais e quando da nossa visita estava a fazer chocalhos.
Uma tarefa exigente e demorada. Muito tempo sentado ao lado da bigorna. A bater com o martelo. Na parte final com uma tesoura enorme para arredondar o chocalho. Faz pequenas pausas para apreciar a evolução do trabalho e depois volta a repetir os gestos.
A matéria-prima é “chapa de ferro e o latão. A modulação da chapa é à porrada, como viu. Agora tenho de fazer o furo, o céu, por a asa e depois é que leva o latão. É metido em barro.
O barro tem de ser amassado com palha triturada que é para aguentar o calor e depois isto vai a 1.200, 1.300 graus no forno para derreter o latão dentro do barro, metalizar a chapa e dar o som. Antigamente era o carvão, hoje é forno a gás”.
Joaquim José pegou de seguida em alguns chocalhos e, segundo diz, consegue identificar os sons dos que produz. Afinar os chocalhos “é o segredo desta profissão. Nem toda a gente sabe fazer isso. A maior parte dos meus colegas não sabe fazer isso.”
O som é muito característico e há umas décadas atrás enchia os campos onde havia pastorícia. “Diziam antigamente que os animais comiam melhor quando andavam com o chocalho. A velha tradição é que os animais, com o chocalho, vão uns atrás dos outros e comem melhor, andam mais acertados na pastagem.”
A produção de chocalhos era uma atividade que percorria gerações da mesma família e o trabalho manual não parava. “Há 30, 40 anos atrás era de noite e dia e não se dava conta. Agora não. Fazem-se uns 40 ou 50 e ficam aí dois ou três dias.”
Joaquim José deixou de andar a vender nas feiras. “Eu faço chocalhos há quase 70 anos. Comecei com 10 ou 12 e já tenho 81. Aprendi com o meu avo e com o meu pai.”
O pai criou a fábrica dos chocalhos em 1950 e agora Joaquim José confronta-se com o problema de quem dê continuidade à atividade de chocalheiro porque os “filhos não querem isto. Não sei como vai ser. Terei de vender a qualquer pessoa que queira comprar. Ou vendam eles. Não sei como vai ser.”
O problema não é apenas de Joaquim José. Há meia dúzia de anos atrás, quando o chocalho entrou na lista da Unesco do Património Imaterial a precisar de salvaguarda, dos 13 fabricantes de chocalhos, mais de metade ultrapassavam os 70 anos.
Nem a relevância da Unesco alterou o crepúsculo da atividade de chocalheiro. Agora são menos. Joaquim José calcula que existam meia dúzia de chocalheiros e a distinção da Unesco “pouco adiantou. Os moirais estão a acabar. Põem os animais dentro das cercas, com um trator mudam as cercas, têm motores para tirar água para os animais beberem. Não é como antigamente que andavam um moiral com 60 ou 80 vacas. Agora são 500 ou 600.”
Joaquim José conforma-se com o cenário negativo da sua profissão, mas não deixa de martelar e receber quem o visita. “Sim, vem aí gente e levam umas coisas, correias... Tenho também coisas para reparar.”
Nas paredes estão muitas correias, também produz cintos. Numa pequena cabine tem fotografias suas. Recortes de jornais e distinções, mas o que mais chama a atenção é o brilho e a diversidade de chocalhos. Quem dá azo à curiosidade e agita o badalo de madeira enche o salão com um som único.
Chocalheiro Joaquim José - a arte de fazer chocalhos, "à porrada" faz parte do programa da Antena1 Vou Ali e Já Venho e a emissão deste episódio pode ouvir aqui.
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