Quando no ano de 2003 os espetadores portugueses perceberam que o novo filme de Sofia Coppola se ia chamar "O amor é um lugar estranho" - para a tradução de "Lost in Translation" - ficaram confusos. "Mais uma vez, que porcaria de tradução", diziam muitos! Ficaria assim tão mal "Perdidos na Tradução"?
Traduções à parte, dificilmente haverá, pelo menos até agora, um título melhor para aquele filme do que "O amor é um lugar estranho". Primeiro porque a frase, por si só, faz todo o sentido. O amor é um lugar estranho por ser um conjunto de sentimentos positivos e negativos. Há o carinho e há o ciúme, há a dedicação e há os sacrifícios, e por aí adiante. Mas não vamos desviar-nos do verdadeiro assunto: o Japão.
Esta introdução foi necessária para perceber o que é o Japão, segundo a nossa perspetiva claro. O Japão é mesmo um lugar estranho, por termos amado muito mas também por ter existido algo que, no momento, nos fez recuar na nossa opinião. Estamos a falar da gastronomia.
Não partimos para o Japão com o objetivo de encontrar o melhor sushi do mundo, até porque sabíamos que aquele que se faz na Europa é mais ao nosso gosto, o chamado sushi de fusão. Mas sempre nos disseram que no Japão se come maravilhosamente bem. Podemos dizer que foi a nossa pior experiência gastronómica de todas as viagens. De todos os restaurantes de sushi onde entrámos, gostámos apenas de um. E estivemos lá 10 dias!
Não pensem que vão ao Japão para encontrar restaurantes de sushi em cada esquina porque vão enganados. Pensávamos que lá o sushi era o equivalente ao bacalhau em Portugal, mas não. O sushi está mais para o preguinho. Preparem-se para encontrar muito porco frito, pele de galinha frita, coração de galinha frito, dumplings de consistência estranha e Okonomiyakis (uma panqueca frita com rebentos de soja, molho de barbecue, maionese e outras coisas estranhas no meio). Pelo meio ainda fazem umas omeletas em cima do arroz para o deixar bem empapado, de gordura. Ah, quanto a doces, esqueçam...bolos só de massa é para meninos, quanto mais nata e creme tiverem por cima mais delicioso é (ou não) e, na maioria das vezes, ainda conseguem juntar-lhes uma compota de feijão, no mínimo intragável.
Atenção que isto foi simplesmente a nossa experiência. Conhecemos pessoas que lá foram e adoraram a comida. Dizem até que é a Meca da gastronomia.
Mas o Japão é muito mais do que isto (e com uns bons hambúrgueres e bifes as coisas recompõem-se), conhecer o país do sol nascente é das experiências mais sensacionais que alguma vez vivemos. Já pensaram num país em que não têm de ficar preocupados com as bolsas e mochilas no metro? Onde se fazem filas indianas para entrar nos comboios de alta velocidade ou sermos atendidos em cafés? Onde não suportam ver um cliente insatisfeito? Onde as sanitas têm jactos de água com temperatura e intensidade reguláveis, brisas secantes e música ambiente? Além do mais, aliado a isto tudo, ainda somos brindados com comodidade, civismo e pontualidade de excelência.
Já que re ferimos, deixem-nos falar de civismo, que desde que fomos ao Japão essa palavra adquiriu o seu verdadeiro sentido. No Japão pedem-nos para colocar o nosso telemóvel em silêncio no metro ou para falarmos baixo, isto para não incomodarmos os outros passageiros. Imaginamos a surpresa de um japonês quando visita Portugal e se depara com a chincalharia das nossas carruagens... No Japão, as pessoas que trabalham para os serviços de transporte fazem todos os possíveis para que as nossas viagens sejam cómo das, com tudo impecavelmente explicado, mesmo que para eles seja muito difícil comunicar em inglês. Ou seja, é tudo aquilo que esperamos enquanto turistas num país onde a comunicação não é fácil.
E o que dizer das cores do Japão? Passear pelas ruas modernas japonesas é entrar numa máquina arcade de videojogos, com direito às luzes néon e ao sair já estarmos de repente num quadro pintado com uma palete de vermelhos, amarelos, roxos e laranjas, como acontece nas zonas mais tradicionais como, por exempl o, Quioto. Do nada, alguém acendeu um vela de incenso e somos transportados para a serenidade japonesa nos seus belos jardins. E do nada, reaparecem os letreiros neón e já estamos outra vez na máquina arcade de videojogos.
Viver o Japão é ainda mais, é ser apanhado em contra-corrente na passadeira mais movimentada do mundo, beber um café calmamente sentado numa mesa com vistas para o exterior enquanto vemos os japoneses agitados lá fora. É poder fazer parte da história da II Guerra Mundial (Hiroshima) e visitar castelos do Período Edo. É sentir o orgulho dos pais quando queremos tirar uma fotografia com os filhos que estão vestidos de Gueixas ou Taikomochi. É ser bem recebido pelos japoneses e ter vontade de lá voltar apenas porque nos deram muitos sorrisos.
E ainda dizem que a hospitalidade e o civismo não servem como cartões de visita para os turistas? Conhecer o Japão é conhecer tudo aquilo que não iremos visitar nunca mais, em nenhum outro lugar estranho.
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