O artivist "The Trash Traveler" continua a sua missão de caminhar pela totalidade da costa portuguesa, com o objetivo de promover o projeto "The Ocean Hike". Após percorrer os 1152 km da costa continental em 2020, Madeira e Porto Santo foram o capítulo seguinte, adicionando 280 km à caminhada de sensibilização.
Durante o percurso, mais de 500 pessoas juntaram-se às atividades comunitárias, chamando a atenção não só para a poluição visível, mas também para problemas ambientais menos observados, como a mineração em mar profundo.
Desde 2019, o biólogo molecular Andreas Noe, mais conhecido como “The Trash Traveler”, tem vindo a sensibilizar para a causa ambiental com recurso à diversão e criatividade. Em 2020, ao longo de 58 dias, “The Trash Traveler” percorreu os 1152 km que perfazem a totalidade da linha costeira de Portugal continental, para alertar para a quantidade excessiva de plástico de uso único e para a necessidade de se implementar uma economia circular em que se reutiliza e recarrega o que já existe.
Com o objetivo de levar a sua missão além do continente, o biólogo continuou a sua caminhada de sensibilização no arquipélago da Madeira, entre maio e junho de 2024.
Ao longo de 17 dias na Madeira e 4 em Porto Santo, “The Trash Traveler” percorreu a pé cerca de 280 km (totalizando 18 mil metros de elevação), encontrando-se com mais de 500 pessoas da sociedade civil, ONGs, escolas, cientistas e outras instituições. Em conjunto, recolheram 950 kg de “lixo” e plástico, de modo a sensibilizar para problemas marinhos.
Todas as praias arenosas da Madeira e Porto Santo por onde o “The Ocean Hike” passou continham macro e microplásticos. Por ser uma região rochosa, é ainda mais difícil encontrar estas pequenas partículas nas praias do arquipélago, visto poderem estar escondidas entre as pedras. Tal acentua a importância de ajustar a legislação e regulação do uso de plásticos.
Problemas ambientais debatidos durante o projeto “The Ocean Hike”
Na terra:
Durante o “The Ocean Hike”, foram recolhidas cerca de 40 mil beatas de cigarros. As beatas de cigarros são feitas de plástico e podem ter mais de 7000 químicos tóxicos na sua composição, incluíndo carcinogéneos humanos (para mais informações, ver o projeto informativo criado pela OceanCare e The Trash Traveler). Para além disso, alguns trilhos estavam repletos de papel higiénico e toalhitas – itens que contêm plástico e que, por isso, não são biodegradáveis.
De forma a combater este grave problema, “The Trash Traveler” acredita que é necessário investir em mais campanhas de sensibilização, sinalização e leis de responsabilidade alargada do produtor. Para tal, o projeto “The Ocean Hike” apoiou a petição da OceanCare, dedicada a reajustar as leis orientadas para os plásticos de uso único desnecessários.
No mar:
A poluição dos oceanos através dos plásticos refere-se à acumulação de partículas deste material nos mares, representando ameaças significativas à vida marinha, humana e aos ecossistemas. Cerca de 80% dos plásticos presentes no oceano originam de atividades terrestres, como processos industriais, má gestão de resíduos e atos individuais como deitar lixo ao chão. Os outros 20% advêm de atividades marítimas, nomeadamente dos materiais de pesca, destroços de navios e plataformas offshore.
As correntes oceânicas desempenham um papel fundamental no transporte destas partículas pelo mundo, chegando mesmo a afetar áreas remotas. O arquipélago da Madeira, localizado no Norte do Oceano Atlântico, encontra-se estrategicamente posicionado em relação a várias importantes correntes oceânicas, o que contribui para a acumulação e distribuição de detritos de plástico provenientes de várias regiões.
Existem duas categorias de plásticos:
Macroplásticos: Itens de maior dimensão, como garrafas e sacos.
Os trabalhos de limpeza realizados nas praias da Madeira revelaram objetos usados e produzidos em Espanha, Canadá e Estados Unidos da América. Tais descobertas ilustram o enorme alcance das correntes oceânicos no que concerne ao transporte de desperdício de plástico proveniente de países distantes e que chegam a regiões remotas, como a Madeira.
Microplásticos: Partículas com menos de 5mm, frequentemente originárias de plásticos de maior dimensão ou de pellets de plástico. Também podem ser divididos em duas categorias:
- Os microplásticos primários, como as pellets de plástico (ou nurdles), são pedaços de plástico pequenos, do tamanho de uma lentilha, que se encontram na composição da maioria dos produtos de plásticos.
- Os microplásticos secundários originam da decomposição e fragmentação de produtos de plástico de maior dimensão.
Moratória à mineração em mar profundo
Um dos principais objetivos do “The Ocean Hike” passava por apoiar as ONGs nacionais e locais que estão neste momento a trabalhar para uma moratória à mineração em mar profundo. O governo regional da Madeira tem a oportunidade de ser um exemplo para a comunidade internacional ao tomar uma posição pela proteção das suas águas, aprovando tal medida.
O Parlamento português passou, em 2023, uma resolução de pedido de uma moratória. No entanto, dada a mudança de governo, o processo foi interrompido e precisa de ser reforçado. Visto as ilhas serem as comunidades mais afetadas por decisões relacionadas com o mar, e tendo em conta que os Açores já tomaram uma posição a favor da moratória, um possível posicionamento favorável do arquipélago da Madeira poderia ter um grande impacto.
Durante o projeto, foram recolhidas assinaturas para uma petição pela moratória à mineração em mar profundo.
O que é a mineração em mar profundo?
À medida que as economias mundiais procuram reduzir as suas emissões de carbono, têm vindo a procurar novas formas de produzir energia “limpa”, o que resulta num aumento da necessidade de minerais e interesse nos recursos possivelmente encontrados no fundo do mar. As consequências de uma mineração em mar profundo não são ainda conhecidas, mas evidência científica atual demonstra que o risco não é necessário, desejável ou sequer benéfico para a nossa sociedade. Em vez disso, há que minimizar a procura de tais minerais, através de uma combinação de novas tecnologias, processos de reciclagem e abordagens baseadas na economia circular.
Caminhada do "The Trash Traveler" vai continuar
Com o intuito de completar toda a costa portuguesa, o biólogo continuará este projeto em 2025, para cobrir o arquipélago dos Açores e algumas ilhas protegidas, acompanhando expedições científicas. Na Madeira, será ainda desenvolvido um novo projeto para fortalecer o impacto e ligações estabelecidas durante os últimos meses.
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