Desconhecido para muitos, o alforge, que deriva do árabe ‘al-khurj’, era um acessório indispensável para as populações do interior, sobretudo no Algarve e no Alentejo, usado, pelo menos, desde a época islâmica, pelo homem ou no dorso dos animais de carga, explicou à Lusa a vice-presidente do município.
“É nossa intenção preservar, investigar e trazer aos nossos dias o que era a tradição, mas também incentivar as gerações atuais a recriar e reaproveitar o que eram os conhecimentos dos seus antepassados”, adiantou Filomena Sintra.
Numa tentativa de incentivar as novas gerações a reutilizar este utensílio, o projeto promovido pela autarquia em parceria com a Associação Amendoeiras em Flor visa criar objetos “baseados nas suas tradições, mas com novos usos”.
Como exemplos, Filomena Sintra apontou vários usos possíveis para o alforge, nos tempos atuais, que podem ir desde “a mala, para arrumar os comandos [de televisão] ou colocar no topo da cama para os brinquedos dos miúdos”.
Nesse sentido, foi criada uma exposição, entretanto cancelada devido ao surto de Covid-19, mas que deverá reabrir até ao final de junho, e ‘workshops’ para ensinar a fazer alforges, cuja realização está também suspensa por tempo indeterminado.
O alforge é uma espécie de bolsa grande feita de lã, linho ou trapos, com os extremos dobrados e unidos de modo a que formem duas algibeiras para o transporte de produtos, que conheceu diferentes usos, formas e decorações.
O utensílio tanto podia ser utilizado “no dorso dos animais de carga”, para transporte a longas distâncias, “como pelo homem, para o transporte de pertences” ou mercadorias compradas nas feiras ou mercados.
Os alforges de trabalho não possuíam decoração, para além do padrão e das cores do próprio tecido, com alguns a receberem barras nos extremos com sobras de outros materiais confecionados ao gosto da artesã ou do proprietário.
Porém, as peças destinadas a usos em épocas festivas, eram ‘lavradas’ por bordadeiras, com motivos decorativos diversos e que variavam com o gosto e a habilidade da artesã.
Há mais de 20 anos que a Associação Amendoeiras em Flor “recolhe objetos em casas de pessoas idosas que retratem costumes e tradições”, possuindo já uma larga coleção de alforges “do Algarve e Alentejo”, revelou à Lusa a sua vice presidente.
Segundo Zelinda Romeira, a intenção da associação é “não só preservar a história” do alforge, mas fazer com que volte a ser “utilizado e reinventado”.
“Queremos fazê-los com quem ainda domina a arte, para que não se perca e possa ser reinventada e redesenhada sem lhe retirar a sua base, adaptando-a aos dias de hoje”, afirmou.
No final do século XIX, início do sec XX, Castro Marim – que chegou a ter mais de uma centena de teares ativos – era, juntamente com Monchique e Alcoutim, um dos centros de tecelagem no Algarve, revelou à Lusa Liliana Bonança, proprietária da empresa Tecelã.
Dedicada a recuperar esta arte ancestral no concelho, contou que era uma atividade “muito doméstica” que começava “no cultivo e tratamento do linho”, sendo depois processados os materiais, até se chegar ao produto final, que podia ser “uma manta ou um alforge”.
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