Além dos adufes que comprámos nas festas do Almurtão e da Póvoa, adquirimos ainda, em Monsanto, duas “palhetas”, essas dulçainas beiroas que já só ali se encontram; elas são da autoria de um pastor, José dos Reis, que pudemos ainda fotografar a tocar o seu instrumento, nas festas da Póvoa.
A descrição é de Ernesto Veiga de Oliveira, em "Instrumentos Musicais Populares Portugueses".
É em Monsanto, no concelho de Idanha-a-Nova, que há o último registo da palheta tradicional de 5 furos. João Abrantes, investigador e maestro da Filarmónica Idanhense, refere que “a palheta é parecida com uma flauta, um pífaro. Tem uma palheta dupla e 5 furos. É muito parecida com a dulçaina”, utilizada em algumas regiões espanholas. Ainda segundo João Abrantes, a palheta “ é simples, não tem chaves, tem 5 buracos e era utilizada essencialmente nas festas e romarias desta zona. A última que conhecemos foi a de José dos Reis. Temos registos fotográficos e sonoros de José dos Reis a tocar a palheta.”
José dos Reis era pastor e com a sua palheta deu notoriedade ao instrumento musical e até chegou a gravar para a BBC em meados do século passado.
Também há cerca de 60 anos, numa recolha ("Instrumentos Musicais Populares Portugueses"), Ernesto Veiga de Oliveira fotografou José dos Reis a tocar e comprou duas palhetas, uma das quais estará no Museu Nacional de Etnologia.
José dos Reis descobriu a palheta na festa da Senhora da Póvoa, uma das maiores romarias da Beira Baixa. Faleceu em 1986 e, de certa forma, com a sua morte também ficou extinta a palheta.
Há agora dois projetos de recuperação no concelho de Idanha-a-Nova. Nas palavras de João Abrantes são iniciativas complementares. Uma delas é a construção na Oficina da Música Tradicional.
“Procuramos a salvaguarda do instrumento como nós o conhecemos, como José dos Reis o construía. Com outros métodos, aperfeiçoando a sua afinação e pequenos pormenores que poderão ser fundamentais para a sobrevivência do instrumento".
Há um outro projeto de salvaguarda da palheta que está a ser conduzido pelo Filipe Faria da Arte das Musas, a entidade promotora do festival Fora do Lugar que acontece todos os anos em Idanha a Nova.
Está a recriar a palheta para performance. Neste caso a palheta é um pouco maior, mais evoluída, com outra sonoridade e com mais furos. Isso poderá ser muito importante para a preservação do instrumento.
A Oficina da Música Tradicional é uma das várias iniciativas da Filarmónica Idanhense e desenvolve vários projetos de recuperação e preservação de instrumentos musicais. Um que está a ter grande sucesso é a viola beiroa.
A construção da palheta foi o projeto pioneiro, o objetivo é “construir e ensinar a construir. Temos um manual que explica passo a passo a construção.”
O passo seguinte é dar uso à palheta como instrumento musical. A de 5 furos tem as suas limitações. “Não é um instrumento de ouvido fácil. A viola beiroa, por exemplo, pode estar uma hora a tocar, a acompanhar uma música. A palheta é um instrumento de aparições pontuais.”
Apesar desta particularidade, já há executantes. “Estamos a trabalhar com três músicos e já chegamos a um ponto interessante. A palheta já foi incluída em espetáculos musicais da Filarmónica com um desses instrumentistas. Trabalhamos uma música tradicional que pudesse conjugar a palheta com a voz e com a banda de música. Há que continuar, em particular a definir músicas e a escrever para a palheta.”
Veja também um documentário sobre a construção da palheta de 8 furos: Do ramo de uma árvore.
Voltar a ouvir a Palheta faz parte do programa da Antena1 Vou Ali e Já Venho e a emissão deste episódio pode ouvir aqui.
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