Um passeio por Beja no seu único tuk tuk

O Miguel leva-nos a conhecer os principais motivos de interesse do centro histórico da cidade alentejana.
Um passeio por Beja no seu único tuk tuk
Miguel Frazão

A aproximação às terras do chamado Baixo-Alentejo define-se pela alteração das cores dos campos que as rodeiam, onde o habitual esverdeado contrasta com algumas áreas em tons de castanho. Entro em Beja, com os campos de um lado e um bairro que ali se formou mais recentemente do outro. É uma das regiões alentejanas mais férteis, não fosse o acastanhado dos terrenos símbolo dos famosos barros negros, conhecidos pela sua fertilidade.

A zona histórica de Beja esconde-se entre um conjunto de construções contemporâneas que hoje acolhem aqueles que ao longo dos anos foram repovoando a cidade.

Por lá passaram gentes da Idade do Ferro, romanos, visigodos, muçulmanos, judeus e cristãos. A riqueza dos solos e a proximidade ao Guadiana fizeram de Beja uma cidade povoada desde muito cedo.

Beja
créditos: Miguel Frazão

Quando o autocarro parou na Estação Rodoviária tinha apenas na memória algumas fotografias que vira de Beja na véspera da viagem. Uma vez que a cidade é relativamente pequena aventurei-me a percorrê-la na expectativa de confrontar as tais fotografias com a realidade. Ao sair da Rodoviária, depois da rotunda, é sempre a subir.

Portas de Mértola

As Portas de Mértola são, e passo a redundância, uma das portas de entrada na cidade histórica de Beja. Atualmente veem-se apenas os torreões, estando em falta o arco que os unia, passando por cima da estrada em calçada.

Beja
Prestes a passar as Portas de Mértola, em Beja créditos: Miguel Frazão

Trata-se de uma herança dos romanos. Mas há mais. Junto ao Castelo, em zonas diferentes, existem ainda as Portas de Évora e de Avis, cuja construção permanece intacta. Já das Portas de Aljustrel não são conhecidos vestígios.

Praça Capitão João Francisco de Sousa

Enquanto percorro a Rua de Mértola, ainda antes de chegar às portas, decido virar à esquerda e explorar a zona comercial, que se ergue na Praça Capitão João Francisco de Sousa.

É domingo e, ao contrário dos restantes dias da semana, a praça tem muito pouco movimento.

Rua de Mértola, em Beja
A Rua de Mértola, onde fica a principal zona comercial de Beja créditos: Miguel Frazão

Continuo agora rumo ao castelo, seguindo as setas que vou encontrando na estrada, mas, pelo caminho, deparo-me com a Praça da República.

Praça da República

Mais uma vez, a ausência de movimento naquela que se assume como a praça principal de Beja surpreende-me. No tempo dos romanos fora o Fórum da cidade, tornando-se novamente numa zona central após a Idade Média e o período Islâmico.

Encontro apenas um grupo que se distribui por várias cadeiras, formando um círculo, junto ao pelourinho. O pelourinho que podemos apreciar numa das pontas da praça está ali desde o século XIX, tratando-se de uma réplica. A versão original do monumento encontra-se no interior do castelo, apesar de não estar intacta.

Do outro lado da praça, junto ao edifício da Câmara Municipal, observo a Igreja da Misericórdia, testemunho do renascimento italiano em Portugal.

Sento-me algures num banco e olho à minha volta. Os edifícios têm todos a mesma altura. Trata-se de uma regra. Todas as casas construídas ali tinham de ter dois pisos.

Mouraria e Judiaria

A manhã está a chegar ao fim e depois de ter já confrontado algumas das imagens que vi de Beja com a realidade, preparo-me para conhecer o resto da cidade de uma outra forma. Enquanto sigo até ao castelo, onde tenho encontro marcado com o Paulo Alves, atravesso as Portas de Moura e a Rua da Muralha, que pertencem à Mouraria.

Tuk Tuk em Beja
O único Tuk Tuk que existe em Beja créditos: Miguel Frazão

Para chegar ao castelo percorro a Rua da Guia, que, por sua vez, está integrada na Judiaria.

A existência de bairros como a Mouraria e a Judiaria são exemplos de que em Beja conviveram islâmicos, judeus e cristãos.

Não viveram num constante clima de paz, até porque Beja esteve tanto sob o domínio dos mouros, como dos cristãos, mas a verdade é que ambas as religiões coexistiram no mesmo espaço durante um longo período de tempo.

Castelo e torre de menagem

Já no interior do castelo encontro-me com o Paulo, da Tuk Forever, com quem vou dar um passeio no único tuk tuk que existe em Beja.

Primeiro, subimos juntos os mais de 200 degraus que nos permitem chegar ao topo da torre de menagem, uma construção do estilo gótico e a mais alta torre de menagem da Península Ibérica.

Castelo de Beja
A Torre de menagem do Castelo de Beja tem 40 metros de altura créditos: Miguel Frazão

Enquanto tentamos alcançar os 40 metros de altura da torre, deparámo-nos com as pedras que dão forma ao monumento, assim como às inscrições que lá se encontram. A essas inscrições damos-lhe o nome de marcas de canteiro. Eram uma forma de os canteiros (construtores) saberem que pedras tinham colocado na construção para serem pagos pelo seu trabalho.

Depois de visitar a Torre de Menagem caminhámos pelas muralhas do castelo, construídas logo após a reconquista cristã, no tempo de D. Sancho I, em meados do século XIII.

Castelo de Beja
As inscrições nas pedras da torre de menagem do Castelo de Beja créditos: Miguel Frazão
Beja
A vista a partir do topo da torre créditos: Miguel Frazão

Núcleo Visigótico do Museu Regional de Beja

Mesmo ao lado do castelo e ainda antes de partirmos à aventura no tuk tuk entrámos no Núcleo Visigótico do Museu Regional de Beja, onde, tal como o nome indica, podemos encontrar vestígios da presença dos visigodos na cidade.

Note-se que apesar de o museu estar situado ao lado do castelo, ele encontra-se fora das suas muralhas, até porque a exposição que podemos visitar foi acolhida pela antiga Igreja de Santo Amaro, construída pela comunidade cristã no período islâmico.

Na altura, os cristãos podiam apenas exercer o seu culto em igrejas fora das muralhas da cidade. Assim, a Igreja de Santo Amaro é mais uma prova de que cristãos e árabes conseguiam conviver no mesmo espaço.  Agora sim, estou pronto para entrar na viatura do Paulo. Com o cinto de segurança bem apertado, já que a calçada que define o traçado das estradas promete alguns saltos, começamos a percorrer as ruas de Beja.

Museu Rainha D. Leonor

O Museu Rainha D. Leonor foi um dos nossos pontos de paragem no passeio de tuk tuk. O museu está atualmente em obras, pelo que não se pode visitá-lo, mas não se perde nada em reservar algum tempo para admirar a porta Manuelina do antigo Convento Nossa Senhora da Conceição.

Foi lá que viveu Mariana Alcoforado, a autora das famosas cartas enviadas a Noel Bouton (deram origem a um livro chamado Cartas Portuguesas da Soror Mariana Alcoforado), um elemento das tropas envolvidas na Guerra da Restauração, por quem a portuguesa se apaixonou depois de o ver através da janela do convento.

O Convento Nossa Senhora da Conceição era destinado às mulheres, enquanto o Convento de São Francisco, hoje transformado em Pousada, recebia apenas homens.

Núcleo Museológico Rua do Sembrano

Perto do Museu Rainha D. Leonor e do Teatro Municipal Pax Júlia encontra-se o Núcleo Museológico da Rua do Sembrano. Arrisco-me a dizer que foi o museu que mais me conquistou em Beja. Ao contrário do que é habitual nos museus, em que aquilo que pretendemos ver se encontra ao nosso lado ou à frente, aqui a exposição está debaixo dos nossos pés. Com o chão em vidro, podemos observar ruínas romanas e outras mais antigas que vêm demonstrar que Beja está habitada desde o início do século IV a.c, bem antes da ocupação romana, que nos remete para o século II a.c.

Núcleo Museológico Rua do Sembrano
Núcleo Museológico Rua do Sembrano créditos: Miguel Frazão

Jardim Gago Coutinho e Sacadura Cabral

De volta à viatura, o Paulo guia-me agora pela restante cidade. À minha direita surge o Jardim Gago Coutinho e Sacadura Cabral, no qual ainda tive oportunidade de entrar. Junto ao lago, uma criança brinca com os patos.

Nos bancos à volta do coreto, há quem se sente a ouvir o relato do jogo de futebol transmitido através dos altifalantes ali existentes.

Ao Jardim Público segue-se a passagem pela biblioteca, pelo Parque de Feiras e Exposições, assim como pelo Parque da Cidade.

Beja está vista, mas há que regressar porque relativamente perto está a Vila Romana de Pisões e a agora famosa Praia Fluvial Cinco Reis. Para isso precisarei de uma boleia ou uma bicicleta. Como me disse o Paulo, são dez quilómetros de uma estrada “desafiante”.

A visita guiada à cidade foi-me oferecida pelo Paulo Alves, da Tuk Forever. As reservas dos passeios podem ser feitas no Posto de Turismo de Beja.

O Miguel estuda jornalismo, pratica esgrima e nos tempos livres escreve sobre as viagens que faz no seu blog, Ponto de Fuga, onde uma versão deste artigo foi originalmente publicada.

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