Assim que o autocarro entrou pelas ruas empedradas de Montemor-o-Novo olhei pela janela e tentei fixar o que me aparecia à frente, como se minutos depois me fossem perguntar tudo aquilo que vira, numa espécie de jogo da memória. Passei por alguns cafés e restaurantes, vi as antigas piscinas municipais e o cemitério. Gosto de viajar para cidades pequenas para que possa ir encontrando as principais atrações sem ajuda externa, correndo o risco de me deparar com elas mais do que uma vez.

Em Montemor, fui convidado pelo Hugo, o anfitrião do Monte de Santa Margarida, para participar no Paddy Paper que nos ia levar a conhecer a cidade. Naquela tarde de sábado, as perguntas que normalmente faço ao Google foram-me respondidas pelo Hugo. Não saímos vencedores da competição, mas a história de Montemor-o-Novo dificilmente me sairá da cabeça.

Mercado Municipal

O meu passeio começou no mercado, ainda que apenas tenha tido oportunidade de ver o exterior, já que ao sábado encerra às 13h.

É lá que se compra a carne, o azeite e os cereais regionais, até porque a economia de Montemor-o-Novo é maioritariamente rural. Não são precisas placas informativas a dizê-lo. Os painéis de azulejos que decoram o exterior do edifício falam por si. Podemos ver representações de profissões, como as ceifeiras e os guardadores de rebanhos, assim como cenas da vida rural, que vão desde a tiragem de cortiça à apanha da azeitona.

O passeio em direção ao Castelo prossegue com a curiosidade a amenizar o calor que se fazia sentir àquela hora.

Rua Teófilo Braga

Foram raras as pessoas com que me cruzei nas ruas de Montemor. O centro histórico estava quase deserto. Percorri a Rua Teófilo Braga num silêncio que me levou a imaginar como seria a antiga Rua Direita na Idade Média, já que na época esta era uma das mais movimentadas da cidade. É aqui que podemos encontrar também uma das Santa Casa da Misericórdia mais antigas de Portugal.

Rua do Quebra Costas

A Rua do Quebra Costas ganhou o meu respeito assim que me falaram dela pela primeira vez.

Para se chegar ao Castelo não há como evitar esta rua. Na verdade, há. Mas quem vai a Montemor não terá uma experiência completa se fugir à subida que começa numa rampa, cuja inclinação vai aumentando ligeiramente à medida que se avança, e termina numa sequência de 87 degraus. Enquanto a percorremos existe uma imunidade ao cansaço, que se esvai assim que alcançamos o topo das escadas e finalmente nos aproximamos do castelo.

Rua do Quebra Costas
Rua do Quebra Costas, em Montemor-o-Novo créditos: Miguel Frazão

Castelo e muralhas de Montemor-o-Novo

O castelo de Montemor-o-Novo remete-nos para os tempos de guerra entre cristãos e muçulmanos. Depois de as tropas de D. Sancho I conquistarem o castelo aos Mouros, iniciou-se o processo de construção das muralhas. O objetivo era fixar e proteger a população.

Quem atravessa a A6 ou a N2 poderá vir a deparar-se, ao longe, com uma das maiores muralhas do país. No século XIV tinham cerca de 1600 metros de extensão. A sua construção demorou mais de 150 anos. Aqueles que se aventurarem a subir a Rua do Quebra Costas terão a oportunidade de andar nas muralhas e apreciar a vista panorâmica para a cidade.

Porta da Vila e Torre do Relógio

Entrei no castelo pela Porta da Vila. O som dos pássaros intensifica-se. Os espaços livres que se formaram com a deterioração do castelo servem agora de abrigo às aves, protegendo-as das condições meteorológicas adversas. Junto à Porta da Vila ergue-se a Torre do Relógio, na qual se inseriu também a Casa do Guarda.

Porta e Torre da Má Hora

O terramoto de 1755 contribuiu para a destruição de grande parte das muralhas. É por isso que dá para caminhar apenas sob alguns troços. Consigo subir as escadas de acesso à Torre da Má Hora.

Por baixo temos a Porta da Má Hora. Reza a lenda que o nome desta porta foi dado pelos muçulmanos por se terem esquecido de a fechar numa das noites, permitindo a entrada dos cristãos, que acabaram por conquistar o castelo.

A minha caminhada leva-me ainda até à Porta e Torre do Anjo, assim como ao local onde se situava a já inexistente Porta de Évora.

 Torre da Má Hora
Torre da Má Hora, em Montemor-o-Novo créditos: Miguel Frazão

Paço dos Alcaides

Apesar de estar praticamente em ruínas, o Paço dos Alcaides é uma das zonas do castelo de visita obrigatória.

Foi aqui que, em 1288, D. Dinis pediu autorização ao Papa para a fundação dos Estudos Gerais em Portugal, dando origem à Universidade de Coimbra. Neste edifício onde se alojavam os monarcas que vinham a Montemor também se ultimaram os planos da Viagem Marítima à Índia, assinada por Vasco da Gama.

Paço dos Alcaides
Paço dos Alcaides, em Montemor-o-Novo créditos: Miguel Frazão

Saio do castelo por onde entrei. Pela Porta da Vila. Observo agora a cidade que no século XV se deslocou do interior das muralhas para junto das vias que ligam Montemor a Lisboa, Évora e Beja.

Ainda longe, num outro monte, encontra-se a Ermida Nossa Senhora da Visitação, onde se celebra a missa no primeiro domingo de cada mês.

Para lá chegar, há que descer a Rua do Quebra Costas e atravessar a cidade rodeada de casas, em cuja construção se aproveitaram pedras que outrora pertenceram às muralhas do castelo. Num dos dias fui de carro. No outro fui a pé, entre as sombras e os silêncios que mais tarde me levaram ao autocarro sem que apanhasse uma insolação.

Onde dormir em Montemor-o-Novo?

Monte de Santa Margarida
Monte de Santa Margarida créditos: Miguel Frazão

O Monte de Santa Margarida fica a 2km do centro histórico de Montemor-o-Novo e foi o alojamento local que me recebeu para que pudesse elaborar o roteiro da cidade. Estão disponíveis dois apartamentos, um com capacidade para 10 pessoas e outro para 6 pessoas. O espaço tem piscina disponível e trata-se de uma quinta com cerca de 5 hectares, onde podemos encontrar cães, ovelhas, cabras e pavões.

O Miguel estuda jornalismo, pratica esgrima e nos tempos livres escreve sobre as viagens que faz no seu blog, Ponto de Fuga, onde uma versão deste texto foi originalmente publicado.