As sucessivas vagas de “peste” na Europa geravam um permanente pavor do povo e o temor da Coroa. D. João II e D. Manuel I já tinham ouvido falar dos feitos milagrosos de São Roque. O santo foi infetado e curou-se “milagrosamente”. D. Manuel I solicitou uma relíquia para proteger Lisboa.
Os restos mortais estavam em Veneza – hoje encontram-se na igreja de São Roque de Veneza. O Doge satisfez o pedido de D. Manuel I e a relíquia foi colocada numa ermida no Bairro Alto.
No atual largo da Misericórdia existiria um cemitério dos mortos da peste. O lugar ficava fora das muralhas e era pouco povoado. Foi o povo que construiu a ermida, em 1506, e rapidamente se assumiu como lugar de peregrinação e culto. O santo passou a ter grande aceitação e foi até criada a Irmandade de São Roque.
Do tempo da ermida há vestigios de azulejos que foram encontrados quando de obras de conservação, há cerca de três décadas, e que estão no Museu de S. Roque. Faz também parte do acervo decorações do retábulo-mor da ermida, as "Tábuas da Vida de S. Roque", cenas da vida de S. Roque, que são atribuidas a um pintor português conforme foi referido no catálogo de uma exposição que esteve patente ao público.
Cerca de meio século depois da construção da ermida, D. João III entregou o lugar aos jesuítas, que edificaram aí a sua sede. A igreja de São Roque, ao longo do tempo, tornou-se uma das mais imponentes e luxuosas em Portugal. O maior exemplo dessa ostentação da riqueza - artística e material - é a Capela de São João Batista, mandada fazer em Itália por D. João V.
No interior da Igreja, a Irmandade de São Roque conseguiu impor a reserva de uma capela dedicada ao santo. Como é hábito em outras representações, São Roque aparece com uma parte da perna visível, a mostrar uma chaga. A imagem é de madeira, do século XVII. São Roque tem ao lado São Sebastião e São Tiago.
As estátuas estão envolvidas por talha dourada e o conjunto é um dos exemplos de arte barroca que domina nas oito capelas da igreja. Nas partes laterais da capela estão representadas cenas da vida do santo. Num dos lados, numa pintura, está representada a Aparição do Anjo a São Roque. Na outra parede as cenas da vida do santo são reveladas através de azulejos.
Gonçalo Amaro, investigador e membro da Direção de Cultura da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, sublinha que, antes da construção da ermida, a devoção a S. Roque em Portugal não era muito grande e que São Sebastião era um dos santos preferidos pelo povo quando de surtos de peste. "Sacrificado com várias setas, o seu corpo estava com chagas, um dos sinais da peste. No caso de S. Roque o seu culto foi consolidado em Portugal e a sua vida também está relacionada com a peste. Foi um santo que ajudou a curar pessoas infetadas, ele próprio chegou a ser atingido por uma peste e curou-se”.
Se nos primórdios do templo havia a intenção de solicitar a proteção divina, nos séculos seguintes, a igreja de São Roque era uma das preferidas dos nobres e até do rei que decidiu implementar uma das mais excecionais obras de arte italiana em Portugal.
D. João V fez a encomenda da capela de São João Baptista a dois reputados arquitetos italianos, quis que a obra fosse vista em Roma, na igreja de Santo António dos Portugueses e até foi benzida pelo Papa. Depois veio, peça a peça, para Portugal e foi totalmente montada em 1751, um ano depois da morte de D. João V.
É este conjunto magnifico que podemos ver, quando a Igreja e o Museu de São Roque reabrirem as portas. É a última do lado esquerdo da nave da igreja. É deslumbrante, pela sua beleza, pelos materiais, o detalhe, pelo conjunto onde domina o dourado e o azul.
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