Oliveira do Mouchão, Mouriscas
Abrantes
Uma árvore de séculos sabe muito sobre o tempo. Nós, enraizados nas humildes décadas que possuímos, apenas supomos ensinamentos desse tamanho. Os séculos da árvore são como um enorme edifício à nossa frente. Temos de dobrar o pescoço pela nuca para olhar até lá acima.
Essa é a maneira de tentarmos imaginar a vista a partir do seu topo. Uma árvore de séculos já foi muitas árvores. A sua casca renovou-se vezes e vezes. Foi atravessada por seiva suficiente para encher um rio. Para nós, que somos breves, parece-nos que essa seiva demora a correr. Para a árvore, as estações sucedem-se como dias. O verão chega com a memória viva do verão anterior. Precisaríamos de muito mais idade para reconhecer os ciclos de tempo que a árvore considera como estações.
Existem as folhas que vemos, são nossas contemporâneas. Cintilam verde e prata, simulam uma chuva de brilho. Como nós, também estas folhas estão convencidas de que este momento é para sempre. E não se enganam, este momento é para sempre. No entanto, depois deste, virá outro para sempre, e outro, e outro.
Uma árvore de séculos olha para os nossos rostos da maneira como seguramos uma folha entre os dedos. Sente o nosso olhar, sabe que estamos aqui, mas também sabe que a terra à sua volta engoliu milhões de folhas como nós.
Excerto de "Onde", de José Luís Peixoto, editado pela Queztal Editores.
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