A figura do capitão Salgueiro Maia, cuja serenidade permanece ligada ao derrube pacífico da ditadura em Portugal, paira alto sobre Castelo de Vide. No interior do castelo medieval, com vista para toda a vila alentejana, há um espaço dedicado à sua vida e memória.
Inaugurada em 2021, a Casa da Cidadania Salgueiro Maia é a concretização da vontade do capitão, expressa em testamento, de que o seu espólio fosse apresentado ao público na terra onde nasceu, e viria a ser sepultado.
De fora, a Casa tem a mesma discrição e contenção tanto associadas ao homem que lhe dá o nome. Sem grande alarido sinalético, ou elementos vistosos de arquitetura, o museu faz uso inteligente do pequeno espaço à sua disposição para desdobrar o extraordinário percurso de vida de Salgueiro Maia, de capitão do exército a um dos mais conhecidos e respeitados rostos do século XX português.
Como se explica a aptidão para a liderança? Ou a aparente calma sob pressão? Para compreender o seu "encontro com a História", como é resumida a atuação de Salgueiro Maia em 25 de abril de 1974, é preciso conhecer o homem, antes e depois desse dia, incluindo a sua formação e personalidade.
A perda da mãe num acidente em Lisboa, a adolescência como filho de um ferroviário, o rápido respeito conquistado entre os seus pares e, crucialmente, a sua experiência direta na Guerra Colonial, são alguns dos principais acontecimentos da sua vida apresentados que ajudam a "explicar" quem foi Fernando Salgueiro Maia e a que devemos a sua intervenção decisiva na restauração da democracia em Portugal.
As fotografias e os depoimentos da época certificam a moderação e o pragmatismo com que comandou, na madrugada daquela quinta-feira de abril, uma coluna militar desde Santarém, com a missão de depor o governo em funções no coração da capital. O seu temperamento fica patente logo à entrada da cidade, no tenso impasse perante as forças leais ao regime no Terreiro do Paço e, mais tarde, durante a prolongada negociação para a rendição de Marcello Caetano, iniciada por megafone, no Largo do Carmo.
Entre os objetos mais reconhecíveis do seu espólio, encontramos esse icónico megafone, usado para intimar a figura máxima do Estado Novo a entregar-se, perante o olhar de uma multidão expectante. O uniforme militar que vestia nesse dia, assim como outros pertences obtidos ao longo da sua carreira militar, completam o retrato da sua vida a seguir à Revolução, pontuada por louvores, mas afastada, por opção própria, dos holofotes da política.
A sua morte prematura aos 47 anos, em 1992, privou as primeiras gerações nascidas em liberdade do contacto direto com o "anti-herói" do 25 de abril. O museu e, agora, também o filme, com o seu nome, podem servir para perpetuar o seu extraordinário exemplo de vida.
Como visitar
A Casa da Cidadania Salgueiro Maia resulta de um projeto da Câmara Municipal de Castelo de Vide e da Direção Regional de Cultura do Alentejo (DRCAlentejo). Mais informações, sobre localização e horários de visita, no site do município.
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