Trabalhar com os D. Roberto não é fácil. No espetáculo que estão a promover, Uma Tourada dos Diabos, Manuel Dias, António Bexiga, com a viola campaniça e percussão, e Nuno do Ó, com voz, arranjos e letras originais de fado, procuram combinar o tradicional com o contemporâneo.

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Espetáculo uma Tourada dos Diabos - Robertos, Viola e Campaniça ©Trulé créditos: Andarilho

A arte do bonecreiro tem a ajuda fora do pequeno cubículo tapado com um pano e também acrescenta a sua voz com uma palheta que, de certa forma, substitui as cordas vocais. São pouco os marionetistas em Portugal que o conseguem fazer.

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Nuno do Ó, Manuel Dias e António Bexiga ©Trulé créditos: Andarilho

Nos D. Roberto, Manuel Dias usa a voz para traçar o perfil dos bonecos que vão para a rua contar histórias. Enredos que dão vida às marionetas de luva que vemos por cima da estrutura improvisada.

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Teatro à la Minuta - as marionetas são manipuladas no interior da caixa créditos: Andarilho

No teatro à la Minuta também utiliza a voz mas, nas outras situações, nos espetáculos em palco, com vários tipos de marioneta, o acompanhamento é musical e Manuel Dias revela-se talentoso na forma como dá vida aos bonecos.

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Manuel Dias e o gato ©Trulé créditos: Andarilho

“O meu apoio para a manipulação é a música. Depois, a partir daí, tento tocar emocionalmente. É evidente que neste pormenor tem de haver duas coisas. Eu tento comunicar o mais correto possível o que pretendo dizer e, da parte do público, tem de haver uma disponibilidade para aceitar o que estou a fazer. É este jogo que num espetáculo me entusiasma e que eu gosto que aconteça.”

Nas atuações onde não usa a voz, conta apenas com o apoio da música, os bonecos são uma extensão da sua paixão pelo que faz. É fascinante a densidade de emoções vividas em palco através dos bonecos e que ele projeta na audiência.

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Manuel Dias no atelier com Robertos e a estrutura metálica usada nos espetáculos créditos: Andarilho

“O eles poderem ganhar vida tem de acontecer da vontade do público de se deixar levar e eu tenho de fazer com que isso possa acontecer. Há quem diga que sim, que eu consigo dar vida àquele material inerte. Este é o meu grande desafio de vida.”

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Manuel Dias ©Trulé créditos: Andarilho

Ao contrário de muitos marionetistas que estão em palco, mas desejam tornarem-se invisíveis e centrar no boneco toda a atenção do público, com Manuel Dias há uma permanente interação com os bonecos, “há bonecos em que há diálogos de olhar entre mim e o boneco. Eu, enquanto eu, e que empresta o braço ou a mão para que o boneco exista. Por isso há um duplicar de eus no palco”.

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Manuel Dias com Vladimir ©Trulé créditos: Andarilho

Em alguns casos a relação é de uma profunda sensibilidade. Por exemplo, a relação com Vladimir é soberba. A rotação dos olhos, a articulação do corpo, em especial as pernas, tudo manipulado numa mão, consegue transmitir uma enorme expressividade. É fabuloso.

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Vladimir créditos: Andarilho

A própria marioneta é também uma exceção: “o Vladimir é a única marioneta que uso em palco e que não foi construída por mim. Foi-me oferecida por uma marionetista russo, engenheiro de robótica e falecido, entretanto. Ele viu um espetáculo meu e no final prometeu oferecer-me um boneco. É das coisas mais espantosas que eu tenho.”

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créditos: Andarilho

Os outros bonecos é o próprio Manuel Dias que constrói e que lhes dá personalidade logo à nascença, “resultam de vivências que quer dar corpo. Por exemplo, tenho uma história, que também está na origem de um livro - O Bebé - que é com a boneca da minha filha mais velha que tem agora 40 anos.

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créditos: Andarilho

Quando era pequena brincou com ela até que a boneca acabou por se perder. Há cerca de 30 anos aproveitei a cabeça fiz uma marioneta. Ela tem essa carga, há momentos na minha relação com a bebé, que eu acredito que ela existe, tem vida.

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Manuel Dias com a boneca ©Trulé créditos: Andarilho

Tenho outra marioneta que é uma camisola que a minha mulher fez quando começámos a viver juntos. Foi a única camisola que ela fez na vida! Passados 20 anos essa camisola é recuperada e é uma marioneta. São este tipo de vivências que eu gosto de trabalhar.”

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créditos: Andarilho

Manuel Dias iniciou o seu projeto de pesquisa sobre as marionetas em 1975 e em 1986 começou a trabalhar como marionetista.

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créditos: Andarilho

É muito solicitado para festivais internacionais e já foi distinguido com vários prémios.

Designou o seu projeto de Trulé porque era este o nome dado aos Robertos na Beira Baixa devido aos tambores que anunciavam na aldeia a presença do bonecreiro e o inicio do espetáculo.

O atelier onde constrói os bonecos e ensaia é em Évora e Manuel Dias faz ainda parte da É Neste País, uma associação cultural que privilegia também os contos e outras histórias e que promove o espetáculo com os D. Roberto.

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créditos: Andarilho

Trulé, trulé! Vem aí a magia dos Robertos e de Manuel Dias faz parte do programa da Antena1, Vou Ali e Já Venho, e a emissão deste episódio pode ouvir aqui.