Dei início à minha grande aventura à boleia no dia 20 de outubro e cheguei à Moldávia no dia 2 de novembro. Ao longo dos 14 dias em boleias, passei por Portugal, Espanha, França, Itália, Eslovénia, Croácia, Bósnia, Sérvia, Roménia e Moldávia. Sem gastar um cêntimo em transporte, aproveitei dois dias para descansar, mas principalmente para tomar banho e lavar a roupa. O tempo que me restou andei a explorar a cidade onde me encontrava.
A preparação da minha mochila era importante porque, caso me faltasse algo, a gestão do tempo era complicada. Devido ao meu budget ser baixo, levei comigo a tenda, o material necessário para acampar e para fazer comida. Não levei muita roupa nem coisas desnecessárias, mas sim o essencial.
A minha experiência em boleia era pouca, apanhei umas boleias na Islândia, Açores, Tenerife e em Portugal continental. Sempre correram bem e o pessoal foi sempre porreiro. A minha inspiração nesta viagem foi sem dúvida os portugueses que andam pelo mundo à boleia. Foi isso o que me levou a fazer esta viagem.
Antes de iniciar, desafiei-me a mim mesmo com um orçamento de 10€ por dia, sendo este dinheiro para gastar em tudo. Sabia que quase tudo seria para a comida, mas no final dos 14 dias consegui gastar apenas 100€ na viagem toda e cumpri o objetivo de gastar zero euros em transporte.
A minha primeira boleia foi combinada. Queria que a minha namorada fosse a primeira pessoa a levar-me. Deixou-me fora do Pinhal Novo e junto de uma autoestrada. Esperei cerca de 40 minutos e, curiosamente, parou um amigo meu e levou-me até Évora.
Para o primeiro dia não era nada mau, pensei para mim, mas, assim que me pus à estrada, parou um carro e foi a maior boleia de sempre. O rapaz Florian da Alemanha ia em direção a casa, aproveitei e fui com ele até França, em Baiona.
O rapaz, muito simpático, contou-me uma história de amor engraçada. No ano anterior, fez os Caminhos de Santiago, mas queria andar sozinho porque estava com alguns problemas pessoais. Ao longo das paisagens e aldeias bonitas, encontrou uma rapariga portuguesa que estava na mesma direção que ele. Conversa aqui, conversa ali, acabaram por fazer o caminho todo juntos até Santiago. O Florian ia à Alemanha buscar as restantes coisas dele porque se apaixonaram e iam viver juntos em Portugal.
Para o primeiro dia não era nada mau fazer três países. No dia seguinte junto de uma autoestrada à espera de uma boleia, estava com mais um dia de sorte. Uma família francesa ia até Toulon de férias, o que era perfeito para mim porque faziam uma grande parte de França. Muita boa vibe no carro, paramos algumas vezes para comer e eles sempre me queriam oferecer comida, mesmo sabendo que tinha.
Depois de passar as belíssimas vistas dos Pirenéus, passamos pelo mar Mediterrâneo e chegamos à cidade de Toulon. Já estava a ficar de noite, decidi andar um bocado para fora da cidade e acampar por lá, sabendo que de noite era muito difícil pedir boleia.
No dia seguinte começou a aumentar o tempo de espera e as pessoas não paravam tanto, nos restantes 170 km até Itália apanhei cinco boleias. Itália foi sem dúvida o país mais difícil, mas possivelmente porque não estava com muita sorte.
Estava numa zona muito movimentada e estranhamente ninguém parava. Para além do papel que tinha a dizer Génova, coloquei também à vista a bandeira de Portugal. Cerca de 10 minutos depois parou o senhor Rui do Porto, camionista. A primeira frase que ele me disse foi: "o que te salvou foi esta bandeira na mão, estás numa zona onde passam muitos refugiados e roubam muitos carros. Mas vá, és tuga e estás com sorte hoje porque vou até Génova."
Finalmente, um camionista que me deu boleia, mas, mais do que isso, um português.
Fiquei numas portagens e passado cinco minutos veio a polícia implicar que não podia estar lá, mas sinceramente não tinha para onde ir. Um rapaz da Albânia veio ter comigo e deixou-me um bocado mais à frente e assim escapei-lhes.
O tempo estava a mudar e passei a noite perto de Veneza a ouvir a água a cair em cima da tenda. A chuva ia continuar por mais uns dias e eu tinha de sair de lá. Felizmente, encontrei um abrigo junto à entrada de uma autoestrada e, passado uma hora e meia, boleia em direção à fronteira com Eslovénia. Acabei por não chegar onde queria e fiquei no centro de Trieste. Para sair da cidade tive que andar três horas a pé, à chuva, de noite e sem lugar para dormir. Não havia nenhum lugar onde pudesse colocar a tenda e tentei bater à porta da casa das pessoas a perguntar se podia colocar a minha tenda no quintal deles. Sem resultado, andei mais um bocado e tive de enfiar-me nas ervas e dormir em cima de pedras. A noite tinha sido muito má e já estava cansado, sem tomar banho e sem pequeno-almoço. Precisava de uma cama verdadeira e na Croácia, em Rijeka, gastei 25 euros num hostel, mas valeu muito a pena.
A Croácia surpreendeu-me pela positiva, adorei andar à boleia por lá. As florestas são enormes, altas e bem densas.
A boleia mais fixe foi com duas irmãs que fizeram grande parte do país. Conduzi o carro e falámos da vida no geral, foi brutal. Curiosamente fiquei junto da fronteira com a Bósnia, mas como não era caminho passei apenas uma manhã na vila de Derventa e, pela primeira vez, encontrei num raio de três quilómetros uma mesquita, uma igreja ortodoxa e uma católica.
O país seguinte era a Sérvia e conheci uma rapariga de Inglaterra que estava também nas boleias. A Fen tinha ar de adorar este tipo de aventuras e a parte interessante é que estava a ir para a Turquia à boleia, com muito pouco dinheiro, a dormir ao ar livre e para se casar com um rapaz do Irão.
Basicamente, fizemos a Sérvia num dia e estava prestes a entrar na Roménia quando o meu chip da língua inglesa passou para o romeno. Na Roménia, já estava com aquela sensação de sentir-me em casa.
Uma coisa engraçada que me aconteceu foi entrar numa carrinha e, assim que começamos a andar, diz o condutor: "sabes que vais pagar até a cidade onde eu vou?". E eu afirmei que vinha desde Portugal sem gastar dinheiro em transporte e que ia chegar à Moldávia da mesma forma. Ficou a pensar e disse que o dinheiro não era tudo e que não se importava que eu fosse com ele.
A noite mais gelada de sempre foi em Sibeu e também a cidade que mais gostei. Muitos diziam-me para ter cuidado onde dormir porque naquela zona andam ursos. Eu adorava ter visto nem que fosse um, mas podia correr mal...
Na saída de Brasov, parou o camionista Anatolie da Ucrânia, eu estranhei porque eles não costumam parar devido ao tempo limitado para conduzir. Assim que entrei no camião ele deu-me logo o papel da lotaria para eu fazer. Foi-me contando ao longo do caminho que por umas três vezes que levou pessoas à boleia ganhou bastante dinheiro, estamos a falar de 60 mil e 4 mil euros. Óbvio que também parava se estivesse no lugar dele. O senhor Anatolie foi incrível comigo, perguntava-me sempre se precisava de alguma coisa e ajudou-me a apanhar boleia à noite na direção que queria.
Passei a noite na casa de uns familiares em Iasi. Estava tão perto da fronteira que não acreditava, mas rapidamente cheguei lá. Foi incrível a sensação de chegada e de concluir aquilo que queria. Passar a fronteira e entrar na Moldávia, na terra onde nasci, mexeu comigo de uma forma muito positiva e fez-me lembrar toda a fantástica infância que tive na minha aldeia.
Ao longo das muitas muitas boleias, encontrei pessoas incríveis e que estavam sempre disponíveis a ajudar-me e isso foi o que me marcou mais. Muitos paravam para ajudar-me com boleias, mas também com comida ou dinheiro. A realidade é que existem muitas pessoas boas no mundo e temos que estar de braços abertos para que elas também estejam.
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