Quando cheguei às Caldas, o tempo estava excelente e encorajava o contacto com a natureza, por isso a visita começou pelo lugar mais óbvio — o Parque D. Carlos I.
Desde miúda que não passava por aqui, e aquilo que encontrei não se afastava muito das boas memórias que guardava da infância. O jardim continua a ser uma espécie de floresta de contos de fada, com uma fantástica paleta de cores: a terracota do chão, o verde das árvores, todas as cores dos barquinhos do lago e o azul (e branco) dos pavões. É um jardim romântico, criação do arquiteto Rodrigo Berquó, que nos finais do século XIX o imaginou e projetou.
Está cheio de recantos maravilhosos, como a pérgula próxima do Museu Malhoa, o Céu de Vidro (antiga casa da cultura e clube de recreio), que ligava o jardim ao Hospital Termal, e o bonito lago que reflete como um espelho a imagem dos grandes Pavilhões do Parque.
Estes edifícios imponentes, hoje abandonados, sempre foram uma obra inacabada. Foram construídos para funcionarem como hotel termal, mas na verdade, nunca desempenharam essa função. Ao longo do tempo tiveram vários inquilinos entre os quais o exército e a Escola Técnica Empresarial do Oeste. Estão vazios desde 2005, mas no início deste mês foi aprovado o projeto para reabilitação do espaço e, se tudo correr bem, em 2023 abrirá aqui um hotel cinco estrelas denominado Montebelo Bordallo Pinheiro.
As Caldas da Rainha inspiram e expiram arte. O pintor José Malhoa, pioneiro do Naturalismo em Portugal, é filho desta cidade, e o museu que hoje lhe presta homenagem é de visita obrigatória. Mostra o maior núcleo reunido de obras de José Malhoa e uma importante coleção de pintura e de escultura dos séculos XIX e XX. Para além disso apresenta interessantes exposições temporárias como a exposição “Casulos”, que podemos visitar atualmente.
E por falar em arte. Ela está por todo o lado nas Caldas da Rainha. Ainda no Parque D. Carlos I podemos encontrar dezenas de esculturas e pelas ruas da cidade somos surpreendidos por maravilhosos elementos da Rota Bordaliana.
Pensada para ser percorrida a pé, a Rota Bordaliana, dedicada, como o nome indica, a Rafael Bordallo Pinheiro, oferece um percurso que demora aproximadamente duas horas a ser percorrido. Começa no Largo da Estação, passa por vários pontos turísticos relacionados com o artista e com o seu trabalho e termina na Fábrica de Faianças e Casa Museu Rafael Bordallo Pinheiro.
Existe uma rota mais curta, com duração de cerca de uma hora, que contempla apenas os locais que têm as peças cerâmicas de grande escala. Este percurso termina igualmente na Fábrica de Faianças Bordallo Pinheiro.
Perto da Fábrica encontramos outra das atrações imperdíveis da cidade — o Museu da Cerâmica. As Caldas da Rainha sempre foram um centro cerâmico de reconhecida tradição e o Museu que a cidade dedica a esta arte, comprova isto mesmo.
Instalado na antiga Quinta Visconde de Sacavém, este conjunto arquitetónico revivalista de final do século XIX, integra um Palacete tardo-romântico que abriga a exposição permanente e áreas anexas remodeladas, onde se situam a sala de exposições temporárias, a loja, a olaria e centro de documentação.
Os jardins da Quinta, de traçado romântico, constituem mais um interessante conjunto evocativo do gosto do final do século XIX, com as suas alamedas, canteiros, floreiras e um auditório ao ar livre. São de realçar as decorações cerâmicas que ornamentam todo o conjunto. Eu gostei especialmente do lindíssimo gato preto que fica ao pé do pequeno lago.
Mas, há mais arte nas Caldas da Rainha.
Os murais de arte urbana chamam imediatamente a nossa atenção e as artes plásticas estão presentes pela mão de Ferreira da Silva, um dos maiores nomes das artes plásticas em Portugal, apontado como uma grande referência dos séculos XX e XXI.
A sua obra está espalhada pela cidade, em espaços públicos e privados, integrando dez trabalhos em escultura, cerâmica, azulejaria e pintura, que mostram a sua versatilidade.
Os trabalhos foram desenvolvidos entre 1989 e 2010 e formam instalações de grandes dimensões, que integram painéis de azulejo, ferro, vidro e fragmentos cerâmicos. Destaca-se o Jardim da Água, uma das maiores obras de arte exterior/urbana do território nacional.
E depois há o humor!
Esculturas em formato fálico não se encontram em muitos lugares, mas são uma coisa comum nas Caldas da Rainha. A sua origem é obscura, mas a versão que atribui a sua criação à Fábrica de Manuel Gomes, “o Mafra”, na segunda metade do século XIX, por encomenda do Rei D. Luís que, segundo dizem, queria oferecer algo original a convidados espanhóis, parece ser a mais consensual.
Estas engraçadas peças de cerâmica, numa altura em que o setor do artesanato estava em crise, foram a salvação de muitos pequenos negócios e atualmente, como que a provar que as Caldas da Rainha são uma cidade criativa e que se sabe adaptar aos tempos, muitos são os ceramistas e designers modernos que dão continuidade à tradição, dando-lhe novas formas e roupagens. Mas a malandrice, essa, está sempre lá!
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Artigo originalmente publicado no blogue The Travellight World
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