Já sabem que temos a crescente tendência para visitar lugares da Pré-História, do Megalítico, Arte Rupestre, Romana, Românica e todos e quaisquer períodos que enriqueçam as nossas rotas com História e Arqueologia. Uma anta nunca será para nós só um monte de pedra. Umas ruínas romanas nunca serão para nós vários montes de pedra. Serão sempre lugares marcantes, instalados nas mais belas paisagens da região, repletos de um passado de interesse infinito, carregados de energias que nos fazem recuar no tempo, e imaginar como seria a vida outrora. Lamentamos apenas o facto de se encontrarem tão entregues à sua sorte, e tão desprovidos de atenção e divulgação.

Seguimos para o nordeste de Portugal, e uma das nossas zonas preferidas do país. Naquele interior mais remoto, feito de imponentes montanhas onde a cada estação novo espetáculo nos aguarda, há sempre uma rota de belas estradas a percorrer. No início da primavera florescem as amendoeiras e no outono os vastos vinhedos enchem-se de folhas de cor de fogo. Com a chegada do verão, juntam-se as cerejas ao roteiro com aquele sabor de fruta acabada de colher, num cerejal ali ao lado. Doces, suculentas e na perfeita consistência. Se viajam entre o mês de maio e junho, levem espaço nas bagagens; e na barriga.

Miradouro da Faia

Seguimos para o planalto de Pinhel, para a entrada em Trás-os-Montes no vale do rio Côa. E é o Miradouro da Faia Brava que está no próximo ponto de paragem.

Vindos da aldeia do Juízo e desconhecendo por completo qualquer acesso ao Miradouro da Faia, deixamo-nos guiar pelos caminhos agrícolas que vimos através do Google Maps. Sabemos que estará ali algures naquela direção a partir do acesso pavimentado entre o Juízo e Cidadelhe. Entre os olivais, amendoais, vinhedos e muitos campos agrícolas contornados por muros de pedra, fazemos alguns quilómetros fora de estrada seguindo apenas um rumo aproximado na tentativa de encontrar o Miradouro da Faia.

Não é que afinal havia acesso por estrada? Basta partir de Madalena, a pequena aldeia nos arredores e seguir até a devoluta aldeia da Faia. Afinal, mais de uma hora entre caminhadas e voltas fora de estrada, chegámos por fim ao último lugar pavimentado para visitar o fabuloso miradouro. Não antes de mais uns belos 600 metros de caminhada, a descer!

Chegados ao Miradouro da Faia, o curso do rio Côa avista-se do topo da colina, numa deslumbrante paisagem intocada. Os degraus metálicos da escadaria recém construída, criam uma plataforma transparente para apreciar o rio Côa a mais de 200 metros de altura.

Miradouro da Faia
Miradouro da Faia créditos: Quilómetro infinito

No vale do Côa no seu caminho para o Douro

Já não se consegue imaginar um sem o outro quando se ruma ao Douro Internacional. Falo dos rios Douro e Côa. O Douro atravessa Portugal de Este a Oeste na região Norte, mas vindo de Sul, está o Côa cujo nome se tornou internacionalmente conhecido.

O Côa é um dos afluentes do Douro e, no fim do seu curso, encerra o seu vasto vale num deslumbrante ciclo artístico. As formações rochosas que delimitam o seu leito, e nos apresentam mágicas estradas para andar de mota, foram-se convertendo, milénio após milénio, em painéis com milhares de gravuras rupestres que são a Arte da Pré-História. Falamos do Parque Arqueológico do Vale do Côa inscrito na UNESCO como Património da Humanidade.

É nos arredores de Vila Nova de Foz Côa que terminamos o primeiro dia deste roteiro. E qualquer uma das sugestões de alojamento  se encontram boas opções Casa de Santa Cruz, Felgar para um ambiente de maior requinte e piscina. Casa dos Primos, Muxagata para um ambiente familiar e muito acolhedor. Com um pequeno-almoço de produtos locais maravilhosos.

Senhora da Ribeira

Do outro lado do Vale da Vilariça, o rumo leva-nos a Oeste, e é para lá da Foz do Sabor que encontraremos o Douro mais além. Cabeça Boa, Cabeça de Mouro e Lousã são as aldeias que se seguem. Unidas por uma espectacular e sinuosa estrada, repleta de curvas desafiantes que ganham altitude por entre os socalcos de amendoais, olivais, cerejais e muitas outras árvores de fruto que adornam a paisagem. Mas é na descida de Lousã para o vale do Douro, que uma das mais maravilhosas e remotas estradas de Portugal se encontram.

Chamam-lhe a Senhora da Ribeira, e por vários quilómetros acompanha o curso do Douro à beira rio. Entre vinhedos e laranjais num percurso ribeirinho de sonho que tivemos a sorte de nos ter sido apresentado por um amigo transmontano.

Senhora da Ribeira
Senhora da Ribeira créditos: Quilómetro infinito

N323 Vale do Távora e o Mosteiro de São Pedro das Águias

Atravessamos o Douro na barragem da Valeira. Por entre os socalcos de vinhas que fazem parte do Património Mundial da UNESCO, uma ida ao Alto Douro Vinhateiro é sempre uma grande lembrança de que Portugal é um país de sonho para andar de mota. Entramos na N222 uma vez mais para rumar ao vale de outro afluente do nobre Douro: o Távora.

A entrada no Vale do Távora é feita pela curvilínea N323 que segue em altitude o curso do rio a seus pés. Formações rochosas fantásticas, e uma abundante vegetação adornam uma paisagem idílica para lá das rotas mais conhecidas da região. Estamos de olho na visita ao Mosteiro de São Pedro das Águias, e é com muitas dúvidas acerca dos seus acessos que avançamos pelas profundezas da floresta que nos rodeia.

Um templo românico: Mosteiro de São Pedro das Águias

Saímos da N323 na aldeia de Granjinha, para uma pequena e estreita estrada que desce a montanha gradualmente. No fim do percurso, num privilegiado lugar à beira do Távora, está o pequeno Mosteiro São Pedro das Águias. Um templo românico alcandorado numa escarpa sobranceira ao Távora. Cuja remota localização lhe conferiu o estatuto de eremitério construído pelos monges beneditinos e posteriormente cistercienses.

Um dos mais belos monumentos da arquitectura românica portuguesa, cuja insólita implantação em tão desnivelado penedo granítico lhe confere uma arquitectura peculiar. A entrada principal é feita por entre um pequeno acesso entre a parede rochosa e um arco ricamente decorado. Com a extinção das ordens religiosas no século XIX, ficou ao abandono e só recentemente foi restaurado. A curtos metros de caminhada do local, está a Praia Fluvial da Granjinha a apelar a um mergulho nos dias quentes.

Mosteiro de São Pedro das Águias
Mosteiro de São Pedro das Águias créditos: Quilómetro infinito

Em torno do mosteiro, encontramos sepulturas antropomórficas construídas em rochas amovíveis. Sem enquadramento histórico ou possibilidade de entrada no monumento, ficamos apenas a imaginar quais antiga poderá ser a ocupação deste lugar e quantas pessoas o escolheram para viver, e por lá morrer. Porque é a localização panorâmica garantida que nos leva a lugares assim, e essa tendência nunca nos desapontou.

Quem chega por acaso à hora de almoço à Taverna A Tarraxa?

Quis o destino que o regresso à N323 nos guiasse à aldeia de Sendim na hora de almoço, no vale do Távora. A Taverna A Tarraxa é conhecida pela fama do seu proprietário: o Engenheiro da Picanha. Um lugar que jamais ali imaginámos e onde fomos ter seguindo o cheiro a carne assada que se faz sentir a poucos metros do acesso principal.

Num ambiente tradicional, em torno de muita carne, muito vinho e muita comida tradicional, sentamo-nos numa das mesas partilhadas de uma taverna tipicamente portuguesa e nortenha. Para uma farta refeição em torno de risadas e do garrafão de aguardente que corre as mesas à descrição. Nós não bebemos lembram-se? Sobrou mais para vocês.

A Taverna A Tarraxa
créditos: Quilómetro infinito

Depois de tamanha refeição, os planos para a caminhada em torno da Albufeira de Vilar ficaram para depois. E porque este é um roteiro para apenas dois dias disponíveis, a sesta ficou para o final do dia depois do regresso a casa pelos caminhos do Centro de Portugal. Há muitas rotas diferentes pelos mesmos lugares, e o nosso roteiro pelos vales dos rios Côa, Douro e Távora foi a prova disso mesmo. Boas curvas!

Artigo originalmente publicado no blogue Quilómetro Infinito