Entrámos pela rua adentro, os passos parecem seguir os acordes da guitarra, o som ganha a rua – pela janela aberta. E eu não sei, porque as cortinas não deixam, mas é como se entrasse na casa e visse o senhor de bigode, com os seus 60 anos, a tocá-la. É como se viajasse no tempo e visse o pai desse senhor de bigode, na altura menino, fazê-lo e, antes deles, o pai do seu pai. Todos ali, a seu tempo, naquela mesma casa, naquele mesmo cadeirão, agora gasto pelo tempo, o mesmo que, a seu tempo, os levou.
–Bom dia! – diz alguém que passa de bicicleta. Estamos no Bairro das Fontainhas, na velha Goa e é como se, após tantos meses fora, entrássemos em Portugal.
As ruelas e vielas, estreitas; os becos e as escadarias e os letreiros das ruas lembram-nos a nossa ‘casa’: Rua de Natal, Rua de Ourém, Rua 31 de Janeiro. Juntam-se os azulejos que preenchem a fachada de algumas das casas, no seu tradicional azul e branco; os carros antigos; os vasos que se espalham pelos pátios em frente às casas – Casa das Fontainhas, Casa Lusitana, Vivenda Silva Viegas, Casa de Morada Gomes Pereira; as cores vivas, as colunas e os arcos, as janelas e todo o comércio escrito em português: Barbearia República, Bar Santarita, Abrigo do Botelho, Drogaria Raicar.
Confirmamos a fama, este bairro, situado na zona oriental de Pangim, entre o morro do Altinho, o bairro de São Tomé e a Ribeira de Ourém, é o mais lusitano de todos os bairros de Goa. Aqui cheira a Portugal, aqui os ouvidos enchem-se com os acordes da guitarra portuguesa e, em dias bons, consigo imaginar a concertina. Aqui, os olhos enchem-se de palavras escritas em português e da farmácia à padaria, ainda há quem pergunte o que deseja e quem peça em português. E é como se estivéssemos em Portugal.
*** Continua ***
Este artigo foi originalmente publicado em Menina Mundo.
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