Sempre que vejo uma casa antiga, vazia, penso: como seria quando ainda era cheia?

A vida, as paredes novas, cada divisão com uma função. O quarto do filho que está quase a chegar, o quarto dos irmãos, dos pais e avós. Os dias - bons e maus - feitos a três ou mais gerações, feitos sobre esse mesmo tecto. A sala onde todos se juntam, a mesa: grande, sempre aberta, sempre cheia e sempre com um lugar a mais, para quem chegar.

Gostava de ter entrado nesta casa – uma das mais emblemáticas casas senhoriais da antiga aristocracia goesa – há três séculos atrás. Gostava de ter visto os seus dias cheios, a mesa cheia, os dedos no piano e o som dele a encher cada divisão. O salão de festas: em danças e vestidos que se repetem nos seus longos espelhos.

Quantos bailes? Quantas danças? Quantas festas? Quantos nascimentos? Quantos pensamentos ? Quantos pensadores? Quantos escritos do célebre jornalista Luís de Menezes Bragança aqui nascido? Heraldo, O Debate e Diário da Noite, os periódicos de língua portuguesa, onde não refreava a sátira às políticas de administração colonial. E depois… quantos adeus, quantas mortes, quantos fins?

Hoje é casa vazia no meio da aldeia goesa de Chandor. Vazia de vida e casa dividida, em ala esquerda e ala direita. A primeira pertencente aos Bragança Pereira e a segunda aos Menezes Bragança. Hoje falam as dificuldades em manter o património desta casa secular e de tudo o que ela guarda.

São 400 anos que se contam nas janelas de vidros coloridos, chegados de Veneza; nos mosaicos portugueses, que se estendem até ao jardim; no cristal dos candelabros belgas; nas porcelanas finas oferecidas em visitas oficiais à China, ao Japão; nas pratas portuguesas e inglesas, no espólio de livros e nos retratos dos antepassados, pintados a óleo.

E nós vimos todas estas coisas, e no salão de festas enchemos os espelhos com as danças de mãe e filha e eu juro que nos consegui ver vestidas à l’époque, no reflexo devolvido pelo espelho.

A casa de Chandor
créditos: Menina Mundo

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Se estiver em Goa não perca a oportunidade de visitar esta casa e conhecer um pouco mais da Índia Portuguesa. A entrada é gratuita, podendo as duas alas ser visitadas entre as 9h e as 17h, no final somos convidados a contribuir com a quantia que desejarmos, colocando-a numa pequena caixa, a mesma serve para a manutenção da casa e do património que contém.

Veja também o documentário: ‘A Dama de Chandor’ de Catarina Mourão (de 1998) onde Aida Menezes Bragança conta a sua vida – de 80 anos na altura das filmagens – neste palácio perdido nesta aldeia goesa.

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Este artigo foi originalmente publicado em Menina Mundo.