"Dançar tango em Buenos Aires pode ser muito intimidador, alguns não conseguem" diz David Tolosa, bailarino profissional e "taxi dancer" nesta meca do tango, onde trabalha como acompanhante de iniciantes.

A maioria dos seus clientes são estrangeiros ávidos por experimentar a autêntica vida noturna que Buenos Aires oferece em centenas de “milongas”, cujo brilho reluz intensamente ao longo do mês de agosto, durante o Campeonato Mundial de Tango, um ímã para os turistas.

Ainda que as novas gerações tragam novos ares aos salões de tango, as regras persistem e podem intimidar até o tangueiro mais corajoso.

A maioria dos dançarinos oferece o seu serviço de forma individual, mas também existem agências em um mercado pequeno e 'gourmet'.

Algumas, como é o caso da TangoTaxiDancers, há 17 anos no mercado, aconselham ler com atenção os termos. "Não somos uma agência de 'Latin Lovers'", alertam.

Tango
Tango O "taxi dancer" profissional "Tango" David Tolosa (L) ensina Salvador Bolanos do México durante uma milonga no salão de tango Marabu em Buenos Aires em 17 de agosto de 2024 créditos: AFP/Juan Mabromata

"Isto é para evitar uma situação incómoda", esclarece à AFP Anna Fiore, diretora da agência.

Além disso, a agência também oferece um cardápio com o abc "milonguero", que inclui aulas, fantasias e a arte do "cabeceo", a maneira tradicional de convidar as pessoas para dançar à distância, trocando olhares discretos para evitar fiascos.

"Deseja que o dançarino ou dançarina se sente numa mesa próxima para praticar o "cabeceo?", é uma das perguntas do formulário de contratação.

"Existem códigos, o olhar certo, escolher com quem vai dançar, se gostas como a pessoa dança, se a pessoa te aceita. É muito forte neste sentido", explica Tolosa, de 27 anos, há 20 bailarino e há 7 como taxi dancer.

Todos os seus clientes são estrangeiros, "a maioria mulheres principalmente asiáticas, japonesas e chinesas, mas também francesas e inglesas" que pagam 50 dólares a hora.

Tango cruel

O ambiente é "um pouco cruel" diz Tolosa. "A pista é uma vitrine. Há bailarinos conhecidos que estão a observar a pista, como as coisas fluem, se há conflitos. Há uma pressão para que dês o teu melhor”, conta.

Embora, como canta um antigo tango: “un tropezón, cualquiera da en la vida”, no ambiente exigente do tango pode arruinar a noite.

Os 'taxi dancers' salvam as pessoas da frustração de 'planchar', no jargão, ficando sem dançar devido a sucessivas rejeições ou falta de convite.

"As mulheres preferem contratar-me para não ficarem sem convites e passarem horas sentadas" explica Tolosa. A procura aumenta com o Campeonato Mundial de Tango, embora permaneça num determinado nível durante o resto do ano.

"É uma maneira de viver da dança, da arte", diz Martín Gabriel Cardoso, que aos 40 anos de idade construiu uma carreira no tango.

Existem diferentes tipos de taxi dancers: "os assistentes que acompanham os estrangeiros que vêm fazer o seu ‘tour de tango’ em Buenos Aires, os contratados como casais para competir na Copa do Mundo e os que dão aulas, o panorama é amplo”, diz Cardoso, taxi dancer desde 2010 e dançarino em shows de Buenos Aires.

"Os argentinos não contratam muito por causa do custo e porque sabem como é a milonga, mas os estrangeiros não conhecem o ambiente”, conta.

Além de ser um bom dançarino, um taxi dancer "deve ter uma boa presença, manejo de pista - porque a pista tem uma certa conduta- e saber inglês", enumera.

As contratações são feitas através das redes sociais, no entanto, são "mais frequentes por recomendações de gente do ambiente", explica.

Paixão pelo tango

Saber os primeiros passos não é garantia de dançar na milonga. Os “habitués” observam e escolhem de acordo com o que é demonstrado na pista de dança. Nenhum deles quer ser pisoteado pelos novatos.

“Nunca tive um cliente a pisar os meus pés”, ri Laura Florencia Guardia, uma taxi dancer de 28 anos.

Ela administra habilmente a distância dos pés de Salvador Bolaños, um entusiasta mexicano cujas botas com sola de borracha revelam a sua inexperiência.

"É a primeira milonga que frequento e adoro”, confessa o engenheiro de sistemas de 37 anos, atraído pela "melancolia e força do tango e pelo fato de ser dançado com tanta paixão".

A profissão de acompanhante é maioritariamente masculina, no entanto, cada vez mais mulheres entram no ramo, algo que Guardia atribui às correntes juvenis que quebraram estereótipos.

O que permanece o mesmo é a ânsia dos clientes que “estão a procurar mergulhar no mundo do tango, ver uma orquestra, a tradição”.

E aprender a dançar?

"A princípio eles chegam com vergonha, mas logo se soltam", diz Guardia, Afinal de contas, "aprende-se praticando".