A Ana é médica cardiologista com uma paixão por fotografia de natureza. Em julho, numa viagem à região central de Espanha, teve a oportunidade de observar a curta distância uma família de linces-ibéricos selvagens, a última espécie de grandes felinos que habita a Península Ibérica. Pedimos à Ana que nos contasse, para o Como fiz esta fotografia, como o momento se proporcionou.
Texto e fotografias por Ana Mendes do Carmo
Dos animais selvagens que tenho fotografado o lince estará entre um dos que mais me fascina talvez pela sua extraordinária beleza e pela dificuldade em o captar em excelentes condições de luz.
Desde há cerca de 3 anos que vou com frequência a Peñalajo. Trata-se de uma floresta mediterrânica com 2.260 hectares situada perto de Cidade Real, na região central da Espanha. No passado, foi ponto de encontro da aristocracia europeia vocacionada para a actividade cinegética.
Com o passar dos anos, com a mudança de mentalidades e o excelente trabalho de uma equipa liderada pelo fotógrafo de natureza, António Liebana, aquele local deixou de ser um local vocacionado para a caça e passou a ser uma reserva onde o lince-ibérico tem as condições ideais e necessárias para o seu desenvolvimento e manutenção.
a sensação de ver um lince, nem que seja por escassos segundos, no seu habitat natural e o poder fotografar é indescritível.
O turismo de caça foi substituído pelo turismo fotográfico e assim criados locais próprios, abrigos estrategicamente colocados para os fotógrafos de natureza obterem imagens deste belo felino no seu habitat natural.
O lince-ibérico é o felino mais ameaçado do Mundo e esteve até há pouco tempo englobado no “Livro Vermelho dos Vertebrados” na lista de espécies ameaçadas e em grande perigo de extinção. Para isso contribuíram ameaças como a caça excessiva e furtiva, a perda de habitat e a perda do seu alimento principal, o coelho bravo atingido pela mixomatose. Em 2001, estimavam-se cerca de 60 indivíduos na Península Ibérica.
Hoje é com satisfação que após medidas adequadas de conservação como o restauro do seu habitat nativo, redução de causas não naturais de morte e o ressurgimento de populações saudáveis de coelho bravo (seu principal alimento), executadas através de programas conjuntos de organismos de Espanha e de Portugal, que a espécie recuperou, aumentando exponencialmente o seu número.
Existe agora, em 2024, uma população de linces adultos e juvenis superior a 2.000 exemplares na Península Ibérica. Peñalajo é um exemplo de bem-estar para esta e para muitas outras espécies mediterrânicas, das quais se destaca também a águia imperial ibérica. É sempre um prazer visitar este local e é através de workshops organizados que tento captar as mais belas imagens deste animal.
O lince-ibérico como animal de hábitos crepusculares tem as suas rotinas e a sua maior actividade é quase sempre nas primeiras e nas últimas horas do dia. Se o queremos fotografar com qualidade e em boas condições de luz devemos ter muita paciência, escondidos nesses abrigos em total silêncio e se possível com material fotográfico adequado.
As imagens que possuo do lince foram captadas após muitas horas de espera tendo utilizado uma câmara full-frame e uma teleobjectiva muito luminosa. Este ano, tive a sorte de captar imagens de linces adultos e juvenis que se deslocavam e se mantinham muitas vezes a beber água junto ao abrigo.
Este Julho foi para mim, o melhor mês em termos de fotografia de lince-ibérico. Proporcionou belas imagens destes magníficos animais, de que são exemplo as duas fotografias acima.
A fêmea com a sua cria, que espreita em direção ao nosso abrigo, e a mais pequena cria de lince bebendo água durante algum tempo, numa posição bem favorável para nós. No entanto, esta não é a regra. Com maior frequência o lince passa pela zona do abrigo, por vezes longe, sem parar apenas com o intuito de procurar alimento.
Se queremos imagens com qualidade temos de manter níveis altíssimos de atenção para podermos em poucos segundos captar esse momento. Também não é raro que depois de horas de espera no abrigo o lince venha beber à nossa frente sem condições mínimas de luz. No ano passado, por exemplo, uma família (mãe com três crias) entrou na zona do abrigo às 22 horas!
Estas imagens que procuro requerem grande paciência, muita atenção o maior silêncio possível e material adequado de fotografia. Na generalidade, são 8 a 9 horas de espera por dia, fechados num abrigo para visualizar e fotografar o lince que poderá apenas se manter segundos à nossa frente. No entanto, a sensação de ver um lince, nem que seja por escassos segundos, no seu habitat natural e o poder fotografar é indescritível.
Sou licenciada em Medicina, especialista em Cardiologia, sendo o meu principal hobby a fotografia. Desde há muitos anos, e influenciada pelo meu Pai, iniciei-me na prática da fotografia. Inicialmente apenas com fotos de família, de momentos ou de paisagem. Em 2008, comecei a encarar este meu hobby mais a sério, tendo frequentado cursos de fotografia avançada e de edição de imagem. A Paisagem e a fotografia de Arquitetura foram, no início, o meu foco principal. Fui evoluindo e com alguma influência comecei a dedicar-me também à fotografia de natureza. Desde 2015 que essa é a minha fotografia de eleição.
Fiz viagens para diversos países nomeadamente, Espanha, Finlândia, Noruega, Polónia, Canadá, Brasil, Marrocos, Quénia, Chile, Malvinas e Ilhas Georgias do Sul dos quais tenho registos fotográficos da sua fauna mais interessante.
Podem seguir a paixão fotográfica da Ana na sua página Flickr e no Instagram.
Comentários