Sair da zona de conforto é, na maioria das vezes, a melhor forma de encontrarmos respostas para questões que nos inquietam. Com Cátia não foi diferente. “Tinha uma vida estabilizada em Portugal, casa e trabalho, mas dentro de mim faltava alguma coisa”, começa por nos contar a partir de Reiquiavique, onde vive atualmente.
Foi esta procura por algo que ainda não sabia muito bem o que era que a fez deixar o emprego numa agência turística em Viseu e partir, com um contrato de trabalho num operador turístico, para a Islândia em setembro de 2018. “Vim com trabalho mas não conhecia ninguém e não tinha pesquisado muito sobre o país, foi mesmo para sair da minha zona de conforto”, recorda.
A ideia era ficar um ano e, depois, ir para a Austrália. Mas não foi preciso. Cátia sentiu-se em casa na Islândia e, até ao momento, encontrou a felicidade genuína neste país insular marcado por paisagens magníficas, entre vulcões, glaciares e cascatas, que fascinam viajantes de todo o mundo.
Cátia conquistou também uma “qualidade de vida que não tinha em Portugal”. “Vivemos com mais calma e os direitos dos trabalhadores são muito respeitados”. Na Islândia, conseguiu equilibrar a balança entre trabalho e lazer, tendo mais hipóteses de “aproveitar a vida”, “sem estar sempre a contar os tostões”.
Reconhece que o custo de vida no país é elevado, mas que é possível poupar e viver de forma mais relaxada. A juntar a tudo isso, “as pessoas são super hospitaleiras”, “embora, no início, fiquem um pouco de pé atrás, a medir se podem mesmo confiar em ti”. São pessoas que dão “muito valor à família e aos amigos”.
Do turismo de massa a um país sem turistas
Mas nem tudo é um mar de rosas. Numa nação que vive, em grande parte, do turismo, a pandemia está a ter efeitos devastadores. Apesar de não ter registado muitos casos de COVID-19, a Islândia esvaziou-se de turistas e isso trouxe uma crise económica sem precedentes.
Depois da primeira vaga, foi um dos primeiros países a voltar a abrir-se ao turismo, em junho de 2020, exigindo apenas um teste negativo à entrada. Contudo, face ao incumprimento das regras por parte de alguns turistas e ao aumento de casos, as medidas foram endurecidas.
Neste momento, “são exigidos dois testes à chegada e quarentena obrigatória de cinco a seis dias”. Só os custos desta quarentena, que tem de ser feita num hotel, torna a viagem impensável para grande parte das pessoas. A exceção é para quem tenha sido vacinado ou tenha tido o vírus e esteja saudável. Todos estes fatores, mais as escalas noutros aeroportos, fazem com que muitos viajantes estejam a adiar as viagens.
Em julho do ano passado, Cátia ficou desempregada. A empresa onde trabalhava (já era o seu segundo emprego na Islândia) passou de 100 para quatro colaboradores. Os hotéis continuam fechados. No final de abril, as regras vão ser revistas e Cátia espera que a retoma do turismo possa começar.
Até lá, ela e os cerca de 364 mil habitantes desta ilha no norte da Europa podem aproveitar para visitar os cenários únicos sem a presença de milhares de turistas que, antes da COVID-19, já estavam a ultrapassar em grande escala o número de habitantes. Cerca de dois milhões de visitantes estiveram no país em 2019.
O turismo de massa era um problema que a Islândia tentava combater, como muitos outros destinos. “A Islândia vive das paisagens, os custos da viagem [alimentação, alojamento e transportes] podem ser caros, mas quase tudo o que tens para visitar é gratuito”.
“Queremos defender as nossas paisagens ao máximo”, sublinha. O que nem sempre é fácil quando “tens centenas de pessoas todos os dias, há sempre alguém que faz asneiras, deixa lixo”. “Por exemplo, arrancar musgo, o nosso musgo leva 70 anos para recuperar. Qualquer dia, não temos musgo”, se os turistas todos se lembrarem de o fazer.
Cátia destaca a beleza dos glaciares, que, infelizmente, "estão a derreter de dia para dia", "as grutas de gelo" e os cenários "mais selvagens" do país, como as Highlands (Terras Altas) que visitou este verão e onde se sentiu em Marte.
Auroras boreais da janela de casa
Através do Instagram, Cátia vai mostrando e narrando como é o seu dia-a-dia na Islândia, onde consegue, por exemplo, ver auroras boreais da janela de casa.
Começou a receber muitas mensagens com dúvidas e a pedir conselhos sobre viajar para a Islândia, que não é um destino fácil na hora de organizar um roteiro, a começar pelos nomes quase impronunciáveis de certos sítios e pela a ideia pré-concebida de que é um destino muito caro. Foi este o ponto de partida para desenvolver um projeto de turismo em nome próprio. A pandemia acelerou o processo.
“Já partilho a Islândia desde que me mudei, mas não podia entrar em concorrência com o meu trabalho”. As limitações causadas pela pandemia fizeram com que Cátia aproveitasse o tempo “fechada em casa” para criar um projeto com os valores que defende e com a abordagem que deseja ter nas viagens.
Assim surgiu o Meraki Iceland, onde Cátia disponibiliza serviços de criação e revisão de roteiros e itinerários, um e-Book (Islândia para Iniciantes), informações práticas sobre o país e, em breve, vai oferecer excursões que marquem pela diferença. Grupos mais reduzidos, “de sete a oito pessoas”, para que, no final da viagem, fiquem não só as fotografias, mas também amizades.
O objetivo passa por criar roteiros mais personalizados e que vão de encontro com as possibilidades e os desejos de cada viajante. A palavra grega "meraki" assenta como uma luva ao nome do projeto: "significa dar tudo o que temos ao que se quer fazer", fazer algo com alma.
“Quem me conhece sabe que eu falo da Islândia com felicidade e amor, não é negócio, e é isso que eu quero transmitir”, afirma. Cátia espera que as pessoas que viajem com ela se apaixonem também pelo país e sintam vontade de voltar. Nós ficamos com vontade de ir.
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