Após seis anos de obras, a tranquila cidade de Matesevo vai abrigar o improvável fim de uma das autoestradas mais caras do mundo.

Em 2014, o país - candidato à União Europeia (UE) - pediu um empréstimo de 944 milhões de dólares (cerca de 773 milhões de euros) a um banco chinês para que a empresa chinesa CRBC construísse o primeiro trecho da autoestrada, de cerca de 40 quilómetros.

"A construção é impressionante e não devemos parar por aqui", declarou à AFP Dragan, um reformado de 67 anos, vizinho de Matesevo. "Seria como comprar um carro caro e deixá-lo na garagem", comparou.

Montenegro: a autoestrada que custou milhões e ainda não leva lado nenhum
créditos: AFP
Montenegro: a autoestrada que custou milhões e ainda não leva lado nenhum
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O trecho da ponte que conecta Matesevo aos subúrbios da capital, Podgorica, será inaugurado em novembro.

Mas o país, de 600.000 habitantes, terá de encontrar mais de mil milhões de dólares adicionais para a construção dos 130 quilómetros necessários para terminar a obra.

Os críticos do projeto denunciam o impacto ambiental e a possível corrupção derivada de um projeto destinado a conectar a cidade de Bar, no sul, com a fronteira com a Sérvia, no norte e, em última instância, com Belgrado.

"Aspectos positivos"

Os moradores da cidade, situada às margens do rio Tara e inscrita na lista de Património Mundial da Unesco, tentam ver o lado bom das coisas.

"Para nós, há aspetos positivos. Alguns conseguiram vender as terras e ir embora, algo que antes era impossível", numa região empobrecida da qual muitos dos moradores decidiram emigrar, diz um morador, referindo-se a um fenómeno semelhante ao de outras partes dos Balcãs.

Montenegro: a autoestrada que custou milhões e ainda não leva lado nenhum
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Agora, os gigantescos pilares da ponte fazem com que a sua casa, situada bem ao lado, pareça uma casinha de bonecas.

"Consegui vender verduras e frangos para os trabalhadores" chineses, comenta, afirmando que as toneladas de terra depositadas durante a obra reforçaram as margens do Tara contra as inundações.

Ninguém sabe como será pago o empréstimo chinês, que representa um quinto da dívida externa de Montenegro.

O primeiro prazo será em julho, num país onde o Produto Interno Bruto (PIB) era de menos de 5 mil milhões de euros, antes da pandemia da COVID-19.

Caso a dívida não seja paga, uma comissão de Pequim poderia obrigar Montenegro a ceder a gestão de infraestruturas importantes, segundo uma cópia do contrato, à qual a AFP teve acesso.