Por Clare Byrne
Jaime Ortiz Marino, um entusiasta da bicicleta, liderou uma revolução há 50 anos. Ele é o criador da Ciclovia de Bogotá, uma alternativa ao uso do carro que inspirou o mundo.
A 15 de dezembro de 1974, o arquiteto obteve uma licença para realizar um protesto único contra a a supremacia do automóvel: fechar uma área da capital colombiana ao trânsito e percorrer de bicicleta o centro da cidade acompanhado de outras cinco mil pessoas.
O primeiro grande evento deste tipo no mundo rapidamente se transformou numa tradição popular de domingo, incluindo em Portugal, onde várias cidades organizam "domingos sem carros" ou iniciativas similares.
Segundo a Câmara Municipal, o evento foi replicado em cerca de 200 cidades em todo o mundo.
Todos os domingos, cerca de 1,7 milhões de habitantes de Bogotá caminham, pedalam, andam de patins ou praticam outras atividades físicas ao longo de 127 quilómetros de ruas livres de carros, de acordo com dados oficiais.
Os passeios de domingo são um alívio bem-vindo para os habitantes de uma das maiores metrópoles da América Latina, com um dos piores trânsitos da região e severamente afetada pela poluição atmosférica.
"A Ciclovia faz parte da alma de Bogotá", afirma Camilo Ramírez, um especialista em migração que corria com a sua esposa atrás dos filhos, de 5 e 12 anos, ambos a pedalar.
Uma "válvula de escape"
Da Cidade do México até Santiago e São Paulo, várias cidades latino-americanas implementaram programas semanais de ruas abertas nos últimos 20 anos.
Em 2024, a Ciclovia de Bogotá ajudou a reduzir o equivalente a 444 toneladas de CO2, de acordo com dados fornecidos à AFP.
Além disso, Ortiz descreve a Ciclovia como uma “válvula de escape” para a quarta maior cidade da América Latina, cuja população cresceu dez vezes nos últimos 50 anos, de 800 mil para oito milhões.
O crescimento populacional e o precário planeamento urbano tornaram Bogotá uma cidade com cada vez mais carros, mas com menos espaço para circular.
Das grandes cidades da região, Bogotá é a única que ainda não tem um metro, cuja construção está só a começar.
Em 2023, o Índice de Tráfego Urbano da TomTom classificou Bogotá como a segunda área metropolitana mais congestionada do mundo, a seguir a Manila.
Loucos por bicicletas
A terceira capital mais alta do mundo, a seguir a La Paz e Quito, pode parecer um local pouco favorável para iniciar uma revolução ciclística.
No entanto, a paixão dos colombianos pelo ciclismo remonta a várias gerações, alimentada pelos feitos de lendas como Luis “Lucho” Herrera, vencedor da Vuelta a España em 1987, e Egan Bernal, o primeiro latino-americano a vencer o Tour de France, em 2019.
Assim como os pais de muitos destes ídolos, na Colômbia, os camponeses e a classe trabalhadora utilizam bicicletas para ir trabalhar.
Antes da Ciclovia, “sabíamos que (...) na maioria das casas havia uma bicicleta”, mas não existiam espaços para pedalar, recorda Ortiz.
Atualmente, Bogotá conta com cerca de 600 quilómetros de ciclovias construídas exclusivamente para ciclistas.
Além de incentivar a prática de exercício físico e beneficiar o ambiente, a Ciclovia tornou-se também uma fonte de emprego num país onde 55% dos trabalhadores têm empregos informais.
"Aqui ganhei o que preciso para pagar os estudos da minha filha, o meu próprio bem-estar e a minha casa", afirma Eladio Gustavo Atis, um mecânico de 56 anos que há 32 anos repara furos e enche pneus para ciclistas.
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