Todos os anos, empresas russas de frete aéreo, proprietários de aeronaves sauditas ou outros pedem a Dan Streufert, fundador do site americano de rastreamento de voos ADS-B Exchange, que pare de publicar os seus movimentos. Sem sucesso.

"Não apagamos nada até à data. Esta é uma informação pública. E eu não quero ser o árbitro que decide quem está certo ou errado", diz Streufert.

Existem algumas limitações, mas grupos que traçam rotas de voo apontam que a fonte primária de informação está legalmente disponível e acessível a qualquer pessoa com o equipamento necessário.

A lei americana exige que as aeronaves em certas áreas sejam equipadas com o sistema de satélite ADS-B, que periodicamente transmite por rádio a posição da aeronave aos controladores de tráfego aéreo.

Um site como o Flightradar24 tem 34.000 receptores terrestres em todo o mundo que podem captar esses sinais, dados enviados para uma rede central que cruza com horários de voos e outras informações de aeronaves.

Mas identificar o dono de um avião é outra questão, segundo Jack Sweeney, de 19 anos e  criador da conta no Twitter "Celebrity Jets", que descobriu a aeronave particular de Elon Musk após um pedido de acesso à informação aos arquivos públicos do governo americano.

O patrão da Tesla ofereceu-lhe 5.000 dólares para apagar a conta "ElonJet", com mais de 480.000 assinantes, que acompanha todos os movimentos do avião do bilionário.

"Há muito interesse. Estou a fazer algo que funciona. As pessoas gostam de ver o que as celebridades estão a fazer", diz Sweeney à AFP, referindo-se à indignação com a pegada de carbono dos aviões.

Publicar este tipo de informação no Twitter torna "mais fácil para as pessoas acessá-la e entendê-la", acrescenta.

Bilionários irritam-se com monitorização online de voos privados
Bilionários irritam-se com monitorização online de voos privados In this illustration photo, the Flightradar24 app shows, via augmented reality, the live position of planes in the area, on a smartphone in Los Angeles, California, on August 5, 2022. - How to upset Russian freight companies, Elon Musk, Chinese authorities and Kylie Jenner in one go? Track their jets. Flight following websites and Twitter accounts offer real-time views of air traffic –- and sometimes major news like Nancy Pelosi's Taiwan trip –- but that exposure draws pushback ranging from complaints to gear seizures. (Photo by Chris Delmas / AFP) créditos: AFP or licensors

"Os dados estão aí"

Em julho, a conta 'Celebrity Jets' revelou que a estrela de reality show Kylie Jenner havia apanhado uma aeronave particular para um voo de 17 minutos para a Califórnia, o que causou alvoroço nas redes sociais.

"As celebridade dizem às pessoas da classe trabalhadora que nos devemos sentir culpados por causa do nosso voo anual de férias, enquanto estas celebridades andam em jatos particulares todos os dias como se fosse um Uber", twitou um utilizador.

Sweeney ou Streufert não veem uma linha vermelha que não gostariam de cruzar em relação à publicação de rotas aéreas. "Os dados já estão aí. Estou apenas a redistribuí-los", diz Jack Sweeney.

Esta atividade também gera lucro, mesmo que seja difícil de avaliar. Dan Streufert admite ganhar a vida desta maneira, mas se recusa a dar detalhes, enquanto Sweeney afirma que as contas de rastreamento de voos rendem-lhe cerca de 98 euros por mês.

A Flightradar24 não comunica o seu volume de negócios.

O rastreamento de voos também pode ter um grande impacto além da ira de celebridades e bilionários, como a controversa visita da presidente da Câmara de Representantes dos EUA, Nancy Pelosi, a Taiwan na terça-feira, cujo voo era seguido por mais de 700.000 pessoas no site Flightradar24 no momento que aterrava.

Em agosto, um relatório de uma ONG que acusa a agência europeia de vigilância de fronteiras, Frontex, de facilitar a expulsão de migrantes que tentavam a perigosa travessia do Mediterrâneo foi baseado em dados de sistemas ADS-B, assim como a media americana o usou para denunciar a presença de voos de vigilância durante manifestações antirracismo em Washington em 2020.

Dezenas de congressistas, após estas revelações, instaram numa carta o FBI e outras agências governamentais, como a Guarda Nacional, a "parar de monitorizar manifestantes pacíficos".

Em outras partes do mundo, governos já deixaram claro que tais tecnologias e dados não são bem-vindos.

A media estatal chinesa informou em 2021 que o governo havia apreendido centenas de receptores usados por sites de rastreamento de voos em tempo real, alegando um risco de "espionagem".

"Em muitos casos, são os regimes autoritários que não gostam deste tipo de visibilidade", diz Dan Streufert.