"É possível fazer mal uma baguete. Somos muito dependentes do tempo. Temos que medir a temperatura da massa, da água, do forno", explica o padeiro. O ideal é que haja calor - mas não mais do que 22ºC - e humidade - embora não muito -, ou o pão amolece.

Farinha, água, fermento e sal. A receita é simples, mas a arte é difícil para esta joia da gastronomia francesa tradicionalmente celebrada durante uma semana em maio (de 13 a 19 este ano).

Além dos gestos indispensáveis como bater a massa lentamente, uma longa fermentação, modelagem manual e cozedura em forno próprio, tudo é suportado no "savoir-faire" (saber-fazer), explicam os profissionais.

"O segredo de uma boa baguete: muito tempo e fermentação longa. A nossa baguete de tradição é misturada no dia anterior, permanece em descanso e, depois, fermentação por entre 18 e 24 horas com muito pouco fermento, o que permite desenvolver os sabores", explica Jean-Yves Boullier, da padaria Le Moulin de la Croix Nivert, em Paris.

A sua definição da baguete perfeita?: "Muito alveolada, crocante, com um miolo consistente e muito sabor".

Símbolo da França, a baguete é, no entanto, um produto relativamente recente e em constante evolução.

"A palavra baguete surgiu no início do século XX e tornou-se popular entre as duas guerras mundiais. No início, a baguete era considerada um produto de luxo, enquanto as classes populares comiam pães rústicos, que se conservam melhor. Então, generalizou-se o consumo, e a baguete chegou às zonas rurais nas décadas de 1960 e 1970", explicou à AFP Loïc Bienassis, do Instituto Europeu de História e Culturas Alimentares.

Em 1993, o "decreto pão" veio proteger os padeiros artesanais e impôs, ao mesmo tempo, condições muito estritas, tais como a proibição de aditivos.

Mudanças de hábitos

"Em 1988, quando comecei, não fazíamos baguetes no período da tarde. Em 1993, começamo-nos a questionar. Mudamos para competir com os supermercados", ressalta Jean-Yves Boullier, que agora faz baguetes todo o dia.

A baguete normal é vendida alguns centavos mais barata, mas, em questão de sabor, é "incomparável" com a "tradição".

"A 'baguete de tradição' é amassada numa velocidade mais baixa, o que não estraga a farinha", explica o padeiro.

"Eu levanto-me às 2h da manhã. Começamos a dividir as massas que preparamos no dia anterior até às 5h, colocamos na forma e, às 5h30, começamos a assar para a abertura às 6h30. Até às 9h, assamos 'baguetes' para as escolas e, em seguida, começamos a preparar as massas para o dia seguinte. O meu dia termina por volta das 13h30", explica.

Um ritmo que faz com que as padarias tenham sérios problemas em encontrar pessoal.

E, apesar do fato de que cerca de 6 mil milhões de baguetes saem a cada ano dos fornos franceses, este pão é ameaçado pela globalização e por mudanças nos hábitos alimentares.

"O consumo caiu acentuadamente nos últimos 10-15 anos", diz Jean-Yves Boullier, que aguarda com expectativa a entrada da baguete na lista de Património Imaterial da Humanidade.

Assim como no caso da carne, o consumo de baguetes tem diminuído entre as classes privilegiadas que optam por pães rústicos, mais interessantes do ponto de vista nutricional, de acordo com Loïc Bienassis.

"Os cereais têm substituído as torradas. Os adolescentes muitas vezes saltam o pequeno-almoço. Os hambúrgueres têm ultrapassado o tradicional pão com presunto e manteiga", explica o historiador, que faz parte do comité científico que prepara o caso para a Unesco.

O sociólogo da alimentação Eric Birlouez, membro do mesmo comité, insiste no poder do pão para tecer laços sociais.

"Doze milhões de franceses entram todos os dias numa padaria, um lugar agradável e acessível, onde se cruzam todas as gerações, onde chaves são deixadas, e crianças fazem as suas primeiras compras", ressalta.

Fonte: AFP