É uma tarde de novembro ensolarada, mas o frio já se faz sentir em Constância, onde viemos visitar o Borboletário Tropical. Mal a porta do pequeno edifício térreo se abre, o calor que escapa do seu interior transporta-nos para outra latitude. Os casacos parecem subitamente escusados e ficam quase todos pendurados num bengaleiro à entrada.
O ambiente lá dentro é mantido intencionalmente quente (entre os 20 e 30 graus centígrados) e húmido para recriar o clima das florestas tropicais onde vivem as 17 espécies de borboletas que ali esvoaçam entre flores e vegetação sempre viçosas, apesar dos tons amarelos e vermelhos do outono cá fora. Um mapa-mundo afixado na parede identifica as origens de cada borboleta, da América Central ao Sudeste Asiático. Ainda que sejam provenientes de pontos diferentes do globo, quase todas têm em comum a proximidade geográfica à linha do equador, onde beneficiam de 12 horas de exposição solar por dia.
Verão perpétuo
Onde os dias não ficam mais curtos ou frios, não há necessidade de migrar ou de reduzir a atividade. No mundo artificial do borboletário, onde faz um verão perpétuo, acaba por acontecer algo semelhante. "Simulamos o clima tropical, pelo que as nossas borboletas estão constantemente a reproduzir-se", explica-nos Tiago Lopes, coordenador do Parque Ambiental de Santa Margarida.
Ou seja, a quantidade de borboletas nesta recriação do equador depende mais do ciclo de vida das borboletas do que da altura do ano. Mesmo assim, há realidades, como o número de horas de sol, que nem os melhores simulacros conseguem contrariar. "Se tivermos 3 ou 4 dias muito nublados, as borboletas ficam mais paradas", conta o Tiago.
A borboleta que rouba o espetáculo
Qualquer uma das 17 espécies tropicais de borboletas que podem ser vistas em Constância é inconfundível na sua aparência exótica, mesmo a quem não está habituado a reparar nas borboletas mais comuns em Portugal. Ainda assim, há uma que se destaca, a avaliar pelo pasmo que suscita sem falha entre visitantes de todas as idades. O seu voo é imediatamente acompanhado de um coro coletivo de "uau".
Falamos da borboleta imperador (morpho peleides, no seu nome científico), originária da América Central e também conhecida como a "borboleta azul", devido ao espantoso tom iridescente das suas asas, que chama e retém o olhar, mesmo à distância. O efeito, difícil de registar numa fotografia, é tanto mais hipnótico quanto a borboleta parece desaparecer em pleno voo à medida que abre e fecha as suas asas.
Sob qualquer perspetiva, trata-se de uma borboleta vistosa, podendo atingir uns consideráveis 20 centímetros de envergadura. Para escapar à atenção indesejada dos predadores, guarda o seu belo tom de azul para si ao pousar e recorre à camuflagem no lado exterior das suas asas, com padrões em tons avermelhados que lembram pequenos olhos. "Mesmo fechada é espetacular", comenta o Tiago, enquanto observamos um exemplar a descansar no tronco de uma árvore.
No seu meio natural, nas florestas que vão do México ao Paraguai, pode ser vista a pairar flores, mas apenas para repousar. Ao contrário da maioria das borboletas, prefere alimentar-se de frutos apodrecidos (daí os pratos de fruta espalhados pelo espaço do borboletário) e até da seiva de árvores.
Um jardim de flores voadoras
Inaugurado em 2013, como forma de dinamizar o parque ambiental no qual está integrado (que vale a pena explorar com tempo), o Borboletário Tropical já parece ocupar um lugar próprio na identidade da região, além de inspirar as mais belas descrições.
Aqui mesmo, no SAPO Viagens, já foi descrito magistralmente como uma "maternidade de surpresas". O escritor José Luís Peixoto também não resistiu ao seu fascínio e dedicou-lhe uma passagem no seu mais recente livro ("Onde"), feito de alguns dos seus lugares prediletos. "As borboletas são flores que voam", escreve a certa altura.
Para os responsáveis pelo borboletário, assistir ao deslumbramento dos visitantes é a melhor parte do seu trabalho. Isso fica evidente nas visitas guiadas que promovem ao espaço (e só para este artigo, assistimos a três, em diferentes estações do ano) e na preocupação que revelam com o bem-estar das "flores" que lá esvoaçam.
"Estou cá desde o início", diz o Tiago, "e na altura mal pensava que íamos ter um borboletário. Deu-nos assim um friozinho no estômago, porque percebemos que era uma coisa que implicava muito trabalho e conhecimento cientifico. Não havia ninguém especializado nestas borboletas no país, e isso obrigou-nos a aprender, a estudar", conta.
Uma das lições que aprenderam reflete-se na forma como as visitas de 45 minutos são conduzidas, com reserva obrigatória (as marcações podem ser feitas no próprio dia, por e-mail ou telefone).
"Experimentámos primeiro um modelo mais livre e chegámos à conclusão que não resultava", explica o coordenador. O fator decisivo foi a constatação de que à segunda-feira morriam sempre mais borboletas. "Tínhamos mais mortalidade do que nos outros dias. Começamos a associá-la à agitação social que se dava no fim-de-semana".
Essa realização levou a reduzir os grupos de visitantes (12 por hora) e a distribui-los ao longo do dia. "Algumas pessoas podem achar a introdução chata, porque querem tirar a fotografia à borboleta e meter no facebook, mas a maioria acaba por nos dar os parabéns pela visita ser acompanhada", garante o Tiago.
Como visitar
O Borboletário Tropical encerra à segunda-feira e em certos feriados. As entradas são feitas ao início das horas de maior exposição solar, entre as 11h e a 16h (exceto às 13h), e o número de visitantes por entrada é limitado a 12 pessoas, pelo que é necessário fazer reserva antecipada (o bilhete tem que ser adquirido até 15 minutos antes da hora de entrada). Cada visita tem a duração de 45 minutos e é acompanhada por um guia. O preço da entrada para adultos é de 2,50€, com descontos para crianças e seniores.
Contactos e mais informações na página da Câmara Municipal de Constância.
Comentários