Linhares, Aldeia Histórica de Portugal, vive a cerca de 800 metros de altura, ponto extremo atingido no castelo. Os primórdios da localidade remontam ao século XII, quando em 1169 D. Afonso Henriques cedeu o foral a Linhares da Beira. Construída em pedra, material comum nesta região pedregosa da Beira Interior, Linhares é lugar que pede percurso a pé, olhar detendo-se na arquitetura medieval, mas também manuelina, data do século XVI, uma fase de crescimento da aldeia.

Nas ruas estreitas, algumas de inclinação sinuosa, as janelas ricamente ornamentadas são as protagonistas. Em locais como a Rua Direita, o Largo da Misericórdia, o Largo do Pelourinho há janelas adornadas que revelam o gosto de quem outrora por ali espreitou. Encontram-se ornamentações manuelinas e renascentistas. Arabescos simples com inspiração na natureza, pequenas esferas esculpidas na pedra emolduram a janela, outras apenas a parte superior é trabalhada.

As janelas ornamentadas de Linhares da Beira
créditos: DR

O hábito de decorar a janela, emoldurando-a, perde-se no tempo. Inicialmente, era uma característica que apenas a instituição religiosa podia usar. É a partir do século XVI que se generaliza este costume, chegando assim a edifícios profanos. Uma prática que revelava novas conceções de vida no sentido de uma arte ao serviço do Homem.

A aldeia, em bom estado de conservação, pede vagar para ser visitada e apreciada. Além do espetáculo protagonizado pelas janelas, há mimosas fontes, e a intimista judiaria. Descobertas que deixamos para depois do almoço. Os ponteiros do relógio já vão adiantados. Marcam 13h00 e nas ruas há mais algum movimento. Meia dúzia de turistas procuram um local para saborear a gastronomia local. Em Linhares da Beira há poucas lojas e cafés. No Largo da Igreja, mesmo por detrás do castelo, sentamo-nos à mesa do restaurante Cova da Loba. A gastronomia tradicional cruza-se com a contemporaneidade do espaço e apresentação dos pratos.

O restaurante está aberto desde 2010 e foi buscar o nome a uma lenda local. A lenda da Loba que “vivia nos bosques das redondezas, uma loba, outrora humana, de seu nome D. Lopa, que tinha sido uma dama cruel e dissoluta. D. Lopa vivia com uma empregada que encorajava aquela forma de ser. Um dia, Santo António assegura à senhora que a criada era o Demónio que a tentava. Podia prová-lo se espalhasse cinza aos pés da cama da mulher. A dama assim fez. No dia seguinte, D. Lopa viu as marcas dos pés de uma cabra aos pés da cama e expulsou a criada, que foi rebentar junto a uma figueira. O espirituoso santo acabou por converter D. Lopa numa loba, por afinidade ao nome, concedendo-lhe uma longa vida, com a condição desta prestar o secreto serviço de trazer à sua terra os melhores frutos dos bosques das serras, e assim compensar os conterrâneos da inconsciente cumplicidade de outrora com Satanás, que a sua consciência não libertou”.

As janelas ornamentadas de Linhares da Beira
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Voltamos à rua e rumamos ao castelo, situado num terreno desnivelado e rochoso. A fortificação tem duas torres (a do relógio e a de menagem), quatro portas e duas cisternas. Em torno, a paisagem é montanhosa com solos férteis e abundantes em água. O verde predomina nestas paragens beirãs, destacando-se a existência de pinheiros bravos, carvalhal, castanheiros, mas também a amarela giesta das serras e o sargaço, espécies que nascem em pequenas clareiras abertas no meio florestal seja pelo corte seja pelo fogo. A água destas terras que se avistam do castelo chega à aldeia e corre por três fontes datadas dos séculos XII, XVI e XIX.

A aldeia vive da sua história de lendas e janelas ornamentadas, que denunciam ter pertencido a famílias abastadas. O lugar não ficou, no entanto, parado no tempo. Abre-se a novos conceitos, como desportos radicais. Linhares da Beira é já considerada a “catedral do parapente”, um desporto que consiste em voar, apoiado numa estrutura semelhante a um para-quedas aberto, após lançamento de uma zona alta. A aldeia recebe o Festival de Parapente e vê os céus ficarem coloridos repletos destas “asas” artificiais que satisfazem o velho sonho humano de voar.

As janelas ornamentadas de Linhares da Beira
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