Por: Miguel Marques 

Chichén Itzá, uma das “7 maravilhas do mundo”, estava fora da lista das “maravilhas da minha viagem”. É que, quando planeei a minha viagem do México até à Patagónia, pensei em dar preferência a sítios menos conhecidos, fora do radar do grande turismo, de forma a tornar a viagem diferente de muitas outras e mais ao meu gosto. E isto não significa que não goste de pessoas, adoro, mas, para mim, é extremamente aborrecido estar no meio de uma multidão em certo local só porque está na moda.

Sabia de antemão a confusão que me esperava e que encontrar ruínas Maias, igualmente bonitas, mais baratas e dignas de uma visita da minha parte, não iria ser um desafio no México. E mais: acho isso das "7 Maravilhas do Mundo" uma – desculpem-me o termo –, palhaçada. Bem, acontece que, ao mesmo tempo que delineei esta 'regra' no meu plano, decidi seguir uma outra que é contraditória e que diz que, "caso tenha que alterar o que foi planeado por algum motivo, assim o farei, porque o plano nunca será 100% fixo" pois, como dizia o outro, "não sejas tão duro contigo mesmo".

Quando se viaja sozinho acaba-se, inevitavelmente,  por conhecer pessoas. Locais e outros viajantes. Assim sendo, acabei por conhecer, mal cheguei à minha primeira paragem, na vila de Valladolid, uma viajante alemã. Chamava-se Jenny e, após andar cerca de um ano a viajar pelo Canadá, tinha decidido passar duas semanas no México antes de regressar à Alemanha.  Deste modo, iria voltar para casa com um bronze invejável.

Chichén Itzá
Chichén Itzá créditos: Miguel Marques

Em conversa com a Jenny, surgiu o tema do que ainda estava por visitar por parte dela na zona onde estávamos. Eu ainda não tinha visto nada e tinha alugado uma scooter para me mover por Valladolid mais facilmente. Pensei que seria bom dividir os custos da mesma e, por isso, ofereci os meus serviços de “chauffeur”. Assim, poderia também, ao mesmo tempo, explorar um pouco mais do México. É certo que não conhecia a Jenny, mas senti que ela poderia ser uma boa companhia.

Vieram então as palavras que mais temia da boca da Jenny: "um sítio que gostava mesmo de visitar e acho que poderia ser engraçado irmos juntos, era a cidade Maia de Chichén Itzá. Podemos até depois ir a mais algum lado ao redor da cidade, o que dizes?” Gelei! Olhando para trás, coloquei-me, de forma ingénua, entre a espada e a parede. Naquele momento, tinha a minha intuição a dizer-me, como sempre, "não vás a Chichén Itzá", contudo, estava a pesar também o facto de ser um dos desejos da viajante que iria embora em breve e de eu poder ajudar a concretizá-lo. Para além disso, aqui o Miguel é, e sempre será, um coração mole em busca de ajudar os outros. "Ok" disse eu. Siga viagem para Chichén Itzá.

Acordámos cedo no dia seguinte para irmos então visitar um lugar sagrado. Pensávamos nós. Tudo começou a fazer o meu arrependimento crescer desde que cheguei ao local. E este veio por tranches. A primeira tranche de arrependimento chegou ao ver o preço do bilhete. Da minha rica carteira saiu logo à chegada a módica quantia de 55 euros – e eu só pensava: 'tantos tacos que é possível comer com esse dinheiro'. É certo que tinha um almoço incluído, do qual não estava à procura, mas esse valor nem sequer um guia turístico incluía. Eu já tinha visto uns quantos documentários ao longo da vida acerca daquele local e, no mês antes da viagem, voltei a rever uns dois ou três.  À Jenny, também não interessava ter guia. No entanto, pensava em alguém que, se quisesse de facto conhecer o local e a história pela primeira vez, iria largar à partida uma quantia gigante de dinheiro. Não estou certo de quanto, mas sei que o preço do guia no local varia imenso, sem qualquer razão aparente para isso. Deverá custar, pelo menos, uns 80/90€.

Chichén Itzá
Chichén Itzá créditos: Miguel Marques

Segunda tranche (gigante) de arrependimento a caminho (Miguelito, prepara-te). Estava contente porque ao ter comprado o bilhete num outro local, que não na entrada principal, poderia evitar estar na fila (cerca de meia hora) e entrar diretamente. Ao passar por essa fila de sorriso na boca, veio o controlo dos bilhetes e, logo a seguir, o controlo daquilo que levava dentro da mochila. Não estou certo, mas acho que o karma entrou algures na equação aqui e eu nem dei conta. E agora vem uma das coisas mais incríveis e sem sentido que alguma vez vi na vida. Tinha na minha posse um drone, uma máquina fotográfica, um telefone com duas câmaras e, por fim, uma action camera estilo go-pro. Diz-me o segurança, "desculpe, porque tem uma action camera consigo, terá de pagar uma taxa adicional de 2.5€ para entrar com a mesma e poder filmar. E para o fazer terá de ir para a fila onde se compram os bilhetes de entrada". A sério, passou-me pela cabeça ligar para a polícia e denunciar este escândalo! Então, mas o telemóvel e a máquina fotográfica não filmam também? Não consigo ainda hoje obter respostas e já pensei em milhentas razões que poderiam fazer sentido, mas sempre sem sucesso. Aquilo que mais queria era estar numa fila por cerca de meia hora para adquirir um bilhete, rodeado de turistas, num calor abafador e com guias a gritarem, literalmente, "tour para Chichén Itzá, tour para Chichén Itzá" a um metro dos meus ouvidos. Mas tinha de ser. A Jenny já tinha passado e já estava do lado de dentro a questionar-se certamente se eu seria uma boa companhia por ter sido barrado pela segurança.

Esta última parte, a dos berros, creio ser a preparação para a terceira tranche de arrependimento.

Vamos então eternizar esta terceira e última tranche de arrependimento. Depois de usufruir de todo este momento, entrei destinado a fazer um verdadeiro filme ao estilo de Hollywood com a minha câmara para fazer valer o bilhete. Desilusão. O filme já estava a rodar lá dentro há muito tempo e era o de uma autêntica feira popular mexicana (se é que isso existe).  Bancas, e mais bancas, e mais bancas a vender souvenirs (os mesmo souvenirs!) por todo o lado, e os seus vendedores a fazerem a mesma pergunta ao Miguel, se queria comprar algo por apenas 1$. Literalmente, dois vendedores, um espaço de um metro entre os dois, digo que "não, muito obrigado" ao primeiro e o segundo, a olhar para mim, pergunta-me exatamente a mesma coisa. E mais, a seguir a mim estavam outras centenas de turistas aos quais era feita a mesma pergunta. Saí de lá com um nome magnífico para uma tour. "Um passeio por Chichén Itzá ao som de 'only one dolar'". Era capaz de vender não?

Jenny
Jenny créditos: Miguel Marques

É demais para mim. Deixa-me profundamente triste que um local que se diz sagrado tenha sido transformado num negócio onde todos os turistas que o visitam são vistos como um saco de dinheiro. Acredito piamente que o facto de ser uma das 7 maravilhas matou o encanto de Chixhem Itza. Não senti qualquer tipo de empatia por parte das pessoas de Chichén Itzá, a não ser quando me venderam o bilhete de entrada (porque seria?).

O local em si e a arquitectura das estruturas da cidade são de uma beleza de outro mundo! A história por detrás de tudo é de uma importância inigualável para se perceber o mundo Maia. A experiência como visitante, uma valente desilusão.

Visitei até agora as ruínas de Uxmal, Edzna, Izamal e Comalcalco. Em nenhuma delas, repito, nenhuma, havia stands de souvenirs dentro do local e, os que havia fora, eram poucos ou nenhuns. Pouquíssimos eram também o número de turistas em todas elas. Os preços de entrada (22€, 4€, 0€, 0€) fazem muito mais sentido, e aqui o Miguel até acha que Uxmal e Edzna são cidades Maias mais bonitas que Chichen Itza. A história destes locais, por ser distinta, não entra na equação aqui.

Chichén Itzá
Miguel Marques créditos: Miguel Marques

Enfim, não consigo, por muito que queira, recomendar Chichén Itzá a ninguém, e creio que a Jenny também não o irá fazer, sem que haja um gigante "vai, mas...". Irei obviamente fazer ver que, em comparação com outras cidades Maias na mesma zona, e vendo o bolo final, Chichén Itzá não vale a pena. No entanto, se alguém se sente bem em ambiente de feira num local sagrado é ir. Vão adorar!

Ai bolas, quase me ia esquecendo da única coisa positiva da experiência: Observar em meia hora as centenas de pessoas que tiravam fotos ao estilo Instagram em frente a "el Castillo", saltando, rodopiando e deitando-se na relva, ao sol, em plenos 35°.

Sem dúvida que, no final, e tudo resumido, até que foi uma boa comédia e faz parte desta aventura.

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