Não podia acreditar na minha sorte: à porta da estação ferroviária de Sintra, o autocarro da carreira 434 da Scotturb já esperava, vazio, os primeiros passageiros até ao Palácio Nacional da Pena. Sem o saber, seria o primeiro e único momento de sorte dessa manhã dedicada a visitar a “joia de Sintra”.
O Palácio Nacional da Pena é um dos monumentos nacionais mais reconhecíveis do país, não só devido ao jogo de cores do seu edifício, entre o amarelo e o vermelho borgonha, mas também à sua posição no topo do Monte da Pena, de onde é visível em praticamente toda a região em redor.
Nunca tinha visitado este ex-líbris de Sintra, pelo que no passado fim-de-semana decidi tirar partido da gratuitidade aos domingos que foi alargada este ano a todos os residentes em território nacional (um bilhete normal, para o Palácio e parque envolvente, custa atualmente 20€).
09h40: Chegada a Sintra
Já vinha avisado para as enchentes de domingo, e para os condicionamentos de trânsito existentes, pelo que optei por usar apenas transportes públicos. Às 09h50, o meu autocarro partia da estação de comboios em direção ao monumento nacional e logo ali já se notava que estávamos num sistema habituado a gerir grandes fluxos de visitantes. Por exemplo, apesar do grande número de turistas estrangeiros, a entrada no autocarro fez-se de forma bastante ordeira, com o motorista auxiliado por dois assistentes, um para vender e o outro para validar os bilhetes a quem não possuía título de transporte válido (o Navegante Metropolitano é aceite aqui). O percurso durou 20 minutos, com apenas uma paragem pelo caminho, junto ao Castelo dos Mouros (outro ponto de interesse da zona).
À chegada, já era visível uma grande fila para a bilheteira, cujo tamanho não me desanimou, sobretudo porque não contava com o tempo de espera: exatamente 1 hora. Dada a gratuitidade, seria de supor que a entrega dos bilhetes pudesse ser acelerada, mas é preciso lembrar que os turistas não-residentes continuam a ter de pagar bilhete. E embora existam bilheteiras automáticas no local para separar as duas categorias de visitantes, a verificação dos documentos de tanta gente é, inevitavelmente, demorada.
11h20: Bilhete na mão
Às 11h20, tinha finalmente o meu bilhete na mão, mas não sem antes receber uma informação desencorajadora: depois de uma hora de espera na bilheteira, só seria possível iniciar a minha visita ao Palácio a partir das 12h30, isto porque vigora um sistema de acesso por turnos horários. A informação está bastante visível no site e no próprio local, mas mais uma vez a gratuitidade fazia pensar (com um bocadinho de wishful thinking meu) que, ao domingo, as regras podiam ser aliviadas. Como iria descobrir mais à frente, ainda bem que não foram.
Embora o Palácio estivesse interdito por agora, já era possível aceder ao parque envolvente, ele próprio um motivo mais do que suficiente para justificar a visita. São 85 hectares de caminhos sinuosos para percorrer entre árvores centenárias, oriundas de várias partes do mundo, com destaque para as coleções de camélias asiáticas, introduzidas por D. Fernando II. Uma hora não pareceu suficiente para explorar este fantástico arboreto e sei que vou querer regressar para apreciá-lo com mais calma.
Para piorar a consciência da minha falta de preparação, dei por mim sem água nem snacks para passar o tempo até à hora da entrada no Palácio. Felizmente, existe uma cafetaria a funcionar no local. Infelizmente, não fui o único a ser apanhado desprevenido pelas condições da visita, e juntei-me, assim, à segunda fila da manhã.
12h30: Início da visita ao Palácio
Depois de recuperar energias, foi a vez de me juntar - já adivinharam - à terceira fila da manhã. É verdade, mesmo com um sistema de entradas por horário (que alguns procuraram furar, sem sucesso), não é possível visitar o monumento sem integrar uma longa fila de visitantes, do início ao fim da visita. O interior do Palácio, formado por pequenas divisões que conservam algum do luxo e conforto de que os seus moradores reais beneficiaram na segunda metade do século XIX, é simplesmente demasiado exíguo e labiríntico para ser visitado de outra forma com um número tão grande de visitantes.
“Todos os domingos é assim”, dizia-me um funcionário do monumento a quem mencionei a situação. “E a partir de março, é durante a semana toda”, afiançou.
Não há soluções perfeitas para a pressão turística
Como se balança o direito a usufruir do património nacional com a obrigação de conservar esse mesmo património e garantir as melhores condições possíveis de visita? Em Sintra, essa responsabilidade está a cargo da Parques de Sintra, a quem contactei, depois da minha visita, para obter a sua perspetiva sobre o tema.
A empresa pública partilhou comigo alguns dados sobre a forma como está empenhada em encontrar o equilíbrio certo entre conservação e fruição. Nesse sentido, começa por referir a implementação de um sistema de bilhética que distribui as visitas ao Palácio da Pena por diferentes horas e estabelece um limite diário de entradas, apesar da "considerável" perda de receita que isso implica.
Para reforçar a ideia de como efetivamente reduziu o número de visitas ao monumento, a empresa indica que o palácio chegou a ter 12 mil visitas por dia em 2019, algo que atualmente deixou de ser possível. De acordo com os dados, o novo modelo de entradas reduziu o potencial de visitação em 62% face a 2019.
Por reconhecer que os preços normais dos bilhetes podem não estar ao alcance de todos, a Parques de Sintra considerou fundamental encontrar formas de garantir o acesso aos monumentos sob a sua gestão, daí a gratuitidade aos domingos. Todavia, a empresa faz questão de sublinhar que esta medida não aumenta a pressão sobre o monumento nacional, uma vez que os bilhetes continuam integrados no sistema de "slots horários" e que o limite diário previamente estabelecido não pode ser ultrapassado, independentemente do bilhete ser pago ou gratuito.
Por último, a Parques de Sintra garante continuar atenta a alterações e melhorias que possam ser feitas. Nesse sentido, informa que no final do próximo mês de maio, o Palácio Nacional da Pena irá passar a ter um novo "Welcome Center", que implicará "uma profunda reorganização da entrada do monumento". Vão deixar de existir as atuais bilheteiras físicas e será reforçada a informação aos visitantes.
Além da importância de todas estas medidas, é preciso ainda reconhecer a atenção e o profissionalismo dos funcionários do Palácio Nacional da Pena, que primaram pela cortesia e eficiência ao longo das diferentes fases da visita. Notou-se o seu esforço para ajudar a encaminhar os visitantes e assim reduzir os tempos de espera.
Ainda assim, não invejo as escolhas difíceis que confrontam a Parques de Sintra e outros visitantes que estejam a considerar tirar partido da gratuitidade. Por um lado, é evidente que o público residente tem vontade e curiosidade para ficar a conhecer a joia de Sintra. Por outro, é difícil recomendar a minha experiência deste domingo a qualquer outro tipo de visitante, seja a pagar ou não.
Conselhos para visitar
Aliviar a pressão turística é uma responsabilidade que toca a todos. Se quiserem tentar, mesmo assim, uma visita ao domingo, há algumas coisas que podem fazer para planear melhor a vossa visita. Para começar, não façam como eu e cheguem cedo. É possível que evitem a maior afluência a meio da manhã. Além disso, ganham tempo para explorar com mais atenção o Parque da Pena.
Depois, usem os transportes públicos. Passei uma hora no exterior da bilheteira e posso confirmar que a frequência dos autocarros é bastante alta. Ao nível da acessibilidade, importa ainda salientar que o Parque da Pena dispõe de um mini-bus que percorre os 500 metros entre a entrada do recinto e o edifício do Palácio (a viagem é paga e podem pedir o bilhete logo na bilheteira).
Levem água e alguns snacks para enganar a fome enquanto esperam ou passeiam pelo parque. Aos domingos, a cafetaria é simplesmente demasiado pequena para a procura. Não é culpa de ninguém, mas assim já vão preparados.
Preparem antecipadamente os documentos de residência (no meu caso, bastou apresentar o Cartão de Cidadão) e sejam pontuais. Tal como a Parque de Sintra refere várias vezes na sua comunicação com o público, a visita ao interior do Palácio acontece apenas com data e hora marcada, indicadas no bilhete (seja pago ou não), sendo que "não existe tolerância de atraso". Para mais informações, consultem a página oficial do monumento.
Por fim, se as filas de domingo simplesmente não forem para vocês, ainda têm outra opção que vos pode poupar alguns euros. Também desde o início do ano, a Parques de Sintra passou aplicar um desconto de 15% em todos os bilhetes no caso de compra antecipada. São 3 euros a menos (num bilhete normal) que podem fazer a diferença.
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