O carro atravessa o percurso sinuoso da Estrada Nacional 4, algures no troço entre o Vimieiro e Arraiolos. É domingo. Os ciclistas que pedalam em grupo junto à linha que separa a berma, da estrada, revelam ser um obstáculo para os condutores. Enquanto passageiro, a minha mente abstrai-se dos problemas que quem segura o volante tem pela frente. Passo o fim de semana em revista à procura de um momento que mereça a oportunidade de estar em destaque no título da crónica sobre a minha mais recente viagem.

Falta a paragem em Arraiolos. Visitei aquele que é um dos únicos castelos circulares do Mundo. Foi D. Dinis quem o mandou construir. Primeiro, tive de subir as estreitas e inclinadas ruas empedradas. E encontrar um lugar para estacionar. As pessoas na rua eram poucas. Não vi nenhum Tapete de Arraiolos. Na verdade, não procurei. O tempo era limitado. Mas acabei a descobrir que a sua origem terá sido da responsabilidade dos tapeteiros muçulmanos expulsos de Lisboa por D. Manuel, em 1496.

A passagem por Arraiolos previa-se curta. Não seria justo ficar com o título desta crónica, quando foi em Estremoz que paguei para passar a noite anterior. O hotel era peculiar. Um edifício antigo, mas bonito. A entrada faz-se pelo café. As mesas estão cheias. Pedem-se as primeiras cervejas. Pelo menos, as primeiras que vi. Os estremocenses preparam-se para o jogo de logo à noite entre o Sporting e o Guimarães. Ao meu lado, junto ao balcão, conversa-se sobre chocolates. E diabetes. O senhor que se ocupava de servir os pratos finalmente dá-me a devida atenção. Pergunta o nome das duas pessoas que têm reserva no hotel. “Ficam no quarto 208”, diz-nos. Enquanto me dirijo para a porta, reparo num papel colado à parede. “Há gambas há guilho”, lê-se. Assim mesmo. Mal escrito.

Subo as escadas em direção ao quarto e à medida que me afasto do café o som é amortecido pelas paredes. A cama é de casal. No topo, o brasão de Portugal. Há uma pequena varanda com vista para o Rossio. Aprecio o pôr do sol. Volto para dentro e deito-me. O som do alarme de incêndio agita os hóspedes. Rapidamente se percebe que não aconteceu nada e rapidamente perco a oportunidade de dar um título sensacionalista à minha crónica.

À noite faço o caminho a pé até ao Teatro Bernardim Ribeiro. Vou assistir a um espetáculo. Peço os bilhetes. Não há lugares marcados. É como no autocarro. Um aglomerado de pessoas reúne-se na entrada do edifício para conseguir sentar-se ao pé da sua companhia. Estou incluído nesse grupo. Queixo-me do calor. Algures ao pé de mim fala-se do quão difícil é tratar dos papéis da pensão social. As portas da sala abrem-se. O calor e a pensão social passam para segundo plano.

Permaneço na Estrada Nacional 4. Uma placa informativa diz-me que estou a poucos quilómetros da saída para Arraiolos. Continuo sem título. Mais à frente surge um sinal que indica “Perigo Sapos”. Nunca o vira antes. O meu olhar redobrou a atenção sobre a estrada na esperança de encontrar uma rã. Sem sucesso. Percebi depois que só existem dois sinais deste tipo em Portugal. Um na EN 4 e outro na EN 114. Entretanto, já tenho título. Volto a observar o que me rodeia. Procuro agora um novo pretexto para que um fim de semana como este se possa repetir num futuro próximo. Enquanto aguardo, resta-me recomendar uma viagem pela Estrada Nacional 4. A paisagem é boa. E talvez encontrem os sapos que eu não vi.