Passar um fim de semana na região do Pinhal Interior Sul pode valer uma série de carimbos no passaporte da Estrada Nacional 2. Pode, acima de tudo, representar um conjunto de experiências únicas, à distância de uma A13, do sul ou do norte de Portugal.
Comecemos por situar-nos no mapa. A região do Pinhal Interior Sul agrega os concelhos de Vila de Rei, Mação, Proença-a-Nova, Oleiros e Sertã. Um extenso território onde o verde florestal e o azul fluvial imperam, com paisagens de uma beleza indescritível e um punhado de experiências e atividades à espera de serem reveladas.
Numa região fustigada pelos incêndios, pela desertificação e pelo envelhecimento, perceber que há uma população ativa que se ergue e que não baixa os braços, que rema contra a corrente e dá voz a uma terra que tanto tem para oferecer é, por si só, louvável. Mais do que isso, a região reaviva-se por pessoas que abrem as portas das suas casas e acolhem como se a hospitalidade fosse inata.
São vilas e aldeias com tanto para contar que não chegam as palavras. A natureza, o património, a gastronomia e a história dão-lhes voz e bradam por um reconhecimento que tarda em chegar. Não por vaidade, mas por orgulho - mais do que - justificado, pelas potencialidades ímpares do território, em inúmeras vertentes.
Passear pelas ruas e vielas dessas aldeias e vilas e conhecer a região é uma diminuta retribuição perante o tanto que se recebe. Partimos com uma bagagem recheada de memórias, um palato apurado e histórias que havemos de contar e lembrar. Partimos com a certeza de que os que ficam hão-de cuidar da região e continuarão a promovê-la, para que outros a possam conhecer ou para que possamos voltar. Porque uma nova viagem, ainda que ao mesmo lugar, é sempre (inexplicavelmente) um segredo por desvendar.
Não sendo este um roteiro único, ou sequer perfeito, das muitas atividades, rotas, trilhos e demais experiências, que o Pinhal Interior Sul tem para oferecer, ficam algumas sugestões que poderão tornar os dias na região mais preenchidos e mais gratificantes. Vamos?
Vila de Rei
Vila de Rei acolhe o centro geodésico e o museu da geodesia. A rede geodésica em Portugal é composta por mais de 8000 pontos geodésicos. Para os mais distraídos (como eu), a geodésia é usada para triangulação, prevenção e segurança, demarcação de território, geolocalização, entre outras valências. O que importa sublinhar, neste caso, é que se dobrarmos o mapa de Portugal em quatro, o centro geodésico de Vila de Rei é o centro do território, o quilómetro zero do país. Estar no «centro do Mundo» dá-nos uma sensação de inesperada invencibilidade, de quem percebe que tudo começa e culmina ali.
Para os caminhantes da Estrada Nacional 2, este é também o quilómetro central da rota. Portanto, em algum momento hão-de estar no centro, do centro de Portugal.
Do quilómetro zero aos mais de 500 metros de altitude, vamos até ao Miradouro de Fernandaires, com passadiços e terraço sobre os rochedos. Somos agraciados com uma deslumbrante vista sobre a Albufeira de Castelo do Bode e a praia fluvial de Fernandaires, que convida a banhos e atividades náuticas. Ar puro, beleza paisagística e mergulhos é quanto basta. Ou talvez não. Isto porque, “ali ao lado”, o rio Zaboeira seduz-nos com igual convite e não há como recusar.
É precisamente na Zaboeira que conhecemos a Rute Marta e a Joana Leitão, duas mulheres inspiradoras que nos fazem acreditar que a realidade pode ser um sonho, quando não tememos rumar ao desconhecido. Proprietárias do alojamento local “Zab living” e da empresa de eventos “Wake With Girls”, deixaram para trás a radiologia e a gestão, para se dedicarem ao turismo na Zaboeira. Com diferentes propostas náuticas, desde o wakesurf e wakeboard ao cable e passeios de barco, entre outras atividades por rotas e trilhos da região, a energia e boa-onda das WWG são contagiantes e paradigmáticas. Sonhamos abraçar um pouco do seu mundo, o que torna a experiência memorável.
Mação
Mação é a “catedral do presunto”, diz-nos Ana Filipa, da Amarmação, Associação de Desenvolvimento do Concelho de Mação. Não temos porque não acreditar, mas nada como um tira-teimas para aquietar as papilas gustativas.
Um passeio pelo Miradouro da Serra do Bando dos Santos, onde se avistam as portas de Ródão, por entre uma paisagem verdejante, um baloiçar pueril e uma visita ao Parque de Merendas de Chão do Brejo, um espaço totalmente equipado, que recebe imensos veraneantes e campistas, nos meses de calor, são pontos de paragem obrigatória em Mação.
Remata-se a viagem com uma visita ao Museu de Arte pré-histórica e uma incursão pelo ArqueoParque, para, nas voltas do tempo, perceber (ou tentar) como chegamos aqui.
Proença-a-Nova
O tanto que Proença-a-Nova tem para oferecer não cabe nestas linhas. Podemos começar pela Torre de Vigia, com assinatura de Siza Vieira, e terminar a degustar um chá de perpétuas roxas, fruto da marca “é capaz”, do projeto de inclusão social Bioaromas, no Centro de Ciência Viva da Floresta (CCVF). O centro oferece uma exposição interativa sobre a floresta, com curiosidades e atividades que valem a pena conhecer.
Avista-se, do CCVF, o Aeródromo das Moitas, para onde seguimos, impelidos pela Sky Fun Center, centro de paraquedismo. A empresa promove saltos tandem e cursos de paraquedismo. O primeiro salto de para-quedas é, porventura, a experiência inigualável que o viajante poderá riscar na sua lista, depois de voar por Proença-a-Nova.
Com os pés bem assentes no chão, passeamos pela Aldeia de Xisto da Figueira. Somos recebidos pela Joana Pereira, proprietária do restaurante Casa Ti’Augusta e anfitriã exímia, que nos guia pelas vielas da aldeia, do reabilitado forno comunitário até ao novo atelier, onde aprendemos a fazer tigelada. Havemos de provar o resultado da “empreitada” à sobremesa e trazer a receita connosco. Se é verdade que os sabores devolvem-nos memórias, traremos, com uma réstia de sorte, um pouco da Figueira até casa, sempre que levarmos a tigela de barro ao forno.
Oleiros
Outro concelho do Pinhal Interior Sul que nos maravilha, a cada visita. Podemos (e devemos) voltar e, ainda assim, seremos surpreendidos pela generosidade com que somos recebidos e pelas paisagens que nos cercam, até onde a vista alcança.
Com inauguração prevista a 25 de abril, o Miradouro do Zebro, no Estreito, projeto assinado pelo arquitecto Siza Vieira é uma construção imponente, com uma base em betão suspensa sobre a rocha, com duas placas circulares em vidro, que permitem avistar os cerca de 200 metros que nos separam do sopé da montanha. Acresce a paisagem envolvente, digna de um “postal ilustrado” e cria-se a receita perfeita, para um pôr de sol memorável. A título de curiosidade, o zebro era uma espécie de cavalo selvagem que viveu por ali até ao século XVI.
Memorável também são as escadas que nos levam até ao fundo da Cascata da Fraga de Água d’Alta, no Orvalho. O lugar transborda magia, com o sol refletido na cascata e o som da água que corre. Para os mais aventureiros, o passadiço de Orvalho, com cerca de 9 km, num circuito não circular, é o convite perfeito para explorar a natureza envolvente.
Outro ponto digno de visita é o Miradouro de Cabeço Mosqueiro, um espaço amplo, com parque de merendas, ideal para um fim de tarde soalheiro, com vista para a Serra do Açor, a Serra da Estrela, a Serra de Alvelos e a Serra da Lousã. A cereja no topo do bolo? A filhó, doce típico da região, e o licor de medronho.
Sertã
A vila da Sertã é pontuada por um conjunto de monumentos e património arquitetónico, a par de recentes construções e comodidades, que podem, facilmente, traduzir-se num dia de exploração gratificante. Fica o convite.
Centremos a nossa atenção em Pedrógão Pequeno e no Vale do Cabril. As atividades promovidas pela empresa Trilhos do Zêzere permitem um passeio de buggy pelo Monte da Senhora da Confiança, com passagem pelo Moinho das Freiras e um passeio de barco no Rio Zêzere. Avistam-se as três pontes que atravessam o rio, desde a barragem do cabril à ponte do IC8, com a ponte Filipina de permeio. A garça-real passa num voo rasante, para embelezar uma paisagem que julgávamos já perfeita. Pode-se, em alternativa, percorrer o trilho do Zêzere, que apresenta um magnífico percurso pelo Vale.
Onde comer?
A gastronomia é um importante marco na exploração de uma região. Enquanto turistas, viajantes ou caminhantes, os pratos típicos e os produtos endógenos e autóctones pontuam a viagem e, muitas vezes, nos apuram os sentidos para memórias que só os pratos tradicionais conseguem despertar.
O Pinhal Interior Sul é uma vasta área e tem, por isso, diferentes pratos típicos. Plangaio, maranho, cabrito estonado, bucho recheado, achigã, sopa de peixe, presunto, enchidos, queijos, tigelada, filhó, cavacas, medronho, numa lista interminável (e saborosa) de pratos tradicionais da região, regados com os vinhos regionais. Um brinde!
Sugerimos visita ao restaurante “A Cobra”, em Vila de Rei. Uma paragem obrigatória no restaurante “O Bigodes”, em Mação (o Senhor José é um magnífico contador de histórias!). A “Casa Ti’Augusta”, na aldeia da Figueira, é o local perfeito para uma refeição típica, assim como o restaurante “Alto da Vila”, em Oleiros. Dois espaços completamente diferentes, com pratos regionais ótimos, que representam (com distinção) os sabores da região. Na Sertã, o restaurante “Sabores do Pinhal” convida a uma incursão por um conjunto de pratos regionais. Todos eles apresentam pratos alternativos que integram a ementa habitual, mas propomos - veementemente - que se atreva a experimentar a gastronomia local. Bom apetite!
Por fim…
Estas são algumas das nossas sugestões para um passeio ou umas férias pelo Pinhal Interior Sul. Terminamos com o “Manifesto” da Zab Living, que reproduz, com exatidão, o conjunto de sensações e sentimentos que trazemos connosco:
«A água. Que nos cura a alma.
O pôr do sol. Que nos diz para ficar.
O sabor da noite estrelada. Que nos pede para não dormir.
E o tempo. Que nos quer abrandar.»
Viagem a convite da Associação Pinhal Maior.
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