"Estamos numa cidade que vive 24 horas, o metro não foi projetado para ficar vazio, mas cheio", diz Gary Dennis, nova-iorquino.

O encerramento do metro aconteceu esta quarta-feira entre a 1h às 5h da manhã para permitir a eliminação de todos os vestígios do vírus em 6.500 vagões, através de diferentes técnicas que variam do uso de desinfetantes simples a lâmpadas ultravioletas, disseram autoridades da MTA, a agência que gerencia o transporte público da cidade.

Embora os casos de vírus e hospitalizações estejam em declínio em Nova Iorque, a cidade continua a ser o epicentro da pandemia no país, com mais de 19.000 mortes, e ainda não há data para o fim das medidas de confinamento.

Para Dennis, 59 anos, um guia que adora a Big Apple e suas 420 estações de metro, comboios cinzentos, barulhentos e envelhecidos, tão emblemáticos quanto os táxis amarelos ou a Estátua da Liberdade, são um excelente indicador do estado da saúde da cidade.

A decisão de parar os comboios à noite deixo-o chocado. "Sem metro, Nova Iorque morre", diz. "Com um metro forte, a cidade está em forma".

O presidente da câmara Bill de Blasio afirma o mesmo com frequência: o metro é "o sopro da vida" que anima esta cidade de 8,6 milhões de habitantes.

Desde o início da pandemia, contudo, o serviço foi reduzido e o metro nunca esteve tão vazio. A frequência caiu 90%, para menos de 500.000 passageiros por dia, de acordo com a MTA.

Imagens recentes de vagões ocupados por pessoas sem-abrigo à noite causaram comoção. O encerramento noturno também é uma tentativa de incentivar essas pessoas a procurar abrigo.

Metro de Nova Iorque vazio durante o dia e encerrado à noite demonstra o estado grave de saúde da cidade
Spencer Platt/Getty Images/AFP créditos: AFP

Empresários e corretores, que agora trabalham de casa, desapareceram. Apenas os trabalhadores considerados essenciais permanecem no metro: cerca de 800.000 funcionários de hospitais, supermercados ou restaurantes, geralmente jovens latinos ou negros, que correm pelos corredores, usando máscaras.

"Vetor gigante do vírus"

"Está vazio!", exclamou Will Ramos, 33 anos, picheleiro e reparador de todos os tipos, enquanto caminhava pela estação Union Square, uma das maiores da rede, na hora de ponta, com um amigo que trabalha num hospital.

Para ele, o metro é Nova Iorque: um lugar de apertos e esforço, mas onde também se vê "muita cultura e talento".

A epidemia, no entanto, transformou o metro em um "vetor gigante do vírus", de acordo com a motorista, Sujatha Gidla, que teve COVID-19 e denunciou a falta de proteção dos funcionários numa carta aberta ao jornal New York Times, publicada na terça-feira.

Segundo o presidente da MTA, Patrick Foye, 109 dos 50.000 funcionários morreram de coronavírus desde março.

O futuro próximo da rede de transporte não é certo ainda. "Os problemas de financiamento serão enormes", avalia Bruce Schaller, ex-chefe de transporte de Nova Iorque e agora consultor sobre o assunto.

Metro de Nova Iorque vazio durante o dia e encerrado à noite demonstra o estado grave de saúde da cidade
Eduardo Munoz Alvarez/Getty Images/AFP créditos: AFP

O especialista, assim como muitos outros, não duvida que o metro acabará por recuperar a efervescência depois de adaptar-se ao aumento do tráfego de autocarros e bicicletas.

"Ainda estamos longe da crise fiscal da década de 1970", diz Schaller. O infeliz estado do metro naquela época, com criminalidade endêmica, era apenas um dos sintomas de "uma cidade gravemente enferma", explica.

Para ele, o problema atualmente é como sair da pandemia. "A vitalidade a longo prazo da cidade não está em questão."

Reportagem: Catherine TRIOMPHE / AFP