Comecemos por Margão, o lugar, não as especiarias. Mas saibam, desde já, que era daqui que saíam as primeiras especiarias Margão que depois, já em Lisboa, eram embaladas em pequenos sacos.
Margão é uma das mais antigas e a segunda maior cidade do estado de Goa. Agitação seria a minha primeira palavra para dizer Margão. Há uma vida que nunca se acalma, vozes que nunca se calam, passos que ganham sempre um novo destino. Há sempre gente a entrar e sair. As filas crescem, os autocarros chegam, pessoas saem, pessoas entram. As filas diminuem e voltam a crescer em corpos que se substituem e trocam, num vaivém onde nenhuma pausa cabe.
Andámos muito de autocarros, nesses dos quais os turistas parecem fugir, como aqui vos contámos. Pelos vidros, ora abertos, ora partidos, entravam as margens da estrada, com as suas mansões em estilo colonial português, como aquela onde a nossa Portuguesinha – acabada de chegar a Goa – se passeou pelo alpendre e foi descobrindo, atenta e curiosa, os encantos e recantos da arquitectura colonial. Jardins, mercados e edifícios governamentais, como a Câmara Municipal, que sublinhava a beleza da herança portuguesa.
Em Pangim, junto ao terminal dos autocarros, onde parece ser sempre hora de ponta, crescem mercados em cada canto de rua. Vendedoras de peixes e legumes, sentadas lado a lado, enchem sacos consoante os pedidos. No regresso mantêm-se as filas, a pressa nunca nos acompanhou, em vez disso fomos enchendo o tempo de espera com todas as sensações que aos sentidos iam chegando, a Mia fez uma primeira amiga em Goa e no regresso, pelo vidro do autocarro, despedimo-nos do sol e do dia.
Pela Velha Goa, a herança portuguesa é forte, e não passa apenas pelas Igrejas, como aqui vos contámos, nem pelas belas casas coloniais, como a casa de Chandor, onde, como vos confessei, enchemos os espelhos longos do salão de festas com as danças de mãe e filha e eu nos imaginei vestidas à l’époque, no reflexo devolvido pelo espelho. Há também a Praia Miramar e os arcos trouxeram-nos à Foz do Douro, porém a degradação é notória. Os jardins e estátuas de homenagem aos portugueses que ali tiveram um papel importante.
Na praia de Carmona, conhecemos a Lurdes e o Estácio, goês que, juntamente com a esposa, fogem ao frio de Portugal e voam para Goa todos os anos. A Mia viu neles os seus avós durante o tempo que ali partilhámos. Juntos vimos búfalos de luta que tomam banho na água do mar e um hovercraft da marinha que pousou na areia e foi a atracção do dia.
Estamos na Índia e eu não senti o cheiro que tanto(s) referem; o trânsito, pelo menos aqui, em Goa, não é pior do que o de Hanói, mas, também costumam dizer, Goa é diferente de todo o resto do país e como somos pouco de acreditar no que dizem, vamos ver com os próprios olhos e sentir a três corações.
Adeus, Goa, seguimos para Bangalore, a Silicon Valley da Índia.
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Este artigo foi originalmente publicado em Menina Mundo.
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