Mesmo que já conheçam alguns cantos da Andaluzia, é possível que fiquem com vontade de fazer uma segunda visita depois de verem este pequeno filme. Vão vê-lo, a sério, e depois regressem ao artigo. Nós esperamos, mesmo depois de repetirem a sua visualização, numa tentativa de perceber como nos agarra a atenção e consegue transportar-nos para o sul de Espanha. Porque, muito provavelmente, é isso que também vai acontecer convosco.
"The Passion of Andalucía" (A Paixão de Andaluzia) já tem quatro anos desde a sua publicação nas redes sociais mas a sua exibição, em maio, no contexto do Travel Fest 2024 acabou por introduzi-lo a uma nova plateia de viajantes com gosto pelo storytelling, que o recebeu com aplausos e um entusiasmo pouco habitual na hora de fazer perguntas ao seu autor. Não era para menos: o espanto provocado pelo pequeno vídeo mostrava que estávamos perante uma forma estimulante de documentar visualmente um lugar a partir da perspetiva de uma só pessoa.
São 7 minutos em que a câmara serpenteia por uma rápida sucessão de festividades, ofícios e paisagens andaluzas ao som de uma música igualmente insinuante, com acordes do flamenco, que ilustram bem o êxtase e a entrega física com que são vividas as festas religiosas em algumas das comunidades do país vizinho. Quando a ação parece acalmar é apenas para ganhar novo fôlego antes de voltar a enveredar por uma rodopiante sequência de imagens que capturam a beleza e o colorido das gentes e ruas de Sevilha, Cádis, Estepona, Granada e Málaga.
Chegamos ao fim estonteados, talvez arrepiados, seguramente fascinados com a rica e vibrante cultura andaluza. E os mais preocupados com as questões da criatividade, com uma certeza: nenhuma encarnação da Inteligência Artificial podia compor tal retrato da humanidade.
A arte do improviso
Tal como o flamenco, que vive de melodias e ritmos harmonizados no momento e lugar em que são apresentados, esta curta-metragem também é um testemunho da arte da improvisação. Brandon Li viaja pelo mundo a fazer curtas-metragens sobre os lugares que visita, munido apenas da sua câmara e curiosidade.
"As câmaras tornaram-se pequenas, os estabilizadores tornaram-se melhores, a tecnologia permite viajar e realizar grandes visões sem grandes equipas, sem precisar de planear tudo meticulosamente antes do tempo, porque é preciso trazer imensas pessoas, veículos e equipamento. Geralmente, estou a filmar apenas com o equipamento na minha mochila", conta o norte-americano, já conhecido no meio audiovisual pela forma como condensa em alguns minutos as semanas e meses passados nos sítios pelos quais viaja.
"Viajar à volta do mundo tem sido uma paixão desde miúdo e casar isso com a minha outra paixão de filmar tem sido o derradeiro objetivo da minha vida", transmitiu ao público do Travel Fest, onde foi o cabeça de cartaz de um programa rico em oradores apaixonados pela descoberta de diferentes modos de vida e arte.
Cinco meses condensados em 7 minutos
Sobre a Andaluzia, o criador diz ter sido atraído por uma cultura irrequieta, rica em imagens capazes de prender a atenção de um espetador. "Adoro Espanha e Andaluzia, mas não fui lá apenas porque queria umas férias", admitiu. "Fui lá porque encontrei uma cultura dinâmica viva, não apenas bonita ou fotogénica. Tem algo a acontecer em termos físicos, que é excitante de observar de uma perspetiva cinemática".
No final da sua palestra em Guimarães, apesar de ter partilhado pequenos excertos de alguns dos 30 filmes que já realizou em viagem, a curiosidade da plateia do Teatro Jordão foi quase toda ela dirigida ao "making of" da sua paixão andaluza. Quanto tempo leva a compactar tanta energia e movimento em sete minutos?
"Os vistos americanos para o espaço Schengen duram 90 dias", começou por contar. "Foi quanto tempo demorou a filmar. Parti quando tive de ir embora, basicamente. Três meses a viver em Andaluzia, a viver entre Sevilha, Cádis, Málaga, a filmar todos os dias, um pedaço de cada vez. Passei muito tempo à espera pelos festivais e a editar enquanto filmava", revelou.
Depois de regressar a casa, nos EUA, precisou de mais dois meses de edição para chegar ao resultado final. Um processo demorado que, mesmo assim, foi facilitado pela gestão diária que fazia das imagens que filmava e pelo seu olhar crítico: por cada duas horas de filmagens gravadas só costumava aproveitar cerca de cinco minutos. "Quando comecei a editar a peça final, já tinha algumas timelines a partir das quais podia escolher os destaques", explicou.
No final, o processo total de fazer este filme de sete minutos levou cinco meses. Um investimento de tempo e energia que Brandon Li considera vitais para a sua arte. É assim, sem falsas modéstias, que descreve o resultado do seu trabalho: "Não os considero educacionais ou documentários. São mais as minhas interpretações emocionais do que senti quando estive lá".
Quantos milhões é que o gabinete de turismo de Andaluzia teria dado por um filme assim? Para Brandon Li, a questão nem se coloca. "Tento separar a arte do meu trabalho", diz em resposta a outra pergunta do público sobre como se sustenta para poder viajar. Aceita trabalhar em projetos de vídeo para empresas e entidades oficiais mas desenha um limite no que diz respeito aos seus filmes de viagem, que considera o seu orgulho. "Estou simplesmente a fazê-lo da maneira que eu quero", assegura o criador.
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