Até ficarmos a conhecê-la, a Zâmbia significava pouco mais do que 6 letras. Uma das poucas imagens que tínhamos deste país no sul de África era, na verdade, a de um dos sítios mais famosos no planeta, capaz de rivalizar com a celebridade das Pirâmides de Gizé ou do Parque Nacional do Serengeti: as Cataratas Vitória.
É verdade, uma das 7 maravilhas naturais do mundo encontra-se na Zâmbia (por acaso, também no Zimbabwe, mas já lá vamos).
A chegada a Livingstone
Voltando atrás. Depois de 2 dias em Lusaka (a capital), entrámos num autocarro que em 7 horas nos levou até Livingstone, uma cidade no sudoeste da Zâmbia. David Livingstone foi um missionário britânico do século XIX, defensor do fim da escravatura, e que é considerado o maior explorador europeu de África. Foi ainda o primeiro europeu a avistar as Cataratas Vitória e acabou por morrer de malária em 1873, na Zâmbia. O seu nome acabou por ficar associado a esta cidade, a mais próxima das cataratas, que é bem mais do que uma porta turística para o famoso monumento natural.
Em Livingstone encontrámos uma enorme avenida com esplanadas, onde se juntam turistas e locais. A avenida cruza-se depois com ruas mais estreitas, que durante o dia estão repletas de mercados semelhantes aos de Lusaka, e à noite se inundam de música, vinda de vários bares ou cafés que parecem ter gente a qualquer hora.
O primeiro dia deu para visitar (e viver) a cidade, e ainda conhecer o museu e o “Royal Livingstone Express” (um comboio a vapor que faz passeios turísticos com vista para as cataratas), comer gelados e preparar a aventura do dia seguinte. Parte do segundo dia foi passado mesmo no meio do rio Zambeze, um dos principais rios de África.
O rio Zambeze
Nascendo precisamente na Zâmbia e desaguando em Moçambique, o Zambeze passa por 6 países e é o maior rio do mundo a desaguar no Oceano Índico. No entanto, a característica pela qual é mais conhecido é mesmo por, a um certo ponto, cair de forma vertical de um penhasco de 108 metros, formando as Cataratas Vitória.
Cerca de 15 quilómetros depois desse ponto, o rio é bastante mais estreito, mas muito agitado e foi aí que nos aventurámos numa experiência de rafting, num dos sítios mais populares no mundo para o fazer. Rafting é um desporto que consiste em remar em grupo, dentro de um barco insuflável, ultrapassando “rápidos”, as secções mais velozes e turbulentas de um rio.
Apertámos bem os colares que tínhamos comprado na véspera em honra a “Nyami Nyami”, o deus do rio Zambeze para o povo Tonga, como uma pequena proteção espiritual, e seguimos a pé por um trilho acidentado em direção à margem do rio.
Foram cerca de 2 horas, que passaram a correr, preenchidas com diversão e deslumbramento com o magnífico desfiladeiro verde-escuro que nos rodeava, e que iam alternando com a adrenalina e um quase-pânico sempre que as ondas e remoinhos ameaçavam capotar o barco. Apesar de o guia nos ter avisado (ou confortado?) que capotar acontecia em metade das viagens, chegámos ao final com a folha limpa (o mesmo não se pode dizer da roupa). Mas o melhor ficou para o fim.
Uma visão esmagadora (e ensurdecedora)
Ao terceiro dia, entrámos no tão aguardado Parque Nacional Mosi-oa-Tunya, o nome da tribo Lozi para as Cataratas Vitória, que significa literalmente “o fumo que troveja”, aludindo ao vapor de água e barulho provocado. O nome mais popular foi dado por Livingstone em honra à rainha britânica da época (tal como no lago).
Apanhámos um táxi da cidade para a entrada do parque, pagámos os bilhetes (cerca de 15€) e pouco depois estávamos à frente de uma esmagadora cortina de água que caía com uma força que nem podíamos imaginar. As Cataratas Vitória são, na verdade, consideradas a maior queda de água do mundo, quando se combinam os seus 108 metros de altura e 1.700 de comprimento.
O barulho, agora ensurdecedor, já se ouvia há algum tempo, mas foi esta primeira visão que nos deixou espontaneamente 5 minutos sem produzir qualquer som. Subimos um pouco e chegámos a outro miradouro, na parte de cima da cascata, de onde se vêem os quase 2 quilómetros de rio a evaporarem-se (de forma figurativa e literal) no abismo. Daqui, conseguimos ainda avistar o Zimbabwe (na outra margem do rio), a ilha de Livingstone e a “Devil’s pool”, uma piscina natural no rio, à beira da queda e imprópria para cardíacos, que se pode frequentar quando o caudal está baixo.
Seguimos depois na direção oposta, por um caminho rodeado de floresta densa e tropical, chegando a um miradouro com uma vista frontal e muito próxima das cataratas. Esta zona do parque tem um microclima muito singular, chovendo constantemente e de forma torrencial.
A água cai das cataratas com tanta velocidade e energia que, ao chegar ao fundo, se transforma em vapor de água. Esse vapor quente sobe, mas ao esfriar transforma-se novamente em água líquida e acaba por cair na encosta em frente. Um verdadeiro mini-ciclo da água! Apesar de estar a chover, a vista é tão magnífica que pouco pensámos nisso.
Mas o melhor, para mim, vem mesmo uns metros atrás. A “Knife Edge Bridge” é uma ponte suspensa com 130 metros de altura que liga as duas encostas do desfiladeiro, com o rio por baixo (já depois da queda). De um lado da ponte, a vista é para o desfiladeiro e o Zambeze é estreito e calmo. Do outro, estamos de frente para as colossais cataratas, envoltos em nevoeiro e no centro de um duche de água morna, o mais forte que alguma vez tomámos, e que vem do mesmo rio Zambeze. Um local místico, daqueles que achava só se encontrarem em histórias fictícias.
Depois de nos secarmos bem, tivemos de dizer adeus e seguir caminho. Voltámos à estrada principal e uns metros depois estávamos a sair do país. Antes de entrar no novo – o Zimbabwe – passámos na ponte “Victoria Falls”, naquela que é, certamente, uma das fronteiras mais bonitas do mundo, com mais uma vista para o rio onde remámos 24 horas antes, e que é responsável por uma maravilha do mundo.
Antes de terminar esta crónica (sem dúvida das que mais gosto me deu escrever), faço minhas as palavras de David Livingstone, ao avistar pela primeira vez as cataratas Vitória:
“Ninguém pode imaginar a beleza da vista a partir de qualquer coisa em Inglaterra [ou na Europa]. Nunca tinha sido visto antes por olhos europeus; mas cenas tão encantadoras devem ter sido contempladas por anjos no seu voo.”
Projeto Prá frente
O Projeto Prá Frente foi criado por dois jovens engenheiros, com a intenção de conhecer (e partilhar) uma perspetiva completa do Sudeste Africano, focando-se não só no seu património deslumbrante, mas também nas suas pessoas e naquilo que tem para oferecer para o futuro.
Para saber mais siga o Instagram: @projeto_prafrente
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