Do miradouro do Parque Urbano das Penhas do Marmeleiro, em Murches, Cascais, o verde que se via outrora surge agora pintado de cinza escuro, depois de as chamas do incêndio de Alcabideche terem devastado o terreno.

Ao final da manhã de quarta-feira, conforme constatou uma equipa da Lusa, mantinha-se no local um grupo de bombeiros - sobretudo de Cascais - que chegou cerca das 17:30 de terça-feira, pouco depois de o incêndio florestal ter deflagrado na vizinha área do Zambujeiro, na mancha verde do Parque Natural Sintra-Cascais, no distrito de Lisboa.

Ruben Almeida, bombeiro há 24 anos, era um dos muitos profissionais que aguardavam para ser rendidos, após mais de 18 horas a combater o fogo, reconhecendo o apoio prestado pela população.

“O trabalho é nosso, mas eles ajudam. Os populares fazem também a vigia e ajudam-nos, alertando-nos”, conta o bombeiro profissional, da corporação de Cascais.

Nas primeiras horas em que enfrentou as chamas, Ruben fê-lo enquanto profissional, mas, depois do turno de trabalho, ficou como voluntário, como acontece “muitas vezes”.

Miradouro do Parque Urbano das Penhas do Marmeleiro
Miradouro do Parque Urbano das Penhas do Marmeleiro Um popular observa uma zona ardida junto ao miradouro do Parque Urbano das Penhas do Marmeleiro créditos: LUSA/António Pedro Santos

“A nossa missão fulcral era proteger as casas. E foi o que fizemos, primeiro lá em baixo”, diz, apontando para algumas construções visíveis a partir do miradouro.

O vento foi o principal adversário dos operacionais. Em pleno parque natural, explica, sopra de duas frentes – há “o que vem da serra e o que vem do mar”. Na terça-feira, foi o vento que espalhou o fogo, lambendo a vegetação rasa em torno do miradouro.

Antigamente, a época de incêndios era "sazonal, agora deixou de o ser". Os fogos têm início em maio e vão até muito mais tarde. A propósito, lembra "o dia mais negro de sempre: o 15 de outubro de 2017", em que o continente português registou vários fogos de grandes dimensões com cinco dezenas de mortos.

Carlos, morador na Quinta das Patinhas, entre as localidades de Alvide e Cobre, veio até ao miradouro para ver “os estragos”, depois de na terça-feira ter sido aconselhado pelas autoridades a sair da habitação, sobretudo devido ao fumo, “quando o incêndio estava mais perto das casas”.

“Saímos por volta das 21:00. O fogo andava perto e havia muito fumo. Depois pudemos voltar pela meia-noite”, refere, lamentando que a vista “muito bonita” que se tinha do miradouro tenha ficado agora a preto e branco.

Carlos, que mora em Cascais há mais de 20 anos, conta que o vento soprou na terça-feira de uma forma “nada generosa”.

“Esta zona já de si é muito ventosa, mas ontem o vento soprou com muita intensidade, acima do normal”, relata.

Os meios aéreos mantêm o vai e vem para pequenos pontos onde agora só se vê fumo, em coluna, em direção aos céus.

“É desolador o que se vê agora”, lamenta, por seu turno, Leonice, que vive em Murches e habitualmente vem caminhar ao miradouro.

Veio ver como tinha ficado a paisagem, depois de ter assistido “com tristeza” ao fogo e recordando “a fumaça e a agitação dos bombeiros”.

Além da destruição das árvores e da vegetação, o passadiço de madeira ficou inutilizável, queimado por chamas cujo calor ainda brota do chão e do lenho queimado.

O cheiro a fumo é o que mais se sente na zona. Um pouco mais abaixo do Marmeleiro, em Alvide, logo à saída da Autoestrada 5, que chegou a estar cortada, as chamas rodearam a Quinta Pedagógica Armando Vilar.

No entanto, como contam Mariana e Teresa, arrendatárias do espaço, a quinta já tinha fechado e as instalações não sofreram danos.

“Tivemos sorte. Já vimos os patos e os gansos, e sei que o burro também está a salvo”, diz Mariana, explicando que o proprietário da quinta esteve no local.

Apesar de a quinta pedagógica não ter sofrido danos, uma das casas de madeira que se encontravam junto ao local não teve a mesma sorte e é hoje um monte de cinzas. “Felizmente não morava lá ninguém”, acrescenta Mariana.

Na terça-feira, com a força do vento, as chamas que surgiram na zona do Zambujeiro encaminharam-se para uma densa malha urbana, sem chegar, contudo, a queimar habitações ou equipamentos.

Ainda assim, por precaução, foram retirados de casa residentes de zonas como Zambujeiro, Cabreiro e Murches.

Perto de uma dezena de pessoas, inclusive bombeiros, receberam assistência médica por exaustação ou inalação de fumos, mantendo-se às 11:00 de hoje seis feridos em unidades hospitalares.

Foram retirados cerca de 800 animais provenientes do canil municipal e da Associação São Francisco de Assis, mas segundo a Proteção Civil, a meio da manhã já todos tinham regressado.

O incêndio foi dado como dominado pelas 04:00.