Com o título de “Petição para reforço da proteção de estabelecimentos históricos face ao arrendamento não habitacional”, a petição pretende conter a extinção gradual das chamadas lojas com história a que, do norte ao sul do país, as populações têm vindo a assistir, sobretudo nas grandes cidades, perante a ausência de “políticas concretas para a manutenção e continuidade dos arrendamentos não habitacionais desses estabelecimentos”.

O desaparecimento destes estabelecimentos deve-se, em grande medida, à entrada de novos investidores, que adquirem os imóveis em causa através de fundos imobiliários, para lhes dar, depois, outra utilização (hotéis, centros comerciais, lojas-âncora de marcas internacionais, etc.), fazendo extinguir o contrato de arrendamento das lojas. Seja porque a lei o permite fazer, seja para obras de grande remodelação, ou por uma simples recusa de renovação, nos casos em que o contrato de arrendamento possui um prazo certo.

Em Lisboa, referências como a Barbearia Campos, a Livraria Ferin, a Casa Achilles, o Restaurante Bota Alta, a Casa Chineza, a Óptica Ramos & Silva, a Ourivesaria Araújos, a Casa Xangai, a Drogaria Laurinda, a sapataria A Deusa, a Casa Senna, a Sapataria e Chapelaria Lord, encerradas nos últimos tempos, entre muitas outras, preenchem o imaginário de várias gerações. No Porto, nomes como a Livraria Latina, a Mercearia do Bolhão, o Café Embaixador, a Casa Madureira, a Confeitaria Cunha, o Café Vitória e o congénere Capitólio, a Casa Porfírios, o Café Progresso, a Ourivesaria Âncora, a Casa dos Linhos ou os lanifícios Benedito Barros foram igualmente notícia, devido ao fecho.

Para Joaquim Dantas Rodrigues, professor de Direito e sócio-partner da Dantas Rodrigues & Associados, de cujo Centro de Estudos (CEDR) surgiu a petição pública, a “sobrevivência dos muitos” estabelecimentos históricos que “transmitem os cheiros e os sabores da portugalidade” pode depender simplesmente de uma segunda alteração à Lei n.º 42/2017, de 14 de junho, na redação dada pela Lei n.º 1/2023, de 9 de janeiro.

“Estamos a propor uma pequena mudança legal ao atual regime, mas que pode fazer toda a diferença, para que não tenhamos cidades sem rosto nem personalidade. As Lojas com História, ou as Lojas com Tradição também, fazem parte do património cultural das cidades portuguesas, representam um legado arquitetónico, cultural e social muitas vezes com décadas ou até séculos de existência, e são locais que preservam tradições, métodos artesanais e produtos próprios. Transmitem os cheiros e os sabores da portugalidade e encerram a identidade da região onde estão inseridas”, sublinha o advogado.

A proposta contida na petição sugere uma modificação ao artigo 7.º da lei em vigor, no sentido de permitir aos arrendatários (lojas) solicitar a constituição de propriedade horizontal ao senhorio, para assim exercerem o direito de preferência sobre o espaço comercial, caso o imóvel cumpra os requisitos legais para fracionamento. Além disso, pretende-se que, em caso de incumprimento por parte do senhorio, os arrendatários possam recorrer à via judicial para fazer valer este direito.

“Não obstante as medidas já adotadas, como o adiamento da transição para o Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU), até 31 de dezembro de 2027, verifica-se que muitas lojas históricas estão instaladas em prédios não constituídos em propriedade horizontal. Esta situação impossibilita os arrendatários de exercerem o seu direito de preferência sobre o espaço ocupado, dificultando a aquisição e a continuidade da atividade comercial”, precisa Joaquim Dantas Rodrigues.

São necessárias pelo menos 10 mil assinaturas para que a petição pública lançada pelo Centro de Estudos Dantas Rodrigues, que contém inclusive a nova proposta de redação da lei em questão, consiga ser debatida pelo plenário da Assembleia da República. A iniciativa encontra-se disponível online para recolha de assinaturas e pode ser assinada através da seguinte hiperligação.