“A zona é particularmente rica em corais e outros elementos de biodiversidade por causa do constante fluxo de água. Aqui as correntes costumam ser muito fortes e sempre renovam as águas, trazendo peixes e eliminando uma eventual poluição”, descreve à Lusa Wlodzimierz Szymaniak, polaco residente há muitos anos em Cabo Verde e que mergulhou até às profundezas da baía de Moiá-Moiá, no concelho de São Domingos, na parte oriental da ilha de Santiago, para descobrir o campo de coral duro.
Uma monitorização feita durante meses em parceria com a Associação Cabo-verdiana de Ecoturismo (ECOCV), que considerou que esta foi uma das “descobertas mais notáveis” deste ano, estimando que o campo tem aproximadamente uma área de até 1000 metros quadrados.
“Aqui foi uma boa surpresa porque mergulhando, pesquisando sobre as ervas marinhas, descobrimos uma zona muito grande dos corais pétreos, com nome científico ‘Sidastrea radians’”, precisou Edita Magileviciute, bióloga marinha e vice-presidente da ECOCV.
Szymaniak, que é reitor da Universidade Jean Piaget de Cabo Verde e um dos maiores entusiastas e praticantes do mergulho nas costas do arquipélago, disse que a descoberta só foi possível depois de muito trabalho de preparação e de pesquisa.
“Neste caso, eu descobri a baía de Moiá-Moiá através dos livros antigos, por exemplo, os livros do Cristiano de Sena Barcelos”, explica, em entrevista no local, que a norte tem a igreja de Alcatraz e mais a sul o farol da Ponta Leste, do século XIX.
“Atualmente esta zona é quase completamente esquecida e degradada pela apanha ilegal de areia, mas antigamente foi bem descrita nos livros de navegação e mencionada nos mapas, por ser extremamente perigosa para os navios”, diz, apontando o Pentalina B, que encalhou nessa baía em junho de 2014, e cujo casco ainda se encontra no local.
O nome Moiá-Moiá, segundo o investigador, vem do português ‘molhado’, lembrando que quando um navio naufragava no local, geralmente as populações nas imediações, atualmente de cerca de duas centenas, mostravam-se pouco solidárias e pilhavam a carga.
“Muitas vezes era o milho, cereais, que, molhados, tinham de ser vendidos a preços muito convidativos porque estragavam muito facilmente, daí surgiu a palavra crioula ‘moiá’, que significa preço baixo e o nome da baía e da aldeia”, explica Wlodzimierz Szymaniak.
Funcionando como o ‘barómetro’ da poluição e importante para salvaguardar o equilíbrio biológico, o professor universitário aponta para o “autêntico tapete” de corais de Moiá-Moiá, zona onde também descobriu muitos vestígios arqueológicos subaquáticos, nomeadamente âncoras antigas e canhões dos séculos XVI e XVII.
“É uma zona muito rica cultural e biologicamente, e que merece mais atenção de todos nós”, pede, garantindo que vai continuar a mergulhar no local, para descobrir as “muitas surpresas” em Cabo Verde.
Um trabalho sempre em parceria com a ECOCV, que desde 2015 tem um plano de gestão e conversão de corais em Cabo Verde, mas que precisa de ser posto em prática.
“Por isso, o segundo passo é fazer mais investigação, identificar a gravidade dos impactos, como poluição e extração de areia na zona costeira, o impacto destas algas e fazer um mapeamento específico destes corais e outras espécies associadas”, indicou Edita Magileviciut, considerando que a baía é muito importante para a biodiversidade dos corais no arquipélago cabo-verdiano.
Tal como existe nas ilhas de São Vicente e Boa Vista, a bióloga marinha não descarta a hipótese de ter uma enseada de corais em Moiá-Moiá, mas vai alertando para as muitas ameaças a essas espécies, com poluição de todo o tipo, desde sacos e garrafas de plástico, redes de pesca, mas também a apanha ilegal da areia, que está a descaraterizar o local.
“Este habitat é muito sensível, pelo que temos de fazer mais investigação, educar as populações, sensibilizar, aumentar atividades de conservação. Porque senão vamos perder sem descobrir”, avisa a membro da ECOCV, criada em 2015 por um grupo de profissionais de diversas áreas para conservar o meio ambiente em Cabo Verde.
O mais importante, segundo a investigadora, é que estes corais “são mais ou menos saudáveis”, mas nesta época as algas ‘sargassum’ reproduzem-se muito, cobrem a superfície do mar, impedindo a penetração da luz na água, provocando a morte dessas espécies.
“A mensagem muito importante é que todas as espécies, no mar, tal como na terra, estão ligados, se perdermos os corais, perdemos as nossas costas, perdemos áreas de reprodução de peixes de importância comercial, peixes endémicos, e tudo isso. Portanto, protegendo uma espécie de corais, protegemos o ecossistema”, insiste a bióloga.
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