Ao redor, milhares de esqueletos de peixes-reis e carpas, comuns neste local. Os moradores recordam que, até recentemente, podiam extrair exemplares de até 30 centímetros e com mais de um quilo de peso.
Centenas de exemplares de gaivotas, garças, abibes-do-sul e condores de cabeça vermelha tentam sobreviver na minúscula superfície onde ainda há água.
De acordo com o último relatório da Companhia Sanitária de Valparaíso (Esval), o volume de Peñuelas - que, até há pouco tempo, era a principal reserva hídrica da área urbana da região - mal chega a 170.000 metros cúbicos. Isto representa 0,2% da capacidade total de 95 milhões de metros cúbicos.
"Em reservatórios como Peñuelas, anos húmidos e anos secos sucediam-se, mas, depois de 12 anos abaixo da média, estes reservatórios não conseguiram voltar a encher", explica o diretor do Centro Avançado para Tecnologias da Água (CAPTA), James McPhee, à AFP.
Juntos, os lagos Los Aromos e Peñuelas, na região de Valparaíso, 120 quilómetros a oeste de Santiago, abastecem quase dois milhões de habitantes desta região.
Um terço da área do país em risco
Mais de 50% dos municípios do Chile - o correspondente a 8,5 milhões de pessoas (47,5% da população do Chile) e a um terço da superfície do território nacional (231.056 km2) - estão sob um decreto oficial de escassez hídrica.
No total, são 188 comunas, em nove das 16 regiões do país: Atacama e Coquimbo, no norte; Valparaíso, Metropolitana, O'Higgins e Maule, no centro; e Los Ríos, Los Lagos e Aysén, no sul, segundo dados da Direção Geral de Águas (DGA).
Os decretos de escassez hídrica permitem a aplicação de instrumentos que procuram diminuir o impacto da seca na vida das pessoas, entre os quais: autorizar a extração de águas superficiais, ou subterrâneas; a distribuição de água em camiões-cisterna nas áreas rurais, onde a seca se agravou; e otimizar consumo de água nos trabalhos agrícolas.
“Não podemos fazer com que chova mais, nem que se acumule uma maior quantidade de neve para fintar a mudança climática, mas tomamos medidas para uma melhor gestão hídrica”, disse Cristián Núñez, da DGA.
Mais três décadas de seca
No hemisfério sul, o centro e o sul do Chile, juntamente com Nova Zelândia e Madagáscar, registam um terço a menos de chuvas do que há 40 anos, afirma o especialista em mudança climática e académico da Universidade de Santiago, Raúl Cordero.
Como consequência do aquecimento global, “é muito provável que os invernos hiperáridos se apresentem com muito mais frequência” nestes lugares, adverte este especialista à AFP.
Além disso, no Chile, há um aumento do consumo de água nos grandes centros urbanos.
"O que foi feito até agora é um apelo à consciência e à boa vontade e isso não é suficiente (...) De alguma maneira, vamos ter de nos tornar independentes das chuvas" para o consumo de água, por exemplo, com a criação de mais plantas dessalinizadoras, acrescenta Cordero.
“Precisamos de ter um leque e uma combinação de opções possíveis e aqui aparecem a dessalinização da água do mar, a exploração de aquíferos em rocha fraturada, o reaproveitamento de águas residuais, esgotos, ou águas cinzentas, que podem ser fontes para alguns usos”, diz McPhee.
O futuro não é muito promissor para o lago Peñuelas, nem para outros reservatórios, especialmente da região central do Chile.
"É pouco provável que a situação (de chuvas) melhore a curto e longo prazo. No melhor dos cenários, enfrentamos 30 anos pela frente, em que as precipitações podem continuar a diminuir", conclui Cordero.
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